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Do amor e tantos Bowies

13 de janeiro de 2016

Por Beta Clapp


Esse é um relato sobre o amor. Daqueles amores que a gente sente instantaneamente quando para pra observar de um jeito mais atento. Quando desacostuma o olhar. Do amor e outras sensações que vem dele, das que não são descritas em palavras, por mais que a gente tente. Ta aí a minha tentativa de começar a falar do meu amor por São Paulo, pelo Masili e pela Dé, pela Isabella e pelo Bowie. E não reparem: amor e amar serão repetidos várias vezes por aqui.

Em janeiro de 2014, recebi o convite pro aniversário do Masili. Eu no RJ, ele em SP. Eu, que já amo SP, tinha mais um motivo pra encher a mochila e partir. Claro que eu não ia confirmar o evento e avisar pra ele que eu ia na comemoração: a ideia era brotar lá de surpresa e causar uma comoção mesmo. Foi aí que eu comecei a angariar as minhas parceiras no crime – Isabella (que na época nem conhecia o Masili) e Carol toparam a surpresa, e a Dé foi a aliada primordial no plano de causar um faniquito no moço.

O aniversário do Marcelo era na sexta, o bar estava marcado pra sábado. Mas quem vai pra SP na sexta podendo ir na quarta? Eu e Isabella estávamos com a agenda tranquila e decidimos chegar antes pra poder aproveitar essa cidade tão querida. Passagens compradas, hostel reservado, comecei a planejar o tour dos dias que viriam.

Uma pequena pausa pra falar sobre Isabella. Isabella é um amor que é. Não dá pra ir além disso. Isabella vive pensando nos outros. Eu vivo pensando em Isabella e em Isabella pensar nela. Essa viagem era pra mim, pra Marcelo e pra Isabella. Apesar de ela já ter ido pra SP, eu queria mostrar pra ela a cidade que eu amava. E na busca pela programação da viagem eu descobri que na sexta-feira, a mesma do aniversário do Masili, o Museu da Imagem e do Som (MIS) ia inaugurar uma exposição sobre David Bowie, um dos grandes amores de Isabella. A exposição tinha sido montada originalmente no Victoria and Albert Musem em Londres entre março e agosto de 2013 e tava indo pro MIS.

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Toda vez que Isabella falava do Bowie, os olhos brilhavam e ela abria um sorriso. A minha reação era sempre a mesma – eu (dizia que) não conhecia Bowie.

Então eu descobri a exposição e queria fazer a segunda surpresa da viagem, agora pra Isabella. Entrei no site e vi que dava pra comprar as entradas antes, o ingresso que era R$5 ia pra R$25, mas mesmo assim eu estava decidida a garantir a nossa ida na estreia. Mandei e-mail pro hostel pra ver se alguém podia me dar um help e comprar pra gente, a fim de evitar o prejuízo. No final das contas, não dava pra comprar antecipado no MIS, o site não funcionava e eu corri o risco de comprar no dia. Mandei pra ela a programação que tinha pensado e tinha um buraco na sexta de manhã. Era segredo.

Chegamos em SP na quarta-feira muito cedo, largamos as coisas no hostel e fomos pra rua. O dia terminou com uma chegada milimetricamente arquitetada por mim e pela Dé, na qual passamos pela portaria do prédio deles sem tocar o interfone e quase matei o Masili do coração quando ele abriu a porta e ta-dá!, estávamos lá.

Passei quarta e quinta andando com Isabella pela cidade. Sempre ficava tensa quando pegávamos o metrô: aquelas telinhas cheias de propaganda ficavam sugerindo eventos pela cidade e eu ficava sempre desviando a atenção dela, com medo de aparecer alguma coisa sobre a exposição. Consegui.

Sexta de manhã chegou. Eu estava mega ansiosa. A primeira surpresa tinha sido sucesso, a segunda ia rolar, eu tinha fé. Mal podia esperar pela reação dela. E mais uma pausa pra falar de Isabella. Isabella, que pensa muito pouco nela, estava sendo livre. Isabella estava sendo ela, fazendo o que queria, sem pressa, sem estado de alerta, sem preocupações constantes. O faniquito.

Pegamos um ônibus e fomos. Quando chegamos lá nos deparamos com um cartaz gigante e esse container aí de baixo. Os olhos de Isabella brilharam mais do que todas as vezes que ela falou do Bowie, encheram d’água e o sorriso não fechava nunca. Parecia que a gente ia entrar e dar de cara com o próprio Bowie. Não consegui um registro desse momento, mas tem esse aí que foi posterior à chegada.

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Ficamos um tempinho do lado de fora, a exposição abria às 11h. Eu achando que ia estar lotado e nada, muito longe disso. Rolou uma filinha com algumas pessoas, compramos nossos ingressos e entramos. Deixamos a bolsa num armário (felizmente era proibido fotografar, acho isso sempre um alívio) e antes de entrar pegamos um fone com um aparelho do tamanho de um radinho de pilha que deveria ficar pendurado no pescoço. No fone rolava o que até então eu achava era tão só uma trilha sonora pra curtir a exposição.

