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América do Sul

Perú

Até os ossos

19 de abril de 2016

Nosso vôo saiu do Brasil ainda de madrugada, e chegamos logo cedo a Lima. Os guias responsáveis por nossa recepção avisaram que nosso primeiro passeio na capital peruana seria uma visita à Iglesia de San Francisco. Estávamos MORRENDO DE SONO e nossos ossos ainda doíam quando a van chegou até o hotel, e o trânsito caótico em direção ao centro histórico da cidade deixava nossa missão ainda mais difícil.

Começando pelo fato de que não somos lá muito religiosos, nenhum dos dois, e portanto visitar igrejas, capelas e catedrais nem sempre faz parte dos nossos planos. Mas essa viagem era diferente, e o planejamento não era nosso, portanto seguiríamos aquilo que nos havia sido planejado (de graça, sempre é bom reforçar isso numa viagem que você ganha num concurso cultural). Além disso, havia a figura do guia – algo até então novo pra nós. Muito simpático e tagarela, o rapaz não calava a boca. Entrar no ritmo dele depois de uma noite de sono tão curta não estava sendo fácil. Eis que enfim o motorista parou o carro, e poucos metros depois estávamos em frente à catedral.

Não é todo dia que tem alguém pra tirar foto da gente viajando :)

Não é todo dia que tem alguém pra tirar foto da gente viajando 🙂

Obviamente o guia nos explicou cada detalhe, tanto do exterior como do interior. E lógico que a gente se lembra de muito pouco ou quase nada. Porém, nos impressionou o trabalho em madeira do coro da igreja, e a área que funcionava como prisão, além da beleza interna da catedral como um todo.

O tagarela e uma explicação da qual não lembro de absolutamente nada...

O tagarela e uma explicação da qual não lembro de absolutamente nada…

...e o trabalho em madeira do coro - esse sim eu lembro bem, porque é bonito pra burro.

…e o trabalho em madeira do coro – esse sim eu lembro bem, porque é bonito pra burro.

Com a Dé de dentro da prisão, uma foto bem legal!

Com a Dé de dentro da prisão, uma foto bem legal!

É de fato um prédio muito bonito. Até aquele momento o passeio era ok – nada de muito novo ou muito impressionante. Mas eis que fomos surpreendidos novamente:

– Agora vamos conhecer o ossário?

Ora, um ossário é sempre um negócio bacana…! Afinal de contas, quem não curte uma caveirinha original? Pois muito bem… descemos até uma área subterrânea da igreja. Soubemos ali que a catedral possuía diversas catacumbas e passagens secretas, e a cada informação nova dessa natureza a curiosidade só aumentava. Quando preparávamos nossas câmeras, o aviso chegou: não eram permitidas fotos nas catacumbas.

Cacete. Mas pra isso existe a internet 🙂

Afinal, naqueles corredores jazem os restos mortais de aproximadamente 25 MIL PESSOAS. Em caixotes ou agrupados em arranjos geométricos, os crânios, fêmures, tíbias e outros ossinhos estéticos adornam as galerias da igreja. É uma das maiores coleções dessa natureza em todo o mundo, e o resultado estético é, no mínimo, impressionante.

Um dos vários corredores que ligam as galerias (e ainda não se sabe se existem outros, e a quais prédios ligam).

Um dos vários corredores que ligam as galerias (e ainda não se sabe se existem outros, e a quais prédios ligam).

Uma das "exposições" de ossos. Na foto anterior, eles estão em caixas e valas pelo caminho.

Uma das “exposições” de ossos. Na foto anterior, eles estão em caixas e valas pelo caminho.

Desde o começo do século XIX, o local servia de cemitério para moradores da região, uma vez que ainda não havia um cemitério “oficial” pelas redondezas. Mesmo após sua inauguração em 1808, a igreja continuou recebendo cadáveres até 1821, quando sua utilização foi definitivamente proibida por Don José de San Martín, com o intuito de evitar a proliferação de doenças e epidemias. Obviamente todos os ossos estão fossilizados, e não há nenhum tipo de odor desagradável no local.

