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Venezuela

Uma saga chamada Roraima (6/6)

12 de abril de 2016

Com muita tranquilidade, acordamos para nosso último dia no Monte Roraima. Voltar a dormir na primeira base foi um misto de alívio e realização, uma vez que havíamos sim vencido o gigante, e toda dor dali em diante faria parte do preço pela aventura. Podíamos lidar com isso. Além do mais, havíamos tomado banho após longos dois dias e meio, e a sensação de ares renovados ultrapassava qualquer explicação que eu seja capaz de dar.

Pro meu azar, o café da manhã era omelete (eu não como ovo). Não lembro qual a opção que havia naquele momento, mas sei que havia uma, e tomamos nosso café da manhã sem pressa. Arrumamos nossas coisas, e a última coisa a ser feita foi calçar as botas pela última vez. Os pés estavam machucados demais, e seriam mais 13 quilômetros naquela condição. Mas botamos a mochilinha nas costas e seguimos.

Sem a pressão da descida, fizemos o caminho de volta sem atropelos. Com o corpo já aquecido, as dores aumentaram e o cansaço não tardou a aparecer. Mantivemos nosso ritmo (que era lento, mas constante) e seguimos adiante, com rápidas pausas pra água e algum descanso. O visual da manhã era lindo, e o tempo ainda ameno nos ajudava.

Não é todo dia que essa é sua paisagem matinal.

Não é todo dia que essa é sua paisagem matinal.

Com o calor aumentando, o restante do grupo se distanciou e novamente restamos apenas nós dois. Caminhávamos lentamente no trecho final, e já nos últimos metros, quando existiam subidas e descidas, tomamos todo o cuidado do mundo para não aumentarmos ainda mais os problemas físicos que vínhamos acumulando pelo caminho: as articulações estavam doídas, as costas pesavam e a respiração não era fácil – mas tudo isso devido à nossa total falta de preparo para a aventura. Quando avistamos a entrada do parque, fomos tomados de uma alegria tão grande que a única coisa que pensávamos naquele momento era “vamos chegar”. E chegamos.

Assim como ocorreu durante nossa chegada ao Roraima, o grupo todo nos aguardava e comemorou nossa vitória. Eu segui direto pro banheiro, onde tomei um banho na pia e fiz aquele xixi na alvenaria que há quase uma semana não fazia. Quando voltei, a Dé estava encostada, com a pressão caindo. Corri em direção ao Ricky, e ele ainda mais rapidamente foi socorrê-la. Puxou do bolso um vidrinho com extrato de cânfora e fez a pequena ressurgir numa fungada só que ela deu. Os jipes chegaram na sequência, e ele ordenou que ela fosse a primeira a entrar, e ficasse próxima dele durante nossa volta. O mesmo guia que havia me recomendado não subir, que tirou um sarro com a nossa cara na noite anterior e que salvou a pele da Dé em nossos últimos momentos por lá. Um cara legal, o Ricky.

Crentes que seríamos levados direto pro hotel em nossa volta, qual não foi nossa surpresa quando o jipe tomou o sentido contrário na rodovia principal e seguiu adiante. Pouco depois, o dito parou num restaurante de beira de estrada. Nosso fechamento seria UM ALMOÇO. COM CERVEJA GELADA. E COCA-COLA GELADA.

Sério povo, vocês não imaginam o que é aproveitar um momento.

Apesar de ter mais gente na foto do que no nosso grupo, é essa nossa segunda e última foto conjunta na até o momento maior aventura das nossas vidas.

Apesar de ter mais gente na foto do que no nosso grupo, é essa nossa segunda e última foto conjunta na até o momento maior aventura das nossas vidas.

Enfim, relaxamos. Devidamente comidos, agora sim seríamos deixados no albergue do Backpackers (que era vizinho ao nosso, ou seja, fomos deixados na porta do nosso destino). Mochilinhas e mochilões desembarcados, a primeira providência foi um banho de chuveiro. E que coisa linda é essa coisa de chuveiro, não? Ventilador no teto. Uma cama macia. Um teto sobre a cabeça. A gente valoriza tudo depois de não ter nada, e que diferença é nossa cabeça apenas uma semana depois. Do grupo, alguns amigos permanecem em contato com a gente até hoje, e de tanta dificuldade carregamos as melhores lembranças – principalmente, porque as dores passam. No corpo, na vida… só fica o que é bom.

E é por isso que a gente viaja.