Passamos por um corredor escuro, com umas luzes azuis pelo caminho e a primeira sala era dedicada a nada menos que Space Oddity. Logo na abertura um cartaz contava a história da composição da música. Pra definir o nome, Bowie procurou Stanley Kubrick, e na minha cabeça foi algo do tipo: oi, Kubrick, beleza?, aqui é o Bowie, eu fiz uma música nova e queria saber se rola de fazer um jogo de palavras com Space Odyssey”. Isso foi sensacional demais pra mim.

Essa primeira sala era bem pequena, eu ainda estava tentando entender como aquilo ali rolava no mundo e eu não sabia. Fui acompanhando a sequência, rascunhos, matérias de jornal, cifras, e, de repente, quando virei, dei de cara com uma televisãozinha antiga que passava isso aqui:

Foi, então, que tudo fez sentido: o fone estava perfeitamente sincronizado com a TV e eu fiquei uns 15 minutos vendo o clipe se repetir. E, assim, eu me apaixonei.

Passamos mais de duas horas lá dentro. A cada passo que eu dava era um mundo que se abria. Eu não conseguia imaginar a possibilidade de fazer tantas coisas incríveis em uma única vida, de ter aquela capacidade de me reinventar, de me desorganizar e de expandir. E aos poucos eu fui percebendo que, sim, eu conhecia Bowie. Eu conhecia e sabia várias das coisas que vi lá dentro, as roupas, os filmes, as músicas. E mais do que o que era concreto, eu de alguma forma me reconhecia ali. Eu queria ser e era, em alguma molécula do meu corpo, um pouco de Bowie. Porque Bowie não era ele, era tudo, era todos e não era coisa alguma. David Jones. David Bowie. Ziggy. E por aí vai.


(esse vídeo também rolou numa televisãozinha e mais uns 15 minutos se foram no repeat)

Chegamos ao final. Uma sala enorme, escura, redonda, com um pé direito altíssimo e vários manequins vestidos com roupas dele. Toda a sala era feita de telões que passavam imagens de shows. Não um show, mas alguns. Às vezes dois, às vezes três. E por conta do radinho mágico, dependendo do lugar onde você estava na sala, o som ia mudando.

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A minha primeira reação foi ficar girando no mesmo lugar pra ouvir tudo e olhar pra tudo. Foi quando eu parei, olhei pros lados e vi: as várias pessoas que estavam na sala naquele momento experimentavam cada uma o seu show particular, escolhiam pra qual tela olhar, mas todas, sem exceção, estavam emocionadas. Eu me sentei no chão de carpete, encostada num canto e chorei. Quietinha, no meu canto, eu chorei um bocado. Eu não conseguia entender o que acontecia, mas acontecia e era incrível, era lindo e era totalmente inexplicável. E foi, assim, que o amor chegou. A paixão era evidente, mas sim, eu amava Bowie, assim. Talvez porque isso seja mesmo o amor, uma coisa que apesar de poder ser recíproco, compartilhado ou não, no fundo você experimenta sempre sozinho. Tem a ver com o que te afeta, como te afeta e como você olha e esquece tudo ao redor. Nada importava naquela hora, então eu me entreguei. E como em todo amor, não dava vontade de partir.

Várias vezes eu me perdi da Isabella lá dentro e quando olhava pro lado ela ainda estava com a mesma cara de quando tinha chegado. A gente digeriu cada pedacinho daquilo tudo e tentou guardar o máximo que deu. No fundo eu acho que se alguém me pedir pra contar as coisas que aprendi sobre ele na exposição eu não vou saber dizer muita coisa. Porque não é por aí. E quem sabe valha a pena a gente pensar se a gente aprende alguma coisa efetivamente sobre quem se ama ou sobre o que se ama, porque eu acho que não. O amor é essa experimentação constante do que diz alguma coisa, do que brilha na e da gente. Porque, na verdade, afeto a gente não vê, não toca, não define. Os afetos estão por aí, pra serem vistos com o corpo, pra serem sentidos pela alma e a gente sabe que eles vem quando dá aquele vazio que vai crescendo lá dentro do estômago e sai pela boca iluminando tudo ao redor. Quando a gente experimenta o amor é lisergia pura.

Quando eu comecei a escrever esse texto, tinha pensado em pesquisar fotos, falar da exposição, tentar contar pra quem não pôde ir o que deu pra ver por lá. Mas não deu. Não dá. Como eu disse no começo, esse é um texto sobre o amor, e só quem vive um amor é capaz de enxergá-lo como ele se dá.

http://arte1.band.uol.com.br/homenagem-a-david-bowie/

A nossa viagem continuou linda. A comemoração do aniversário do Masili teve ainda mais uma surpresa, com a chegada da Carol.

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Eu voltei pro RJ no domingo e a primeira coisa que fiz foi baixar a discografia do Bowie. Na época, escolhi 4 discos pra ouvir: Heroes, The man who sold the world, The rise and fall of Ziggy Stardust and the spiders from Mars e, claro, Space Oddity. Os quatro estão no meu iPod até hoje – já são dois anos – e ainda não consegui parar de ouvi-los, nem achei que era a hora de passar pra outros. Depois disso comprei o meu primeiro vinil do Bowie, claro, Space Oddity. Depois que minha irmã se mudou e levou a vitrola, o disco passou um tempo na casa da Isabella, até que no meu aniversário do ano passado, Isabella, sendo Isabella, me devolveu o disco – com uma vitrola de presente.