Passear em meio a tantas testemunhas é daquelas experiências que você não esquece nunca mais. E nos serviu como cartão de visitas da capital peruana. Um cartão pouco ortodoxo, é verdade… mas suficientemente marcante para, por breves instantes, mandar nosso sono pro espaço, e trocar o bocejo pela alegria que só uma viagem é capaz de trazer.

Venezuela

Uma saga chamada Roraima (6/6)

12 de abril de 2016

Com muita tranquilidade, acordamos para nosso último dia no Monte Roraima. Voltar a dormir na primeira base foi um misto de alívio e realização, uma vez que havíamos sim vencido o gigante, e toda dor dali em diante faria parte do preço pela aventura. Podíamos lidar com isso. Além do mais, havíamos tomado banho após longos dois dias e meio, e a sensação de ares renovados ultrapassava qualquer explicação que eu seja capaz de dar.

Pro meu azar, o café da manhã era omelete (eu não como ovo). Não lembro qual a opção que havia naquele momento, mas sei que havia uma, e tomamos nosso café da manhã sem pressa. Arrumamos nossas coisas, e a última coisa a ser feita foi calçar as botas pela última vez. Os pés estavam machucados demais, e seriam mais 13 quilômetros naquela condição. Mas botamos a mochilinha nas costas e seguimos.

Sem a pressão da descida, fizemos o caminho de volta sem atropelos. Com o corpo já aquecido, as dores aumentaram e o cansaço não tardou a aparecer. Mantivemos nosso ritmo (que era lento, mas constante) e seguimos adiante, com rápidas pausas pra água e algum descanso. O visual da manhã era lindo, e o tempo ainda ameno nos ajudava.

Não é todo dia que essa é sua paisagem matinal.

Não é todo dia que essa é sua paisagem matinal.

Com o calor aumentando, o restante do grupo se distanciou e novamente restamos apenas nós dois. Caminhávamos lentamente no trecho final, e já nos últimos metros, quando existiam subidas e descidas, tomamos todo o cuidado do mundo para não aumentarmos ainda mais os problemas físicos que vínhamos acumulando pelo caminho: as articulações estavam doídas, as costas pesavam e a respiração não era fácil – mas tudo isso devido à nossa total falta de preparo para a aventura. Quando avistamos a entrada do parque, fomos tomados de uma alegria tão grande que a única coisa que pensávamos naquele momento era “vamos chegar”. E chegamos.

Assim como ocorreu durante nossa chegada ao Roraima, o grupo todo nos aguardava e comemorou nossa vitória. Eu segui direto pro banheiro, onde tomei um banho na pia e fiz aquele xixi na alvenaria que há quase uma semana não fazia. Quando voltei, a Dé estava encostada, com a pressão caindo. Corri em direção ao Ricky, e ele ainda mais rapidamente foi socorrê-la. Puxou do bolso um vidrinho com extrato de cânfora e fez a pequena ressurgir numa fungada só que ela deu. Os jipes chegaram na sequência, e ele ordenou que ela fosse a primeira a entrar, e ficasse próxima dele durante nossa volta. O mesmo guia que havia me recomendado não subir, que tirou um sarro com a nossa cara na noite anterior e que salvou a pele da Dé em nossos últimos momentos por lá. Um cara legal, o Ricky.

Crentes que seríamos levados direto pro hotel em nossa volta, qual não foi nossa surpresa quando o jipe tomou o sentido contrário na rodovia principal e seguiu adiante. Pouco depois, o dito parou num restaurante de beira de estrada. Nosso fechamento seria UM ALMOÇO. COM CERVEJA GELADA. E COCA-COLA GELADA.

Sério povo, vocês não imaginam o que é aproveitar um momento.

Apesar de ter mais gente na foto do que no nosso grupo, é essa nossa segunda e última foto conjunta na até o momento maior aventura das nossas vidas.

Apesar de ter mais gente na foto do que no nosso grupo, é essa nossa segunda e última foto conjunta na até o momento maior aventura das nossas vidas.