Venezuela

Uma saga chamada Roraima (5/6)

22 de março de 2016

Acordamos cedo, de verdade. Não sei que horas eram, mas ao abrir a barraca não existia Monte Roraima. Tudo era névoa, e a sensação é que estávamos (e devíamos estar mesmo) no meio de uma nuvem espessa. Não era um bom sinal, pois a descida era perigosa mesmo em condições climáticas ideais. Aquele clima multiplicava o perigo. Fechamos a tela e começamos a nos trocar. Dez minutos depois, abrimos novamente e… nem sinal de névoa. Mesmo escuro, o céu estava aberto. Não há meteorologista que consiga decifrar o que acontece lá em cima…

O café da manhã consistia num mingau HOR-RO-RO-SO, e uma maçã. Nosso guia disse que era o desjejum ideal, e por isso encaramos até onde nosso estômago aguentou. Passamos para a maçã em seguida (pra tirar aquele gosto de papa da boca), e de barriga cheia arrumamos nossas coisas. Antes da descida, o Ricky reúne o grupo e pede para que todos oremos por um retorno em segurança. Definitivamente o papo sobre os perigos daquela manhã era bem sério. Seguimos.

O caminho era exatamente o mesmo de dois dias antes, no sentido inverso, com o agravante de somar a quilometragem do segundo dia, para que chegássemos à primeira base – aquele em que dormimos no primeiro dia. No total, eram 17 quilômetros pelo caminho, sendo 4 pra baixo e 13 pra frente. Pra animar, um visual inspirador antes da descida.

Era só descer. Simples, não?

Era só descer. Simples, não?

O primeiro trecho era justamente o Paso De Las Lágrimas, agora pra baixo. Pedras molhadas, um cuidado desgraçado, por muitas vezes encaixamos o corpo e fomos descendo quase de bunda. O grupo vinha unido, e com ordens expressas de não parar para fotografias naquele local sob hipótese alguma (o que explica um pouco a falta de imagens desse texto). No meio da descida, o celular da Dé dispara um alarme que ela esqueceu de desligar. Sem poder parar, seguimos com o alarme tocando por uns 20 minutos até a primeira parada. Uma cena que de tão ridícula foi engraçada demais.

Vencida essa etapa, agora “era só descer”. Parece fácil falando assim, mas não demorou para entendermos o porquê daquele dia ser justamente o mais difícil. Os obstáculos não eram tão grandes logo de cara, mas eram constantes. Já era nosso quinto dia, e não tardou para os músculos das pernas começarem a cansar. Descíamos lentamente (o grupo novamente desgarrou), e aos poucos os joelhos foram ficando bambos. Um pouco depois e já tínhamos que usar os braços para apoiar o corpo. A descida ficava mais íngreme, pois havíamos ultrapassado o paredão e entrávamos no trecho que levava até o segundo acampamento, e a trilha ficava definitivamente vertical. Os braços cansaram, e passamos a descer de bunda, literalmente. Nosso ritmo era cada vez mais lento, e a manhã ganhava ares dramáticos, quando finalmente chegamos.

A primeira parte tinha ficado pra trás. Ou pra cima.

A primeira parte tinha ficado pra trás. Ou pra cima.

Ao lado, a cachoeira do Kukenán lá longe.

Ao lado, a cachoeira do Kukenán lá longe.

Nisso todo o grupo já estava descansando e pronto para almoçar. Não tínhamos ideia de que horas eram. Ainda estávamos sem banho (naquele momento já eram dois dias desse martírio). Jogamos as mochilas no chão, pegamos um prato e comemos o que conseguimos, pouco antes de desabar no chão. Não se passaram dez minutos até ouvirmos o chamado do guia: “Vamos embora?”

Pegamos as mochilas e saímos antes de todo mundo, já sabendo que seríamos ultrapassados nos minutos seguintes – o que obviamente aconteceu. Com o passar do tempo, nos vimos (quase) isolados novamente (pois tínhamos a companhia do Christoph, um dos dois alemães do grupo, e que estava tão cansado quanto a gente), seguindo uma trilha que parecia ser a correta. Esse “parecer” começou a nos preocupar quando passamos a ter uma visão mais ampla do horizonte, confirmando que de fato não havia ninguém por perto. Acho que estávamos cansados demais para entrar em pânico, e seguimos adiante, confiando que chegaríamos ao nosso destino. O tempo se arrastava, e a impressão era de estarmos caminhando há horas. Meu maior medo era que chegássemos sem luz natural ao primeiro acampamento, e não pudéssemos tomar banho por mais um dia – coisa que já não dava mais pra tolerar.

Treze quilômetros de uma trilha não tão confiável (mais pra frente).

Treze quilômetros de uma trilha não tão confiável (mais pra frente).

Quando tudo parecia desgraçado, vimos alguém mais à frente. O coração acelerou. Era um dos guias, nos esperando para atravessar o primeiro dos dois rios que precisávamos cruzar. Não estávamos longe! Mas as pernas estavam esgotadas, e nosso medo de cair era gigante. Com todo o cuidado do mundo e com muta ajuda dele, atravessamos um a um até a outra margem. O Christoph resolveu ficar por ali mais um pouco para descansar, enquanto eu e a Dé seguimos desesperadamente para o primeiro rio. Queríamos chegar. Queríamos tomar banho. O ânimo ganhou sobrevida, e mesmo em frangalhos nos apressamos. O Ricky nos esperava no primeiro rio, e da boca dele veio nosso maior presente:

– Ricky! Que horas são?!?!?
– São 13h40.