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Mas antes disso, no natal de 2014, eu ganhei da minha irmã e de outra amiga um outro presente maravilhoso. Um livro lindo e sensacional da exposição, que eu nem sabia que existia. Pra quem quiser ver mais, tá aqui ó: http://editora.cosacnaify.com.br/ObraSinopse/2215/David-Bowie-.aspx

Quando Bowie se foi no início dessa semana meu coração apertou, mas eu não chorei. Eu disse pra mim mesma que era uma bobagem, que não tinha porque. E aí hoje, eu decidi usar esse lugar tão querido que é o Faniquito pra fazer a minha despedida desse grande amor que se foi. Finalmente, eu chorei. Eu ainda tento entender porque a tristeza de vê-lo ir. Mas como é amor, não tem nenhuma explicação. Pelo que vi e ouvi de algumas pessoas, a conclusão que chegamos é de que talvez seja mesmo difícil entender que Bowie era tão mortal quanto a gente, e que pra ser mais de um, todos e nenhum é só a gente querer.

E, assim, eu me despeço desse texto tão querido e do Bowie, esse amor tão recente e tão arrebatador, como eu já disse em algum outro momento. Agradecendo a ele por ter sido todos eles e até o fim ter sido mais. E aos meus amigos que me ensinaram, como o Bowie: “I never thought I’d need so many people”. Amo vocês.


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Brasil, Fofuras

Quando viajar é o caminho para curar a alma

1 de outubro de 2015

Por Daniela Beneti


Quando falamos de viagem é muito fácil se concentrar nos grandes destinos. Afinal, viajar para outras culturas é sempre um desafio, uma experiência enriquecedora com muito para contar.

Mas nem toda viagem é sobre superação de limites. Algumas podem ser sobre superar perdas e podem acontecer bem mais perto do que você imagina.

Em 10 de maio desse ano eu perdi minha avó materna, que morava comigo. Foi minha mãe que a encontrou de manhã, ao abrir a porta do quarto para desejar um feliz Dia das mães. Mesmo sendo uma idosa acamada (ela tinha artrite, mas estava lúcida), sua morte foi uma surpresa e a coincidência da data teve um efeito devastador para ela, que cuidava de minha avó integralmente nos últimos 10 anos numa rotina exaustiva.

Na época eu, que sou redatora publicitária, estava trabalhando como freelancer pois tinha sido demitida do emprego anterior em março. Minha situação financeira era instável, mas vendo minha mãe tão abalada, resolvi que ela precisava de um tempo fora de casa para se recuperar.

Junho teria um feriado prolongado, Corpus Christi, e resolvi procurar um lugar para refrescar a cabeça. O problema é que a maioria dos lugares próximos à São Paulo cobravam verdadeiras fortunas por quatro dias. Era mais barato se hospedar num quatro estrelas no Chile, por exemplo. O problema era passagem. Praia até era viável, mas não oferecia o que eu precisava – calma, sossego e reflexão.

Águas de Lindóia: Praça Adhemar de Barros, a principal da cidade, foi projetada por Burle Marx.

Águas de Lindóia: Praça Adhemar de Barros, a principal da cidade, foi projetada por Burle Marx.

Depois de muito procurar, achei um hotel legal, com pensão completa, na pacata Águas de Lindóia, a apenas 4 horas de ônibus do ABC Paulista. Fechei e só comuniquei minha mãe 20 dias antes, tentando evitar resistência da parte dela. Mesmo assim, ela não queria ir. Se sentia culpada, chorava o tempo todo lembrando.

Conforme o dia da viagem se aproximava, ela se viu obrigada a tomar as providências necessárias. O que levar, quem vai olhar a casa e outras questões do gênero começaram a ocupar sua mente e acalmá-la. Embarcamos na quarta, 3 de junho e chegamos lá depois de 5h de viagem.

Ao chegar, descobrimos que a pacata cidade não estava mais tão calma. Havia um encontro nacional de carros antigos acontecendo, com mais de mil expositores, cidade absolutamente lotada. E nosso hotel, o Panorama, era quase ao lado do evento.

Encontro de carros antigos.

Encontro de carros antigos.

Minha mãe adora carros e ficou animada em rever carros dos anos 60, 70 e 80. Assim, dividimos nossos dias entre os carros antigos, o Balneário Municipal e suas águas terapêuticas, o comercio local, passeio de charrete e de trenzinho. O hotel tinha SPA com piscina aquecida para relaxar (pago a parte, o que achei meio bizarro), e também almoços e jantares temáticos – francês, alemão, gaúcho, etc.

A equipe de animadores se esforçava de verdade para oferecer uma programação família e agradável. Sexta e sábado tivemos show na recepção com banda local e dança puxada pelos animadores. Teve até uma mini festa junina fez o pessoal se divertir com quadrilha, casamento caipira e comidas típicas. Uma coisa singela, mas que fez minha mãe sorrir depos de 3 meses, mantendo a mente ocupada e aliviando o coração.