Enfim, relaxamos. Devidamente comidos, agora sim seríamos deixados no albergue do Backpackers (que era vizinho ao nosso, ou seja, fomos deixados na porta do nosso destino). Mochilinhas e mochilões desembarcados, a primeira providência foi um banho de chuveiro. E que coisa linda é essa coisa de chuveiro, não? Ventilador no teto. Uma cama macia. Um teto sobre a cabeça. A gente valoriza tudo depois de não ter nada, e que diferença é nossa cabeça apenas uma semana depois. Do grupo, alguns amigos permanecem em contato com a gente até hoje, e de tanta dificuldade carregamos as melhores lembranças – principalmente, porque as dores passam. No corpo, na vida… só fica o que é bom.

E é por isso que a gente viaja.

Argentina

Martillo: a ilha dos pinguins

17 de março de 2016

Uma das atrações mais populares do “fim do mundo” é sem dúvida a ilha dos pinguins. Fim do mundo, afinal Ushuaia é a cidade mais austral do planeta, e se o mundo está acabando, nada melhor do que estar em companhia de um dos bichinhos mais simpáticos dessa vida.

Compramos nosso passeio no quiosque da Piratour logo pela manhã. Estimado em aproximadamente seis horas, o passeio inclui o traslado do centro de Ushuaia até a Estância Harberton (que fica a aproximadamente 80 km de distância), e o deslocamento de barco da Estância até a Isla Martillo (ou ilha dos pinguins), num trajeto de mais ou menos 15 minutos. Já com um pequeno grupo reunido, recebemos o voucher mais estranho e precário de nossas vidas, e alguns minutos depois nosso guia chegou. O tour estava começando.

Se por algum momento você achou precário o ingresso do barquinho no post anterior...

Se por algum momento você achou precário o ingresso do barquinho no post anterior…

Com instruções em inglês e espanhol, o rapaz se desdobrava. Longe de parecer um esforço, as informações gerais foram passadas tanto na van como no barco: a chegada à ilha seria feita de forma tranquila e ordenada; o grupo deveria seguir a trilha delimitada no chão, caminhando de forma tranquila, lenta e compacta; os pinguins se aproximariam, e toda e qualquer iniciativa de contato deveria ser deles, e nunca nossa; em hipótese alguma tentar acariciar os bichinhos, que naturalmente revidariam, e não havia nenhum hospital ou posto médico próximos à ilha; nada de alimentar os pinguins, entre outros procedimentos que todos sabemos existir quando do contato com a vida selvagem do planeta.

Durante o trajeto de van, uma rápida parada na estrada para fotografar as árvores que crescem sob o vento mais que forte da Terra do Fogo. Um lugar belíssimo, que merecia de fato uns minutinhos de registro.

Pense num lugar bonito...

Pense num lugar bonito…

...e gelado!

…e gelado!

O vale é essa coisa linda e verde.

O vale é essa coisa linda e verde.

Mas as árvores que nascem "de cara pro vento" crescem desse jeito. Não é exagero dizer que o vento patagônico é capaz de derrubar (ou nesse caso, entortar).

Mas as árvores que nascem “de cara pro vento” crescem desse jeito. Não é exagero dizer que o vento patagônico é capaz de derrubar (ou nesse caso, entortar).

Assim que chegamos à Estância Harberton, o barco já estava atracado. Uma parada rápida praquele xixi amigo (sim, outra instrução: a ilha não tem banheiro, então trate de se aliviar ou antes ou depois) e embarcamos.

Tudo bonito demais a caminho da ilha dos pinguins.

Tudo bonito demais a caminho da ilha dos pinguins.

Alguns minutos de passeio, e pouco depois chegávamos à Isla Martillo. Desembarcando um a um, o cenário que surgia era coisa inexplicável de tão… fofinha.