SIM, ERA COMEÇO DA TARDE – AINDA!

A impressão era de fim de tarde, tal o nosso cansaço. Com a ajuda dele, atravessamos trôpegos e seguimos de meias encharcadas até o acampamento, que ficava pouco acima. Com exceção do Christoph e do canadense – que faziam parte do grupo, éramos novamente os últimos. Porém dessa vez, nada de mau humor. O grupo nos recebeu com uma alegria absurda, e a tarde era ensolarada e linda! Foi emocionante demais chegar ali, seguir até nossa barraca, arrancar a roupa e correr em direção ao rio!

Tomamos um banho que levou umas duas ou três horas, eu não sei precisar. Foi sem a menor sombra de dúvida – e debaixo de um sol delicioso – o melhor banho das nossas vidas.

Cheirosos, dignos e LIMPOS, voltamos ao acampamento. A Dé foi tirar um cochilo, eu fiquei com o grupo. Passamos a tarde conversando, ganhamos um queijinho (!) dos guias enquanto eles preparavam o jantar. O clima era leve, e não havia ser humano triste naquele lugar. Outros grupos estavam por ali – todos em seu primeiro dia de expedição. Alguns viajantes vieram pedir dicas e impressões da gente. A Dé apareceu, e agora estávamos todos do nosso grupo numa única mesa. Veio a comida (que era novamente macarrão – a gente não aguentava mais macarrão!), e pela última vez jantamos todos juntos. Assim que terminamos, o Ricky tomou a frente e preparou um agradecimento coletivo. Ressaltou o esforço de cada um, e novamente fomos… os últimos:

“Vocês dois… eu confesso que me enganei a respeito de vocês. Achei que os gordinhos (!) não iam conseguir, mas vocês estão aqui, e merecem os parabéns de todos nós!”

Meio fiodaputa, mas a gente aceitou o elogio.

Ainda mais porque em seguida os caras trouxeram duas garrafas de vinho (! de novo) pra todo mundo brindar o final daquele dia glorioso. O vinho era tão bom quanto o macarrão, mas e daí? Urubu na guerra é frango, meus amigos, e não ficou gota na garrafa. A ordem pro dia seguinte era que acordássemos mais ou menos cedo, tomássemos o café da manhã sem pressa e de lá seguíssemos calmamente até a base. Estava quase acabando, e fomos dormir com sentimento de missão cumprida…

…mas duvidando que nossos corpos (e pés) funcionariam na manhã seguinte.

Venezuela

Uma saga chamada Roraima (4/6)

18 de fevereiro de 2016

É nosso centésimo texto! Uma alegria do tamanho do Roraima 🙂

E é também a quarta parte do nosso relato sobre o Monte Roraima. Não por acaso, o dia em que pudemos conhecê-lo lá de cima, e que além da experiência em si, significou muito mais do que isso na nossa vida. Então, sem mais delongas, à história:

Acordamos na esperança de alguma melhora em nossa situação, mas assim que abrimos a barraca o tempo úmido entregava que pouco ou quase nada havia mudado: as calças continuavam molhadas, assim como nossas botas. E com botas molhadas, como conseguir passear pelo Roraima? O terreno é totalmente irregular, composto de pedras que em certos lugares podem sim machucar seu pé. Havaianas eram impensáveis (e proibidas pelo nosso guia). Tomamos nosso café da manhã com um sentimento de derrota que poucas vezes experimentamos na vida. Nossa viagem parecia ter terminado antes da melhor parte.

Foi aí, sabe-se lá como, que veio uma ideia.

Nosso almoço do dia anterior foi um lanchinho mequetrefe, entregue pela equipe do guia NUM SAQUINHO PLÁSTICO. Bem, tínhamos meias secas. As calças eram de tecido leve, e secariam rapidamente no corpo. Se calçássemos as botas com esse saquinho nos pés, e com a meia sequinha, tínhamos uma chance de sobrevida lá em cima. Rapidamente o pessoal do grupo (que compadecia completamente do nosso desânimo) ssiu caçando os saquinhos do dia anterior. Nos trocamos, testamos, e tivemos nosso primeiro momento de alegria e esperança no topo do Roraima. Situação até então impensável, um milagre aconteceu – e voltamos ao jogo 🙂

De volta ao jogo, tínhamos um longo caminho.

De volta ao jogo, tínhamos um longo caminho.