O Balneário Municipal é um pouco diferente do que eu esperava. Na verdade é uma viagem para a década de 50, quando se criou locais de banhos terapêuticos. Apesar de municipal, apenas as piscinas são gratuitas (mas não aquecidas) e o local é cercado por jardins (também de projeto de Burle Marx) bancos de praça, onde os idosos ficam para conversar, tricotar ou apenas olhar o movimento. Também é possível beber gratuitamente a água das 5 fontes disponíveis no local.

Projetado por Arthur Bratke, arquiteto modernista, o local conta com mosaicos de Lívio Abramo e foi erguido sobre fontes de águas radioativas, com emanação de radônio e torônio. Calma, ninguém sai contaminado por radiação – a quantidade que emana tem propriedades boas para a saúde segundo diversas pesquisas, ajudando em problemas renais, alergias, rinites, traqueobronquite e outros problemas, além claro de ação relaxante. Parece que é uma das águas com maior quantidade de oxigênio do mundo.

Mas para fazer banhos nessas águas, é preciso pagar – os tratamentos são individuais em modelo de SPA, com preços variados, incluindo massagens, banhos perfumados e tudo mais. Fizemos os banhos Mediterrâneo e Romano, que duram 20 minutos, custam R$ 38 e teoricamente ajuda, no sistema circulatório. São feitos em cabines individuais com banheiras e um quartinho para se trocar e, nesse caso, a água é aquecida. Os banhos ajudaram minha mãe nas dores que ela sente nos joelhos e fizeram com que se sentisse mais leve.

Madame Curie, vencedora do Nobel de Física e de Química, esteve em Águas de Lindóia para estudar as propriedades radioativas das águas.

Madame Curie, vencedora do Nobel de Física e de Química, esteve em Águas de Lindóia para estudar as propriedades radioativas das águas.

A cidade em sí tem poucas atrações, mas pode ser ideal para quem procura um canto tranquilo. Recomendo que quem for invista em um bom hotel para relaxar nas boas instalações. Não espere uma agitada vida noturna: Águas é uma cidade pacata, que gira em volta da praça Adhemar Barros.

Existe um passeio de trenzinho para o Cristo da cidade, mas sinceramente, não vale muito a pena, apenas se você se interessa pela vista da cidade. O Cristo em sí é uma cópia estranha do Cristo Redentor e não vale a visita. Prefira a tranquilidade de um piquenique na praça e andanças pela cidade.

Ao final da viagem, embora com o coração ainda apertado de saudade, minha mãe estava melhor. Sentia que a vida podia continuar. Porque é isso que vemos quando viajamos: a vida segue, você pode se reinventar. Certas viagens podem ajudar no processo de cura do corpo e da alma.

Passeio de charrete e clima de interior.

Passeio de charrete e clima de interior.

Isso porque lugares mais pacatos nos forçam a um encontro com nós mesmos, onde podemos refletir e descobrir nossas próprias forças e fraquezas, ver os problemas do dia a dia com um certo distanciamento. Na quietude percebemos que as lembranças mantém as coisas boas vivas dentro de nós, inclusive aqueles que amamos.

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Causos, Comunicação, Fofuras

Três dicas bacanas, e duas pitadas de coisas boas

27 de julho de 2015

Estávamos planejando nossa viagem dentro da própria viagem – sempre com uma cidade/país de antecedência pelo menos, já com as informações básicas na mão. É um hábito que temos (e um dos pilares desse site, que se diga, pois prezamos pela aventura – desde que ela tenha pelo menos um dedinho de controle e perspectiva). E em nosso mochilão pelo Leste Europeu, após uma semana e 4 países visitados (Romênia, Polônia, República Tcheca e Eslováquia), tínhamos até então uma viagem relativamente tranquila. Nossa quinta parada era a Hungria, e por lá estávamos enquanto este causo se desenrolava.

Causo sim, porque não sabíamos ainda de que maneira chegaríamos ao nosso próximo destino: Zagreb. Estávamos em Budapeste, e em nossas pesquisas (mais) um ônibus parecia ser a forma de locomoção mais adequada até a próxima cidade. Assim que chegamos à capital húngara – mais especificamente no dia seguinte, uma vez que chegamos debaixo de chuva, e com chuva passamos nosso primeiro dia por lá – começamos a pesquisar de que maneira faríamos tal trajeto. Existiam algumas possibilidades, mas como tudo o que pesquisávamos, eram informações novas e de caráter absolutamente desconhecido. E chegamos aqui ao nosso primeiro ponto:

1) Tenha (e não tenha) medo de pessoas

A gente e o Anton - nosso amigo e protagonista das próximas linhas desse texto.

A gente e o Anton – nosso amigo e protagonista das próximas linhas desse texto.

Aprendemos muito cedo (e em outra viagem) que nem todo demônio é vermelho, nem todo anjo tem asas. “É viajando que a gente conhece as pessoas“, profetizou uma pessoa certa vez, e essa é uma verdade irrefutável. Tem gente que se descontrola durante esse período, e exagera – pro bem ou pro mal – em determinadas situações. Portanto, não confie cegamente nos relatos alheios: suas impressões, seu conforto e suas expectativas têm relação direta com a sua personalidade e sua proposta de viagem.