Sabemos que uma imagem vale mais do que mil palavras, e as nossas são deliciosas. Deixaremos a descrição do passeio a cargo delas, e vamos enumerar algumas coisas que possivelmente vocês não vão encontrar em outro texto sobre a ilha:

  • Primeira coisa: o cheiro de peixe. Se você é daquelas pessoas que passa mal com a barraca de peixe da feira, o passeio pode não funcionar pra você. A gente tem aquela imagem idealizada de fofura dos pinguins e esquece que os bichinhos são selvagens e fedidinhos;
  • Se você assistiu “Os Pássaros“, pode rolar um certo pânico também;
  • O terreno é bastante lamacento – o que é ótimo pra eles. Por isso mesmo, a escolha de roupas mais acertada consiste em uma bota confortável e bacana, calças jeans (ou de qualquer tecido grosso, veja o vídeo mais abaixo pra entender o porquê) e um casaco corta-vento. Além do cuidado com os pinguins, vale um cuidado com a própria ilha – que escorrega bastante. Cair nunca é legal. Cair em cima de um pinguim, menos ainda;
  • Apesar da quantidade abissal de pinguins, eles não se aproximam tão descaradamente como pode parecer (a lente da Dé era maior do que o normal). Então, muita calma e paciência pra fotografar e filmar os danados.  Mesmo assim, dá pra ver de perto e a experiência continua sensacional;
  • Leve bateria e cartão de memória sobressalentes. É tanto pinguim que você vai querer fotografar um por um;
  • As diferentes espécies de pinguins convivem numa boa;
  • Os pinguins peludinhos são os filhotes. Com o tempo, essa pelugem marrom vai caindo, e eles vão ficando com aquela cara que a gente conhece.
Quando chegamos, fomos recebidos...

Quando chegamos, fomos recebidos…

...de braços abertos.

…de braços abertos.

Que praia sensacional e lotada, essa.

Que praia sensacional e lotada, essa.

Uma daquelas fotos com sorriso mais que sincero, que você vai guardar pro resto da vida.

Uma daquelas fotos com sorriso mais que sincero, que você vai guardar pro resto da vida.

"E aí pinguim, rola uma selfie?"

“E aí pinguim, rola uma selfie?”

O passeio é sossegadíssimo. Pessoas de todas as idades podem fazê-lo tranquilamente, e a diversão é mais que garantida. É impossível não se encantar com a doçura dos bichinhos, e passar a identificar um ou outro (o mais saidinho, o cantor, a mãezona, o sem-vergonha, o tímido, as crianças, etc.). O mais legal: não tem nada de artificial na ilha. É habitat deles, e a gente que está no papel de visita. Nada de cercas, divisórias ou adestramentos, e é maravilhoso.

No meio do caminho, um casal de pinguins imperadores, que estava de passagem pela ilha.

No meio do caminho, um casal de pinguins imperadores, que estava de passagem pela ilha.

Claro que nem tudo é pinguim...

Claro que nem tudo é pinguim…

...mas a maioria é.

…mas a maioria é.

Um deles resolveu se amigar com esse cara.

Um deles resolveu se amigar com esse cara.

E até posou pra foto, enquanto a gente filmava.

E até posou pra foto, enquanto a gente filmava.

Pinguins enquanto crianças, e seus casaquinhos...

Pinguins enquanto crianças, e seus casaquinhos…

...que, com o tempo, vão dando lugar ao "pinguim com cara de pinguim".

…que, com o tempo, vão dando lugar ao “pinguim com cara de pinguim”.

E antes de ir embora, que tal uma cantoria?

E antes de ir embora, que tal uma cantoria?

Que passeio di-ver-ti-do!

Que passeio di-ver-ti-do!

Pouco antes de ir embora, uma última visita. O Museu Acatushún pertence à Estância Harberton, e nele temos mais uma aula rápida sobre a vida marinha da região.

Afinal de contas, um pouquinho a mais de conhecimento não faz mal a ninguém.

Afinal de contas, um pouquinho a mais de conhecimento não faz mal a ninguém.