O que se seguiu dali em diante foi um longo e tranquilo passeio durante toda a manhã. Começamos fazendo o caminho inverso ao que havíamos desesperadamente feito no final da tarde anterior, quando o temporal nos pegou e fez o que fez. Em fila, seguíamos o guia entre as depressões e desníveis das pedras no caminho. De fato, diferenciar poças d’água e rocha era uma tarefa difícil até durante o dia, pois as rochas são quase pretas, enquanto as pequenas piscinas mantém aspecto semelhante, e enfiar o pé na lama é questão de sorte (ou azar, como foi o nosso caso). Pelo caminho destacava-se também toda uma flora totalmente desconhecida, com plantas coloridas cuja principal característica era a capacidade absurda de absorção de água – dado o ecossistema único do tepui.

Um verdadeiro vale de ikebanas.

Um verdadeiro vale de ikebanas.

Mais adiante, uma área um pouco mais aberta reservava um verdadeiro tapete branco, contrastando com a rocha negra da superfície. O Vale dos Cristais é de fato tão bonito quando o nome sugere, e era necessário um cuidado especial para não prejudicar as estruturas do local. O sol dava as caras pela primeira vez.

De todos os tamanhos, os cristais que dão nome ao vale...

De todos os tamanhos, os cristais que dão nome ao vale…

...servem como um inacreditável tapete branco.

…servem como um inacreditável tapete branco.

O dia começava bem, e nossa esperança havia voltado :)

O dia começava bem, e nossa esperança havia voltado 🙂

Entre subidas e descidas, fomos conhecendo alguns vales, lagoas, depressões e formações rochosas que nos deixavam de boca aberta. Os cenários que o Roraima proporciona não são comparáveis a nada que conhecíamos até então. Foram várias as situações em que nos sentíamos pisando na Lua, sem nenhum exagero. Alguns locais levavam nomes engraçados, pelas silhuetas formadas: um sombrero, o rosto do Fidel, e outras coisas cujas imagens falam por si…

O sombrero, que veio parar na minha cabeça...

O sombrero, que veio parar na minha cabeça…

...o rosto do Fidel...

…o rosto do Fidel…

...e bem... o Ricky quis provar alguma coisa pra gente.

…e bem… o Ricky quis provar alguma coisa pra gente.

Com algumas paradinhas estratégicas, nossas roupas já estavam secas. A solução para os pés tinha funcionado, apesar de um certo calor que sentíamos por causa do saquinho entre as meias e as botas – mas dada a situação geral, estávamos num lucro monumental. O tempo havia aberto, e o frio da manhã dava lugar ao sol e um céu azul. Lembrando que estávamos sem banho já há um dia e meio, compensávamos nosso cheiro com a alegria da sobrevida no tepui – e pra falar bem a verdade, não éramos os únicos a estar naquele tipo de situação: essa higiene à qual estamos tão acostumados aqui na civilização dá lugar a um certo instinto de sobrevivência em acampamentos desse tipo. Queríamos um banho, mas queríamos ainda mais era vencer o Roraima.

As formações eram - pra dizer o mínimo - inacreditáveis.

As formações eram – pra dizer o mínimo – inacreditáveis.

Uma pausa pra descanso ao lado de uma das lagoas.

Uma pausa pra descanso ao lado de uma das lagoas.

E entre subidas e descidas, seguíamos adiante.

E entre subidas e descidas, seguíamos adiante.

Seguimos vale adentro, descendo algumas encostas e caminhando entre as depressões. As dores no meu joelho haviam aumentado, mas como eu disse, tínhamos objetivos maiores e claros nesse dia. Eis que chegamos enfim à área de borda do tepui. Um tempo maior de contemplação era necessário. Estávamos caminhando acima das nuvens, num território maravilhoso, e com uma vista privilegiada do nosso vizinho, o Kukenán. Hora da ficha cair e comemorar: havíamos enfim conquistado o Roraima, e Carl Fredricksen não estava mais sozinho.

Chegamos!

Chegamos!

E sim, é tudo de verdade.

E sim, é tudo de verdade.

A primeira imagem, só com as nuvens...

A primeira imagem, só com as nuvens…

...e a segunda, com a gente entre elas :)

…e a segunda, com a gente entre elas 🙂

Perto dali, um conjunto de pedras chamado carinhosamente de “La Ventana” desafiava os mais corajosos a uma olhada pelo vão central daquela estrutura: uma janela para baixo, com rajadas de vento absurdas e violentas. Para se aproximar, por questão de segurança só estando agachado ou deitado. Nenhum dos dois se arriscou… em compensação, a Dé insistiu em olhar pra baixo, e resolveu fazer isso do jeito dela.

La Ventana, meus amigos. Um vão para o nada, basicamente. Não encaramos.

La Ventana, meus amigos. Um vão para o nada, basicamente. Não encaramos.

Mas como eu casei com uma pateta, ganhei esse momento de presente...

Mas como eu casei com uma pateta, ganhei esse momento de presente…

...momento esse que a Mercedes deixou ainda mais evidente.