Sendo assim, sempre que pesquisamos “coisas que dependeriam de gente”, procuramos nos informar se aquela REALMENTE era uma boa ideia com os locais. E no caso dessa viagem Budapeste/Zagreb, não foi diferente. Porém, a forma como isso ocorreu que foi engraçada, e nos dá margem à segunda dica:

2) Preste atenção aos sinais

Oras, estávamos num albergue localizado a algumas quadras do centro de Budapeste – mas o casarão, por alum motivo bizarro, era quase que completamente “decorado” com pôsteres, lembranças e coisinhas croatas. “Esse tiozinho não promove a própria cidade? Mas que cacete…” foi meu primeiro pensamento. E resolvemos matar a curiosidade sobre aquele fato perguntando ao gordinho bigodudo de voz fina.

– Eu nasci em Zagreb, mas vim morar em Budapeste.

Decoração náutica, pôsteres de Split, Dubrovnik e Plitvice. Nada de Budapeste... por que?

Decoração náutica, pôsteres de Split, Dubrovnik e Plitvice. Nada de Budapeste… por que?

Explicado, meus amigos. E instantaneamente o senhorzinho (chamado Anton) se tornou nossa fonte mais confiável de informações sobre nossos próximos destinos. Com isso, deixamos o protocolar bom dia/boa noite de lado, e passamos a puxar assunto com o sujeito. O que leva à terceira e última dica desse texto:

3) Amizades acontecem

Assim que chegamos, caía um mundo de chuva. Ficamos ilhados no albergue. Era começo de noite, nossos estômagos estavam nas costas. Resolvemos perguntar ao Anton se seria possível nos emprestar um guarda-chuva para irmos até algum restaurante próximo. Ele nos emprestou duas capas. E capas BACANAS, não aqueles sacos plásticos com capuz. “Pra gente ir tranquilo e voltar quando quiser”, sorrindo. Ganhou de cara nossa simpatia – e alguns bons votos de confiança.

Se não fossem as capas do Anton, não teríamos tido nossa primeira (e acachapante) impressão do prédio mais bonito que já vimos na vida: o Parlamento de Budapeste.

Se não fossem as capas do Anton, não teríamos tido nossa primeira (e acachapante) impressão do prédio mais bonito que já vimos na vida: o Parlamento de Budapeste.

Porém, a maior surpresa aconteceu alguns dias depois, num papo sobre como chegar à Croácia de ônibus. Fomos perguntar ao Anton quais as linhas mais confiáveis, quanto custava, e antes mesmo de engatarmos a segunda pergunta ele nos veio com essa:

– Se vocês esperarem mais dois dias, eu vou pra lá de carro. Vocês podem vir comigo de carona, se quiserem.
– Uou! E quanto sai, Anton?
– Não sai nada, é carona. Vocês vão comigo e eu deixo vocês na rodoviária.
– <3

Dé, esperando a carona pra Croácia, com aquela cara de "a gente se deu bem nessa" - e se deu bem mesmo, meus amigos :)

Dé, esperando a carona pra Croácia, com aquela cara de “a gente se deu bem nessa” – e se deu bem mesmo, meus amigos 🙂

E numa viagem em que toda grana poupada é uma bênção, a economia pode estar num papo bacana com alguém ainda mais bacana. Antes que perguntem: claro que não dá pra confiar em todo mundo, muito menos tomar isso tudo como regra. Mas são possibilidades, que existem pra valer. No mundo existem dois tipos de pessoas: as boas e as ruins. E elas estão por aí, espalhadas pelo mundo. Se a gente tiver um mínimo de inteligência e sagacidade (sempre quis usar essa palavra num texto) e ficar atento aos lugares e pessoas que passam pela gente, a chance de termos boas surpresas é enorme.

Vale pra viagem, mas vale pra vida também 🙂

Faniquito, Fofuras

A Dé e o Paul

18 de junho de 2015

De certa forma, é muito fácil escrever o texto de hoje.

É dia 18 de junho, aniversário do Paul McCartney. E como nosso site se propõe a falar de qualquer assunto relativo a viagens, é a primeira vez que o tópico “música” aparece por aqui. Paul McCartney que é de longe um dos sujeitos que mais amamos aqui em casa, e por quem abrimos nossos corações sem nenhuma censura. Um sujeito bacana, levinho e extremamente talentoso, cujo rosto estampa o pôster que está na parede da sala, juntamente de seus outros três amigos. Bobo eu seria se não desse à sua música ou dos Beatles os devidos créditos por viagens constantes, as quais felizmente posso fazer muito bem acompanhado.

Paul aniversaria hoje, e cantou nossa última música enquanto namorados, na manhã do nosso casamento. Por um minuto e quarenta e cinco segundos, “I Will” fez as vezes de calmante para um cara naturalmente nervoso, que precisou travar os dentes para que o coração não saísse pela boca. Naquele mesmo ano de 2010, teríamos a oportunidade de encontrar o ilustríssimo músico inglês – oportunidade que seria única, não tivéssemos cometido a loucura de comprar ingressos (caros, muito caros, ainda mais pra quem havia acabado de comprar um apartamento) para seus dois shows, em dias seguidos. Poucas vezes fomos tão felizes, com duas vezes três horas de uma espécie de hipnose coletiva cantada a plenos pulmões. Viajamos para longe, muito longe… sim, havíamos visto um beatle – de pertinho no primeiro dia, debaixo de chuva e um pouco mais longe no segundo. Cruzamos uma fronteira da vida que para ambos era tão importante quando conquistar novos horizontes, e daquelas duas noites jamais esquecemos.