Serve como fechamento perfeito pra uma manhã tão diferente, e a gente sai de lá se sentindo mais rico, feliz e de coração quente – apesar do vento patagônico, que é sempre gelado. Mais do que recomendado, é um passeio obrigatório pra quem chega ao fim do mundo 🙂

Bolívia

O azul mais azul do Titicaca

15 de março de 2016

O ônibus ia de Copacabana a La Paz, por um caminho que mal conhecíamos (mas que de tão bonito, será abordado num texto só pra ele). Num determinado momento, ele parou. Tínhamos que descer, e já esperávamos por algum problema mecânico ou coisa do tipo – apesar do aparente bom estado do veículo, não seria nenhuma surpresa. Não era um problema, e sim um obstáculo. Surpresa sim, mas a melhor possível: atravessaríamos o Lago Titicaca de barquinho.

Não lembro se era manhã ou tarde. Estava um belo de um sol, mas o vento que bate naquela região é gelado de verdade. Enquanto aguardávamos o barquinho chegar, um esclarecimento necessário: minha mãe nunca tinha andado de barco, e além disso não sabe nadar. Havia uma expectativa quanto à reação dela, que seria confirmada ou desmentida na sequência. Compramos os bilhetes (sim, porque a surpresa ia além, e o tal barquinho não fazia parte do custo total do passeio – só pra reafirmar a importância de, durante uma viagem, ter sempre um dinheirinho no bolso pra possíveis ocorrências). O barquinho chegou.

Se você pensa que tudo hoje em dia é digital...

Se você pensa que tudo hoje em dia é digital…

Um pequeno atracadouro, onde esperamos nosos barquinho.

Um pequeno atracadouro, onde esperamos nosos barquinho.

Pra que possamos entender o azul que dá título ao texto, essa é apenas uma ideia. Bovamente, as fotos não fazem jus.

Pra que possamos entender o azul que dá título ao texto, essa é apenas uma ideia. Bovamente, as fotos não fazem jus.

Entramos um a um, e antes de sair colocamos os coletes salva-vidas. Minha mãe ficou razoavelmente aliviada com o acessório. Puxamos as máquinas fotográficas, enquanto mais algumas pessoas entravam. Os locais aparentemente não precisavam ou não queriam os coletes, e se posicionaram de pé mesmo. Não sabíamos o quão certo aquilo tudo estava, mas sem saída, confiamos no que estava por vir. O velhinho ligou o motor e partimos para a travessia.

Todos à bordo, com ou sem colete...

Todos à bordo, com ou sem colete…

...era hora de preparar a máquina fotográfica e mandar aquele hang loose pra Jesus.

…era hora de preparar a máquina fotográfica e mandar aquele hang loose pra Jesus.

Um barquinho pequeno, mas honesto, e a velha mãe se deixou levar pelo momento. Era muito difícil se deixar amedrontar por tanta beleza. Com a cordilheira mais adiante, a travessia entre os dois vales servia de moldura pra um azul profundo daquele mundo de água gelada. O Titicaca é um dos pedaços mais bonitos da Bolívia, numa paisagem com gosto de América do Sul. Foram apenas alguns minutos, mas cuja memória ainda é cristalina.

Nosso comandante...

Nosso comandante…

...naquele tapete azul.

…naquele tapete azul.

Seguiram-se alguns minutos de total tranquilidade e beleza.

Seguiram-se alguns minutos de total tranquilidade e beleza.

Pra dentro das cores da água do Titicaca :)

Pra dentro das cores da água do Titicaca 🙂

Na chegada, fomos recebidos por uma alpaca muito da simpática. O susto passou, dando lugar à celebração de mais um momento bacana.

Um sorriso na chegada...

Um sorriso na chegada…

E três (ou quatro) sorrisos como resultado de um passeio tão bacana.

E três (ou quatro) sorrisos como resultado de um passeio tão bacana.

É assim mesmo: a gente planeja saída e destino, e fica sujeito a tudo o que acontece pelo caminho. Pode dar numa baita de uma dor de cabeça, pode dar num dia como esse, onde o azul deu o tom.

Argentina, Estive lá

Você precisa conhecer o El Ateneo?

10 de março de 2016

Um dos pontos turísticos mais famosos de Buenos Aires, a livraria El Ateneo faz jus à fama. Porém, esqueça suas filiais. Estamos falando daquele prédio lindo e famoso, localizado na Avenida Santa Fé: o El Ateneo Grand Splendid.