…momento esse que a Mercedes deixou ainda mais evidente.

O tempo variava rapidamente. Chuva e sol revezavam, enquanto seguíamos para a última parte do passeio da manhã (já era começo de tarde), que consistia em visitar as piscinas naturais que se formavam entre as rochas. Piscinas? Banho, certo? Errado… pois nós (e outros oito do grupo) esquecemos toalhas e sabão de côco nas barracas. Quem não esqueceu foi o grupo de neozelandezes, que se divertiu enquanto a gente se lamentava pela falta de ideia – e por nosso cheirinho nada agradável. Os caras definitivamente sabiam o que estavam fazendo.

As belíssimas e convidativas piscinas naturais...

As belíssimas e convidativas piscinas naturais…

...que só os neozelandeses usaram :(

…que só os neozelandeses usaram 🙁

Depois do banho deles, voltamos ao “hotel”. Almoçamos por lá com calma e tranquilidade. O Ricky – nosso guia – alertou que um dos carregadores acompanharia quem quisesse em um passeio durante a tarde na rocha que ficava logo em frente ao hotel, enquanto ele ficaria descansando. Resolvi fazer o mesmo – pelo bem do meu joelho, e por saber que o dia seguinte seria o mais difícil dessa nossa epopeia. Eu precisava me recuperar um pouco, ou o quinto dia seria ainda mais dramático. A Dé seguiu com o grupo para a pedra, enquanto eu fiquei conversando com o Ricky e com o canadense, que também ficou por lá. Foi algo divertido e bem inesperado: tive que desdobrar meu inglês macarrônico na conversa com ambos, e aos poucos fui me sentindo mais à vontade com essa nova necessidade. Tomamos um chá – estava esfriando bastante – e assim que o grupo voltou, jantamos enquanto a luz natural ia embora.

Nosso hotel, visto da pedra que ficava logo em frente.

Nosso hotel, visto da pedra que ficava logo em frente.

A Dé também saiu na foto, numa outra versão, enquanto eu estava me recuperando lá embaixo :)

A Dé também saiu na foto, numa outra versão, enquanto eu estava me recuperando lá embaixo 🙂

Um dia que começou com ares de tragédia terminou assim...

Um dia que começou com ares de tragédia terminou assim…

...e nós, logicamente, agradecemos aos céus por isso :)

…e nós, logicamente, agradecemos aos céus por isso 🙂

Nossos pés sobreviveram. O plano deu certo, e o calor dos pés acabou secando internamente as botas. Claro que a pele dos pés sofreu com isso, e nós que já estávamos razoavelmente machucados ganhamos novas feridas. A Dé sofria com bolhas e mais bolhas, enquanto minha preocupação maior ainda era o raio do joelho, que havia sido forçado o dia todo entre subidas e descidas. Mas a sensação de vitória superava tudo isso. Havíamos caminhado, conhecido e vivido o Roraima lá de cima, e sem dúvida era o melhor dos quatro dias até então.

Fomos dormir mais do que satisfeitos, e rezando para que o dia seguinte fosse bom. Mas nada havia nos preparado para o que estava por vir.

Brasil, Fofuras

Quando viajar é o caminho para curar a alma

1 de outubro de 2015

Por Daniela Beneti


Quando falamos de viagem é muito fácil se concentrar nos grandes destinos. Afinal, viajar para outras culturas é sempre um desafio, uma experiência enriquecedora com muito para contar.

Mas nem toda viagem é sobre superação de limites. Algumas podem ser sobre superar perdas e podem acontecer bem mais perto do que você imagina.

Em 10 de maio desse ano eu perdi minha avó materna, que morava comigo. Foi minha mãe que a encontrou de manhã, ao abrir a porta do quarto para desejar um feliz Dia das mães. Mesmo sendo uma idosa acamada (ela tinha artrite, mas estava lúcida), sua morte foi uma surpresa e a coincidência da data teve um efeito devastador para ela, que cuidava de minha avó integralmente nos últimos 10 anos numa rotina exaustiva.

Na época eu, que sou redatora publicitária, estava trabalhando como freelancer pois tinha sido demitida do emprego anterior em março. Minha situação financeira era instável, mas vendo minha mãe tão abalada, resolvi que ela precisava de um tempo fora de casa para se recuperar.

Junho teria um feriado prolongado, Corpus Christi, e resolvi procurar um lugar para refrescar a cabeça. O problema é que a maioria dos lugares próximos à São Paulo cobravam verdadeiras fortunas por quatro dias. Era mais barato se hospedar num quatro estrelas no Chile, por exemplo. O problema era passagem. Praia até era viável, mas não oferecia o que eu precisava – calma, sossego e reflexão.

Águas de Lindóia: Praça Adhemar de Barros, a principal da cidade, foi projetada por Burle Marx.