Uma selfie antes do melhor show das nossas vidas.

Uma selfie antes do melhor show das nossas vidas.

Paul foi o responsável por tortamente adquirirmos um videogame, um controle em forma de bateria, outros de duas guitarras e um microfone, para que por vezes espalhássemos finais de semana caseiros em música que nos remete às nossas vidas. A casa vira taverna. A gente permanece viajando.

Paul é um membro da família, sem a menor dúvida. E pra ele eu deixo meu mais sincero desejo de felicidade plena e eterna – a qual ele certamente terá, dado que sua obra é imortal. E agradeço, por aproximar ainda mais minha pequena de mim. Não haveria escolha mais óbvia e linda para começarmos nossa vida juntos. Uma vida que já tem mais de 7 anos de história. Mas que hoje, seu aniversário, embala novamente o aniversário de outra pessoa, que me permitiu conhecer algo além do quintal de casa (quando minha casa nem quintal mais tinha), e me apresentou o mundo – para o qual passei a escrever há alguns meses por aqui.

Porque hoje Paul, é aniversário da Dé. Que num passado não tão distante me contou num desses churrascos da vida que tinha um sonho pra vida: conhecer Machu Picchu. Naquela época eu sequer imaginava que um dia seríamos os dois uma coisa só lá na frente, e aquele sonho contado de maneira tão distante me parecia coisa mais que difícil de ser feita – eu, devendo os tubos em cheque especial, ela vivendo de aluguel num quartinho na Vila Mariana. O tempo passou, as vidas se trombaram, e um ano depois de “I Will” encerrar nosso namoro e iniciar nosso casamento desembarcávamos no Perú. Não por acaso, a primeira foto do primeiro texto do Faniquito é justamente sobre essa conquista.

Do churrasco a Huayna Picchu foi um longo caminho.

Do churrasco a Huayna Picchu foi um longo caminho.

Foi com ela que eu reaprendi a sonhar (porque sim, meus amigos – eu desconfio dessa gente que é feliz o tempo todo, 24/7), desses sonhos fazer planos, e desses planos montar projetos que virariam viagens, que nos levariam a outros continentes, ou a um show do Paul McCartney. Foi ela que me segurou quando meu pai se foi, e com ela eu imaginei uma vida perfeitamente possível, e totalmente imprevisível, uma vez que sempre fomos o casal improvável. Mas deu tudo certo, e a gente tem muito a celebrar, sonhar,  planejar e viajar ainda.

Faniquito funcionando até em dia de chuva :)

Faniquito funcionando até em dia de chuva 🙂

Por isso, o texto de hoje saiu fácil. Falar daquilo que a gente ama é fácil, e a gente faz isso toda segunda e quinta. Mas hoje, me dei ao direito de falar de QUEM eu amo – e que não por acaso, contextualiza tudo isso de uma maneira muito simples. Parabéns Jinhu (ela é Dé pra vocês, mas Jinhu só pra mim)… e que seus sonhos continuem cada vez mais altos, distantes e coloridos. Eu compro todos, e deles faço questão de fazer parte e contar história por aqui.

Causos, Fofuras

As coisas simples da vida, e das viagens

21 de maio de 2015

Por Daniela Beneti


Oi gente! Já tô de volta pra mais uma participação especial no Faniquito, tipo convidado em seriado americano. Espero que vocês gostem de me ver/ ler por aqui.

Bem, ao vasculhar minhas fotos para o post anterior (não viu? É esse aqui ó), eu achei algumas que são legais por um motivo especial: não tem nenhum ponto turístico.

Claro que ver os grandes marcos, tipo Torre Eiffel, Coliseu, etc, é maravilhoso. Mas se tem uma coisa nesse tipo de viagem que eu realmente adoro é experimentar o dia a dia de lá.

Tá servida, Mademoseille? Ostras fresquinhas!

Tá servida, Mademoseille? Ostras fresquinhas!

Algumas das lembranças e histórias mais legais que eu tenho das viagens envolvem fazer coisas banais, tipo ir à feira livre. É, feira. Na França é muito comum e bem parecido com as que temos no Brasil. É até maior – fui parar em uma pra comprar uma mala nova, pois a minha tinha arrebentado o zíper ainda na ida.

Como raios fui parar na feira pra isso? Ora pois, mas foi Maria, nossa simpática copeira/ cozinheira portuguesa do hotel de Paris. Fui perguntar para o recepcionista onde poderia comprar malas, qual o shopping (ê paulista) mais próximo, ela ouviu e lascou logo o português: “Mais vais a pagar caro!  Deixa-te disso, vais a Duplex!

Aí você, como eu, pergunta o que é Duplex. Ela não me respondeu, só fez um “Duplex, sabes?” (não, eu não sabia) “Segues aqui ó, veja bem. E vais a achar equipagem baratinha” . Desenhou um mapinha no guardanapo e nos despachou porta a fora.

Ora pois, essa é Maria, uma figura portuguesa com certeza.

Ora pois, essa é Maria, uma figura portuguesa com certeza.