Inaugurado como teatro em 1919, o prédio funcionou como casa de tango, estação de rádio e cinema antes de se tornar a livraria que é hoje. Obviamente seu acervo é notável – pela quantidade e qualidade, sendo comparável a qualquer megalivraria no mundo. Nela você encontra livros, discos, dvd’s e blu-rays a preços quase sempre justos. Mas não é essa variedade que a destaca das demais – porque sim, a gente sabe que pela internet você é capaz de comprar qualquer coisa sem sair de casa. Não sair de casa vai contra tudo o que o Faniquito propõe, por isso mesmo viemos aqui indicar um destino 🙂

A visão do primeiro andar é acachapante.

A visão do primeiro andar é acachapante.

Com quase um século de existência, o prédio exala história. Aos que nunca visitaram Buenos Aires, dou meu depoimento pessoal: a ideia que eu tinha na cabeça antes de conhecer a cidade, naquilo que se presta a identificar sua História e tradições, é facilmente reconhecido tanto no exterior quanto no interior da El Ateneo. Poucos são os lugares cuja arquitetura é tão destacada e preservada (nesse caso, restaurada) quanto na livraria. Os camarotes e bancadas laterais possuem diversas poltronas, e não se permitir alguns minutos de leitura e/ou contemplação num ambiente tão especial beira ao sacrilégio. Os acessos aos andares superiores é feito de escada – o que novamente respeita a arquitetura original, enquanto o acesso ao piso inferior é feito por escadas rolantes. Mas o prédio é acessível, e existe um elevador para esse propósito. Esqueça a pressa em casa.

A visão lateral dos dois andares da casa...

A visão lateral dos dois andares da casa…

...e o detalhe dos camarotes, onde sentar um pouquinho vira quase uma necessidade.

…e o detalhe dos camarotes, onde sentar um pouquinho vira quase uma necessidade.

Falando em detalhes: os cuidados e afrescos são de babar.

Falando em detalhes: os cuidados e afrescos são de babar.

A beleza da casa inclusive facilita o consumo – uma péssima notícia pra você que tem uma ratoeira no bolso. Afinal, existe lugar mais legal pra se levar um souvenir do que uma loja linda dessas? Não quer ler em espanhol? Não tá acostumado aos maravilhoso hábito da leitura? Nem eu, que acabei trazendo pra casa um livrão do Quino, um do Langer e um almanaque do Boca Juniors. A Dé trouxe alguns ótimos livros de fotografia de artistas locais. Tem pra todo mundo, e suas desculpas correm o risco de não funcionarem. Portanto, além do espaço reservado aos alfajores, guarde outro para uns livros na sua mala.

Muito melhor que qualquer chaveiro.

Muito melhor que qualquer chaveiro.

O espaço antes reservado ao palco do teatro é hoje destinado a um café. Assim como os cafés de livrarias do Brasil, esse é caro de fazer sangrar os olhos. Experimente por conta e risco, mas gastronomicamente não é mais especial do que nenhuma outra loja próxima (e muito mais barata). Vale pela experiência de tomar um café na livraria, mas não muda a vida de ninguém.

Aqueles 5 minutinhos em que você pára pra dar uma lida, aproveita a beleza do lugar e não esquece nunca mais.

Aqueles 5 minutinhos em que você pára pra dar uma lida, aproveita a beleza do lugar e não esquece nunca mais.

Destaque para a pintura do teto, de autoria do ítalo-argentino Nazareno Orlandi...

Destaque para a pintura do teto, de autoria do ítalo-argentino Nazareno Orlandi…

Sua outra metade...

Sua outra metade…

E por fim, o conjunto completo - que é maravilhoso.

E por fim, o conjunto completo – que é maravilhoso.

Portanto, quando estiver conhecendo a capital dos hermanos, não discrimine os pontos turísticos básicos. Certamente a El Ateneo estará entre eles, e além do ar condiconado mais que bem vindo pra combater o calor portenho, é um dos melhores lugares pra fazer uma pausa nas inevitáveis caminhadas. Estar lá dentro garante um dos melhores sabores argentinos.