Águas de Lindóia: Praça Adhemar de Barros, a principal da cidade, foi projetada por Burle Marx.

Depois de muito procurar, achei um hotel legal, com pensão completa, na pacata Águas de Lindóia, a apenas 4 horas de ônibus do ABC Paulista. Fechei e só comuniquei minha mãe 20 dias antes, tentando evitar resistência da parte dela. Mesmo assim, ela não queria ir. Se sentia culpada, chorava o tempo todo lembrando.

Conforme o dia da viagem se aproximava, ela se viu obrigada a tomar as providências necessárias. O que levar, quem vai olhar a casa e outras questões do gênero começaram a ocupar sua mente e acalmá-la. Embarcamos na quarta, 3 de junho e chegamos lá depois de 5h de viagem.

Ao chegar, descobrimos que a pacata cidade não estava mais tão calma. Havia um encontro nacional de carros antigos acontecendo, com mais de mil expositores, cidade absolutamente lotada. E nosso hotel, o Panorama, era quase ao lado do evento.

Encontro de carros antigos.

Encontro de carros antigos.

Minha mãe adora carros e ficou animada em rever carros dos anos 60, 70 e 80. Assim, dividimos nossos dias entre os carros antigos, o Balneário Municipal e suas águas terapêuticas, o comercio local, passeio de charrete e de trenzinho. O hotel tinha SPA com piscina aquecida para relaxar (pago a parte, o que achei meio bizarro), e também almoços e jantares temáticos – francês, alemão, gaúcho, etc.

A equipe de animadores se esforçava de verdade para oferecer uma programação família e agradável. Sexta e sábado tivemos show na recepção com banda local e dança puxada pelos animadores. Teve até uma mini festa junina fez o pessoal se divertir com quadrilha, casamento caipira e comidas típicas. Uma coisa singela, mas que fez minha mãe sorrir depos de 3 meses, mantendo a mente ocupada e aliviando o coração.

O Balneário Municipal é um pouco diferente do que eu esperava. Na verdade é uma viagem para a década de 50, quando se criou locais de banhos terapêuticos. Apesar de municipal, apenas as piscinas são gratuitas (mas não aquecidas) e o local é cercado por jardins (também de projeto de Burle Marx) bancos de praça, onde os idosos ficam para conversar, tricotar ou apenas olhar o movimento. Também é possível beber gratuitamente a água das 5 fontes disponíveis no local.

Projetado por Arthur Bratke, arquiteto modernista, o local conta com mosaicos de Lívio Abramo e foi erguido sobre fontes de águas radioativas, com emanação de radônio e torônio. Calma, ninguém sai contaminado por radiação – a quantidade que emana tem propriedades boas para a saúde segundo diversas pesquisas, ajudando em problemas renais, alergias, rinites, traqueobronquite e outros problemas, além claro de ação relaxante. Parece que é uma das águas com maior quantidade de oxigênio do mundo.

Mas para fazer banhos nessas águas, é preciso pagar – os tratamentos são individuais em modelo de SPA, com preços variados, incluindo massagens, banhos perfumados e tudo mais. Fizemos os banhos Mediterrâneo e Romano, que duram 20 minutos, custam R$ 38 e teoricamente ajuda, no sistema circulatório. São feitos em cabines individuais com banheiras e um quartinho para se trocar e, nesse caso, a água é aquecida. Os banhos ajudaram minha mãe nas dores que ela sente nos joelhos e fizeram com que se sentisse mais leve.

Madame Curie, vencedora do Nobel de Física e de Química, esteve em Águas de Lindóia para estudar as propriedades radioativas das águas.

Madame Curie, vencedora do Nobel de Física e de Química, esteve em Águas de Lindóia para estudar as propriedades radioativas das águas.

A cidade em sí tem poucas atrações, mas pode ser ideal para quem procura um canto tranquilo. Recomendo que quem for invista em um bom hotel para relaxar nas boas instalações. Não espere uma agitada vida noturna: Águas é uma cidade pacata, que gira em volta da praça Adhemar Barros.

Existe um passeio de trenzinho para o Cristo da cidade, mas sinceramente, não vale muito a pena, apenas se você se interessa pela vista da cidade. O Cristo em sí é uma cópia estranha do Cristo Redentor e não vale a visita. Prefira a tranquilidade de um piquenique na praça e andanças pela cidade.

Ao final da viagem, embora com o coração ainda apertado de saudade, minha mãe estava melhor. Sentia que a vida podia continuar. Porque é isso que vemos quando viajamos: a vida segue, você pode se reinventar. Certas viagens podem ajudar no processo de cura do corpo e da alma.

Passeio de charrete e clima de interior.

Passeio de charrete e clima de interior.