Fomos pra Duplex pensando que era uma loja especializada. Só que Duplex é uma das trocentas estações de metrô de Paris, sendo essa suspensa. Embaixo dela tem uma feira de rua, igualzinha as daqui – gente falando alto, comendo guloseimas, comprando frutas e legumes. E sim, malas. Roupas. Sapatos. A feira lá é bem abrangente. Claro que tem produtos locais, tipo ostras enormes, muito queijo. Foi muito legal.

Mas eu mentiria se dissesse que era a primeira vez que via uma feira de rua na Europa. Quando fiz mochilão, em 2008 com minha amiga Camila Dean, nosso hotel no subúrbio de Paris tinha uma feirona logo em frente. Quando chegamos em Nice, no sul da França, descobrimos que a feira de lá é famosa e vimos pela primeira vez frutas como groselha e framboesa, frescas. À noite, as barraquinhas são recolhidas e tudo vira restaurante. Conhecemos dois sul-coreanos no trem e fomos lá, beber.

Claro que nada supera descobrir como são feitas aquelas balinhas coloridas com desenho no meio. Eu e meu pai passeávamos em Praga quando vimos uma vitrine estranha, onde o vendedor juntava grandes blocos coloridos e brilhantes em um bloco. E esticava. Azul, marrom, creme. Esticou até aquilo ficar fininho – e não era trabalho fácil, pois os tubos originais eram enormes. No final, ele picotou aquele tubinho e nos deu: eram balas, e ele havia desenhado uma árvore dentro. Não acredita? Olha aí embaixo.

Nunca na vida eu ia acreditar se não tivesse visto.

Nunca na vida eu ia acreditar se não tivesse visto.

Outra coisa que gosto de fazer em viagens é ir ao mercado para comprar pão, frios, água, suco. Isso ajuda muito a diminuir seus gastos com alimentação durante o trajeto e te coloca em contato com os hábitos locais.

Em Portugal, descobri que tangerina é clementina. Em Santiago do Chile, descobri que todos os produtos de higiene vem em embalagens enormes, tamanho família, e fiquei amiga do pessoal do caixa. Em Paris, conversei com uma velhinha na fila que adorou saber que eu era brasileira, me deu balinhas e, quando eu disse que gostava muito de Paris, me respondeu “Bien sure, tout le monde aime Paris, c’est fantastique”.

Passei vergonha no mercado em Roma, perto da estação Termini, ao erguer um cacho de uva e o maldito se desfazer, com todas aquelas bolinhas rolando, alegremente, enquanto todo mundo olhava o desastre.

Não foi nenhum chef famoso, foi perto da Termini. Mas olha, não trocaria meu simpático tiramissu por sobremesa gourmet nenhuma.

Não foi nenhum chef famoso, foi perto da Termini. Mas olha, não trocaria meu simpático tiramissu por sobremesa gourmet nenhuma.

Outra coisa que adoro são os restaurantes pequenos e escondidos. Nunca fico caçando restaurantes que guias e reportagens recomendam. Não dá tempo. Mas entrar em restaurantezinhos locais sempre rende boas surpresas e histórias hilárias.

Como em Salamanca, quando duas meninas famintas (eu e Camila) entraram em uma lanchonete e viram que tinha tortilha – um tipo de omelete espanhol com batata. Pedimos e veio um lanche RECHEADO com uma tortilha enorme. Comendo assim, claro que tem que fazer siesta, vocês tão malucos.

Ou quando, novamente famintas (eu andei muito no mochilão, tenham compaixão), e sem nenhum restaurante por perto no subúrbio de Florença, eu e Camila entramos em uma cantininha a noite.

Ok, lanche de tortilha. Pela minha cara de felicidade, dá pra ver que é bom.

Ok, lanche de tortilha. Pela minha cara de felicidade, dá pra ver que é bom.

O lugar inteiro parou e olhou para nós – só famílias do bairro. Sentamos, veio a garçonete com o cardápio. Queríamos algo que não fosse macarrão ou lasagna daquela vez e minha amiga viu “Petto de taquino à caprese”. Sabendo que caprese era uma salada, perguntou “Petto de taquino?” e encolheu os ombros. A garçonete saiu correndo. “Caramba o que foi que você disse, Camila?!”

Quando a garçonete voltou, olhou pra nós, concentrada. Todas as mesas nos observavam em expectativa. Ela então bateu os braços, imitando um pássaro e disse “turkey”. É, esse suspense todo pra dizer que era peito de peru. Sensacional.

Teve o restaurantezinho na Normandia, em uma das cidadezinhas beirando a costa. Eu e meu pai, estávamos em uma viagem temática de Segunda Guerra e ele quis visitar as praias do Desembarque. Na volta, Seu Ricardo queria porque queria jantar em um restaurante típico, mas não havia nada no caminho.

Depois de rodar por vilas que pareciam abandonadas, vimos um restaurantezinho pequeno e simpático. Donos também muito simpáticos nos receberam, mas só falavam francês e eu falava muito pouco da língua na época. A dona tentou me oferecer pratos típicos , mas quando foi me explicar o que era “tête de boeuf” e quis me mostrar, o cozinheiro interviu: “melhor não”. Era miolo de boi, pessoal. O cozinheiro salvador sugeriu uma pizza, que de estranho tinha só um ovo frito no centro. E bebemos a verdadeira Cidra – nada dessa coisa que te dão no Natal, não. A Cidra é o orgulho da Normandia, é uma delícia e sobe que nem rojão.