 

Venezuela

Uma saga chamada Roraima (4/6)

18 de fevereiro de 2016

É nosso centésimo texto! Uma alegria do tamanho do Roraima 🙂

E é também a quarta parte do nosso relato sobre o Monte Roraima. Não por acaso, o dia em que pudemos conhecê-lo lá de cima, e que além da experiência em si, significou muito mais do que isso na nossa vida. Então, sem mais delongas, à história:

Acordamos na esperança de alguma melhora em nossa situação, mas assim que abrimos a barraca o tempo úmido entregava que pouco ou quase nada havia mudado: as calças continuavam molhadas, assim como nossas botas. E com botas molhadas, como conseguir passear pelo Roraima? O terreno é totalmente irregular, composto de pedras que em certos lugares podem sim machucar seu pé. Havaianas eram impensáveis (e proibidas pelo nosso guia). Tomamos nosso café da manhã com um sentimento de derrota que poucas vezes experimentamos na vida. Nossa viagem parecia ter terminado antes da melhor parte.

Foi aí, sabe-se lá como, que veio uma ideia.

Nosso almoço do dia anterior foi um lanchinho mequetrefe, entregue pela equipe do guia NUM SAQUINHO PLÁSTICO. Bem, tínhamos meias secas. As calças eram de tecido leve, e secariam rapidamente no corpo. Se calçássemos as botas com esse saquinho nos pés, e com a meia sequinha, tínhamos uma chance de sobrevida lá em cima. Rapidamente o pessoal do grupo (que compadecia completamente do nosso desânimo) ssiu caçando os saquinhos do dia anterior. Nos trocamos, testamos, e tivemos nosso primeiro momento de alegria e esperança no topo do Roraima. Situação até então impensável, um milagre aconteceu – e voltamos ao jogo 🙂

De volta ao jogo, tínhamos um longo caminho.

De volta ao jogo, tínhamos um longo caminho.

O que se seguiu dali em diante foi um longo e tranquilo passeio durante toda a manhã. Começamos fazendo o caminho inverso ao que havíamos desesperadamente feito no final da tarde anterior, quando o temporal nos pegou e fez o que fez. Em fila, seguíamos o guia entre as depressões e desníveis das pedras no caminho. De fato, diferenciar poças d’água e rocha era uma tarefa difícil até durante o dia, pois as rochas são quase pretas, enquanto as pequenas piscinas mantém aspecto semelhante, e enfiar o pé na lama é questão de sorte (ou azar, como foi o nosso caso). Pelo caminho destacava-se também toda uma flora totalmente desconhecida, com plantas coloridas cuja principal característica era a capacidade absurda de absorção de água – dado o ecossistema único do tepui.

Um verdadeiro vale de ikebanas.

Um verdadeiro vale de ikebanas.

Mais adiante, uma área um pouco mais aberta reservava um verdadeiro tapete branco, contrastando com a rocha negra da superfície. O Vale dos Cristais é de fato tão bonito quando o nome sugere, e era necessário um cuidado especial para não prejudicar as estruturas do local. O sol dava as caras pela primeira vez.

De todos os tamanhos, os cristais que dão nome ao vale...

De todos os tamanhos, os cristais que dão nome ao vale…

...servem como um inacreditável tapete branco.

…servem como um inacreditável tapete branco.

O dia começava bem, e nossa esperança havia voltado :)

O dia começava bem, e nossa esperança havia voltado 🙂

Entre subidas e descidas, fomos conhecendo alguns vales, lagoas, depressões e formações rochosas que nos deixavam de boca aberta. Os cenários que o Roraima proporciona não são comparáveis a nada que conhecíamos até então. Foram várias as situações em que nos sentíamos pisando na Lua, sem nenhum exagero. Alguns locais levavam nomes engraçados, pelas silhuetas formadas: um sombrero, o rosto do Fidel, e outras coisas cujas imagens falam por si…

O sombrero, que veio parar na minha cabeça...

O sombrero, que veio parar na minha cabeça…

...o rosto do Fidel...