Isso porque lugares mais pacatos nos forçam a um encontro com nós mesmos, onde podemos refletir e descobrir nossas próprias forças e fraquezas, ver os problemas do dia a dia com um certo distanciamento. Na quietude percebemos que as lembranças mantém as coisas boas vivas dentro de nós, inclusive aqueles que amamos.

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Se você quiser participar das publicações do Faniquito com suas histórias, curiosidades e dicas de viagem (e não importa o destino), é só entrar em contato com a gente por esse link. Todo o material deve ser autoral, e será creditado em nosso site.

Venezuela

Uma saga chamada Roraima (1/6)

17 de agosto de 2015

Já fizemos dois textos sobre essa viagem (o primeiro, com um resumo geral nas palavras da Dé, e o segundo, descrevendo nossos preparativos para a subida). Chegou a hora de detalharmos como foram os dias que passamos por lá. Foram seis dias de trekking. Serão seis textos (intercalados com outros assuntos aqui no Faniquito), que servirão de guia aos que pretendem dia desses encarar essa verdadeira aventura, que é vencer um dos tepuis mais bonitos e difíceis do mundo.

Comprado o tour, nos reunimos na manhã daquela que, na nossa contagem, seria o início do nosso primeiro dia. Estávamos em 15 pessoas (nós dois, brasileiros, cinco neozelandeses, dois alemães, dois argentinos, um canadense, uma americana, um japonês e uma iraniana), e encontramos a equipe que nos levaria até lá (que contava com os carregadores – venezuelanos – e nosso guia, um jamaicano). A diversidade do grupo nos traria muito em breve a primeira lição da viagem: por mais diferentes que fôssemos (e éramos – detalhes logo mais), estávamos todos no mesmo barco. E em seis dias de total isolamento do restante do planeta, nos conheceríamos inevitavelmente. Pode parecer um tanto assustadora a descrição de um momento desses, mas é uma das melhores memórias que trouxemos de lá.

Nossa família pelos próximos seis dias.

Nossa família pelos próximos seis dias.

Carregamos os carros com as bagagens de todos, e seguimos rumo à reserva. No caminho, uma parada aos que gostariam de comprar água ou algum tipo de alimento/protetor para levar durante a trilha. Nós não compramos nada, e isso foi uma decisão parcialmente correta (pois teríamos água potável para carregar nossas garrafinhas na chegada – mas não o fizemos, e por isso o “parcialmente”). Os carros seguiram pela estrada, e algum tempo depois um desvio em uma estrada de terra sinalizava que estávamos próximos de nosso destino. “Lá na frente”, sinalizou um dos carregadores. Todos os que estavam na parte de trás do carro procuraram rapidamente, e lá estava a primeira imagem do Monte Roraima – ainda a 30 km de distância.

A primeira imagem do gigante.

A primeira imagem do gigante.

Obviamente, ficamos maravilhados e assustados, porque o bicho já parecia enorme.

Poucos minutos se passaram e chegamos à base. Naquele momento estávamos bastante ansiosos, e igualmente sem saber direito o que fazer. Ficamos próximos ao grupo, e ali recebemos nossos sanduíches (que seriam nosso almoço pelo caminho), isolantes de borracha (aquela espécie de tapetinho, que você coloca sob a barraca para proporcionar algum conforto quando deitar), e um saco plástico grande pra cada um (para em caso de chuva, “ensacar” as mochilas e evitar que tudo ficasse ensopado – guardem essa informação). Neste momento, uma pausa para explicações:

TODOS do grupo levariam suas mochilas nas costas, menos nós, que alugamos o serviço de um carregador – levaríamos somente duas mochilas pequenas, com nossos casacos, garrafas, algumas barrinhas e as máquinas fotográficas. Nos sentimos meio mal na hora (os dois gordinhos, e que não levam mochila nas costas), mas esse sentimento é estúpido, acreditem. A Mercedes (argentina), que fazia parte do grupo, ao ver ali a possibilidade de contar com esse serviço, acabou alugando na mesma hora. Fizemos isso por acharmos que não daríamos conta de levar aquele monstro nas costas. Ela fez por conforto (seu futuro desempenho na trilha comprovaria isso). Mas essa pausa é para dar a dica: SE VOCÊ ACHA QUE NÃO DÁ CONTA, ALUGUE UM CARREGADOR SIM. Não é crime, e o trajeto exige decisões acertadas. Essa foi a nossa melhor decisão, com toda a certeza.

No desembarque, nada muito claro - então, imite os outros.

No desembarque, nada muito claro – então, imite os outros.

Um dos carregadores se preparando, e a Mercedes (à esquerda na foto).

Um dos carregadores se preparando, e a Mercedes (à esquerda na foto).

Os caras são incríveis. Totalmente incríveis.

Os caras são incríveis. Totalmente incríveis.