Na Normandia, a pizza tem um ovo frito malandro no meio. Mas ainda é melhor que “Tête de boeuf”.

Na Normandia, a pizza tem um ovo frito malandro no meio. Mas ainda é melhor que “Tête de boeuf”.

Essas são só algumas das histórias de cotidiano em viagem. Porque pra mim isso é ser viajante e não turista: experimentar a vida local, falar com as pessoas, andar de metrô, trem, ônibus. E perceber como temos coisas em comum com outros povos, coisas que nem percebemos, que nos aproximam do outro e nos tornam mais tolerantes quando voltamos.

Esse simpático casal viu eu e minha mãe passeando em Mendoza e resolveu conversar com a gente, tirar nossa foto e quiseram ser fotografados, mostrando como os Mendocinos são hospitaleiros.

Esse simpático casal viu eu e minha mãe passeando em Mendoza e resolveu conversar com a gente, tirar nossa foto e quiseram ser fotografados, mostrando como os Mendocinos são hospitaleiros.


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Faniquito, Fofuras

Quando o importante não é o destino

30 de março de 2015

Nossa primeira viagem não foi exatamente uma viagem. Ainda namorando, fomos tomar café da manhã num sábado qualquer. Estávamos com um guia (acho, realmente não lembro bem), e enquanto dividíamos um suco de laranja, resolvemos sortear um lugar naquelas páginas: sairíamos da padaria, pegaríamos o carro, uma troca de roupa e iríamos para… Cunha. Eu nunca tinha pego estrada na vida, mal sabia onde ficava Cunha, o que tinha por lá, se tinha algo pra fazer. Não importava: eu iria com a Dé.

Foi uma baita de uma viagem – apesar da multa por excesso de velocidade, da busca incessante por um lugar pra dormir (e o resultado dessa busca), da ida à cachoeira do macaco. A estrada por um bem comum: alguém que a gente quer por perto. A cara de bobos felizes está ali em cima, ilustrando o texto de hoje.

Pois bem. Fizemos um bate-volta nesse final de semana até Joinville.

Aniversário de família – mais especificamente, da minha mãe. Uma festa-surpresa. Mas esse texto não é para contar como foi, e sim sobre a ação em si: viajar por uma pessoa, não por um lugar. Ação que eu e a Dé conhecemos muito bem, pois ambos já namoramos pessoas distantes o suficiente pra não chamarmos nossas visitas de “coisa corriqueira” – 500 quilômetros de distância não são exatamente “um pulo ali na esquina”.

A gente tava cansado e gripado em Joinville, mas nem parece.

A gente tava cansado e gripado em Joinville, mas nem parece.

Porém certas circunstâncias pedem por esse esforço. A saudade é mais intensa, e toda ocasião torna-se especial. Se uma viagem de dez, quinze, trinta dias já passa rápido, o que dizer de um final de semana? Um feriado? Aeroporto, estrada, pedágios, check-ins, esperas… não é mole, pois a dor de cabeça do ir e vir que você passa em qualquer viagem mais longa (mas que acaba diluída em dias de sossego e diversão) compete com o pouco tempo que a gente tem com quem encontra do outro lado. E fica a pergunta: vale a pena esse esforço?

– Vale.

Às vezes a distância é bem curtinha. Mas o fator surpresa fica.

Às vezes a distância é bem curtinha. Mas o fator surpresa fica.

Fora nossos namoros, temos algumas poucas ocorrências desse tipo de situação. Algumas pessoas que vêm REALMENTE de longe (outro país, outros estados), algumas de cidades próximas daqui de São Paulo, além de nossas próprias idas, como a desse final de semana. Lembro exatamente de todas as reações: de quem recebe, e de quem é recebido. Sempre um baque gostoso, de “cacete, o que você tá fazendo aqui?”. Os abraços são mais longos, os sorrisos mais largos. Uma surpresa boa nunca machuca – apesar de sempre parecer letal, pois quem é surpreendido tem sinais de tremedeira, descontrole emocional e falta de chão em trocentos porcento dos encontros.

Quando 3 cariocas invadiram São Paulo...

Quando 3 cariocas invadiram São Paulo…

...pra que alguns meses depois, dois paulistas invadissem o Rio.

…pra que alguns meses depois, dois paulistas invadissem o Rio.

Esse breve, cansado, atrasado e sincero textinho de hoje é um incentivo ao turismo emocional. Sim, esse que não tem preferência por destino, mas por pessoas. Ele pode ser simples (como visitar aquela pessoa que mora a dez minutos da sua casa) ou bem mais complicado, com horas dentro de um carro. ônibus ou avião. Pode precisar de balsa. De reserva. De algum dinheiro a mais. Ser recebido ou receber alguém que é capaz de encarar distâncias, alguns obstáculos, e esse monstro medonho chamado preguiça é uma sensação que abrilhanta qualquer vida. Afinal de contas, a gente só é feliz perto de quem ama. E quando estar perto equivale à distância de um abraço, tudo vale a pena.