Ainda antes da saída, um banheiro para as últimas necessidades “na civilização”. Erramos em não pegar água da torneira de lá (que é potável), e começamos a caminhada de garrafas vazias. Em maiúsculas: NÃO FAÇAM ISSO. Os carregadores montaram suas cestas gigantes, com nossas bagagens, mantimentos, ferramentas, barracas e todo o material necessário para os próximos seis dias, e dali seguimos extremamente animados. Já era começo de tarde, e tínhamos treze quilômetros até o primeiro acampamento, onde passaríamos a noite.

O registro da nossa saída :)

O registro da nossa saída 🙂

A caminhada é razoavelmente tranquila de início. Mesmo com o sol na cabeça, o caminho possuía uma parte razoável debaixo de árvores. Subidas e descidas exigiam algum esforço inicial, e o suor não tardou a aparecer. Aos poucos, notávamos qual seria nosso ritmo durante o primeiro dia, e encontramos algumas dificuldades – que aparentemente, não eram só nossas. Era um pensamento reconfortante saber que “não seria fácil pra mais gente”, além de nós dois.

A primeira parada aconteceu no meio de uma subida, e próxima a um riozinho, pra nossa alegria. Pelos próximos dias, nossa água viria exatamente assim – de riachos, pequenas cachoeiras e nascentes. Os estrangeiros (se não todos, quase todos) pegavam água desses locais e colocavam pastilhas solúveis de purificação de água nas garrafas. Alguns, para disfarçar o sabor deixados pelas pastilhas, misturavam Tang na água (sim: eca). Segunda dica desse texto: NÃO FAÇAM ISSO, PORQUE NÃO PRECISA. O lugar é totalmente livre de qualquer contaminação, e a água é pura e absolutamente gelada. Beba sem medo – e muito, porque estar hidratado para uma caminhada dessas é essencial.

Água, essa dádiva.

Água, essa dádiva.

E o calor da caminhada já dava seu recado.

E o calor da caminhada já dava seu recado.

Seguimos adiante. Fizemos algumas outras paradas juntamente do grupo, onde aos poucos conhecíamos alguns de nossos companheiros, além do Ricky – nosso guia, falastrão e todo cheio das amizades. A tarde foi passando, e mesmo com um cansaço razoável não desgarramos do grupo. Lá adiante avistamos nosso acampamento. Apertamos um pouco o passo, e assim que chegamos as barracas já estavam montadas. Escolhemos a nossa, deixamos nossas coisas na entrada e fomos correndo para o rio, que passava ao lado.

Um dos heróis da equipe, tomando um fôlego...

Um dos heróis da equipe, tomando um fôlego…

...e a gente, duplamente sem ar, com um visual desses pela frente.

…e a gente, duplamente sem ar, com um visual desses pela frente.

Lá a Dé tomou o primeiro banho de rio da vida dela. Foi uma situação bem engraçada, pois os neozelandeses não tinham problema algum em ficar de cueca, calcinha e sutiã – ao contrário dos brasileiros, argentinos e americanos do grupo. Alguns não tomaram banho (sim, cada um com seus problemas), e depois de algum malabarismo conseguimos nos trocar ali mesmo antes de voltar pra barraca. Um adendo: os PURI PURIS da região – porque cada pedaço do planeta tem seu mosquitinho picador FDP. Depois do banho de rio, banho de repelente.

As barracas montadas na nossa chegada...

As barracas montadas na nossa chegada…

...e a nossa. Botas e mochilas do lado de fora, pois essa seria nossa casa durante os próximos 5 dias (no sexto, dormiríamos em uma cama novamente, se sobrevivêssemos).

…e a nossa. Botas e mochilas do lado de fora, pois essa seria nossa casa durante os próximos 5 dias (no sexto, dormiríamos em uma cama novamente, se sobrevivêssemos).

Anoitecia, e o guia e os carregadores eram também os responsáveis pela comida e bebida da noite. Fizeram um macarrão com carne, e um suco (que seria repetido em todas as refeições pelos próximos seis dias). Comemos com gosto, afinal de contas estávamos todos felizes e famintos por vencermos o primeiro dia. Ali mesmo todos nos apresentamos e aos poucos nos familiarizávamos com os nomes de todos. Boa parte do grupo tinha aquelas lanternas que funcionam amarradas a uma faixa na cabeça, parecida com aqueles capacetes de mineiros: zilhões de vezes melhores que nossas lanterninhas de bolso, e um ítem a ser considerado com carinho em viagens semelhantes. Com a refeição encerrada e o bucho cheio, socializamos um pouco mas nos retiramos na sequência. Era hora de estrear nossa barraca e os sacos de dormir. Além do primeiro banho de rio, seria a primeira noite de acampamento da Dé. Não duramos muito e capotamos. Deviam ser 20h ou 21h, e a escuridão era total. Terminamos bem nossa primeira prova, mas ainda era o começo.

Mal sabíamos o que nos esperava. E não seria pouco.