…o rosto do Fidel…

...e bem... o Ricky quis provar alguma coisa pra gente.

…e bem… o Ricky quis provar alguma coisa pra gente.

Com algumas paradinhas estratégicas, nossas roupas já estavam secas. A solução para os pés tinha funcionado, apesar de um certo calor que sentíamos por causa do saquinho entre as meias e as botas – mas dada a situação geral, estávamos num lucro monumental. O tempo havia aberto, e o frio da manhã dava lugar ao sol e um céu azul. Lembrando que estávamos sem banho já há um dia e meio, compensávamos nosso cheiro com a alegria da sobrevida no tepui – e pra falar bem a verdade, não éramos os únicos a estar naquele tipo de situação: essa higiene à qual estamos tão acostumados aqui na civilização dá lugar a um certo instinto de sobrevivência em acampamentos desse tipo. Queríamos um banho, mas queríamos ainda mais era vencer o Roraima.

As formações eram - pra dizer o mínimo - inacreditáveis.

As formações eram – pra dizer o mínimo – inacreditáveis.

Uma pausa pra descanso ao lado de uma das lagoas.

Uma pausa pra descanso ao lado de uma das lagoas.

E entre subidas e descidas, seguíamos adiante.

E entre subidas e descidas, seguíamos adiante.

Seguimos vale adentro, descendo algumas encostas e caminhando entre as depressões. As dores no meu joelho haviam aumentado, mas como eu disse, tínhamos objetivos maiores e claros nesse dia. Eis que chegamos enfim à área de borda do tepui. Um tempo maior de contemplação era necessário. Estávamos caminhando acima das nuvens, num território maravilhoso, e com uma vista privilegiada do nosso vizinho, o Kukenán. Hora da ficha cair e comemorar: havíamos enfim conquistado o Roraima, e Carl Fredricksen não estava mais sozinho.

Chegamos!

Chegamos!

E sim, é tudo de verdade.

E sim, é tudo de verdade.

A primeira imagem, só com as nuvens...

A primeira imagem, só com as nuvens…

...e a segunda, com a gente entre elas :)

…e a segunda, com a gente entre elas 🙂

Perto dali, um conjunto de pedras chamado carinhosamente de “La Ventana” desafiava os mais corajosos a uma olhada pelo vão central daquela estrutura: uma janela para baixo, com rajadas de vento absurdas e violentas. Para se aproximar, por questão de segurança só estando agachado ou deitado. Nenhum dos dois se arriscou… em compensação, a Dé insistiu em olhar pra baixo, e resolveu fazer isso do jeito dela.

La Ventana, meus amigos. Um vão para o nada, basicamente. Não encaramos.

La Ventana, meus amigos. Um vão para o nada, basicamente. Não encaramos.

Mas como eu casei com uma pateta, ganhei esse momento de presente...

Mas como eu casei com uma pateta, ganhei esse momento de presente…

...momento esse que a Mercedes deixou ainda mais evidente.

…momento esse que a Mercedes deixou ainda mais evidente.

O tempo variava rapidamente. Chuva e sol revezavam, enquanto seguíamos para a última parte do passeio da manhã (já era começo de tarde), que consistia em visitar as piscinas naturais que se formavam entre as rochas. Piscinas? Banho, certo? Errado… pois nós (e outros oito do grupo) esquecemos toalhas e sabão de côco nas barracas. Quem não esqueceu foi o grupo de neozelandezes, que se divertiu enquanto a gente se lamentava pela falta de ideia – e por nosso cheirinho nada agradável. Os caras definitivamente sabiam o que estavam fazendo.

As belíssimas e convidativas piscinas naturais...

As belíssimas e convidativas piscinas naturais…

...que só os neozelandeses usaram :(

…que só os neozelandeses usaram 🙁

Depois do banho deles, voltamos ao “hotel”. Almoçamos por lá com calma e tranquilidade. O Ricky – nosso guia – alertou que um dos carregadores acompanharia quem quisesse em um passeio durante a tarde na rocha que ficava logo em frente ao hotel, enquanto ele ficaria descansando. Resolvi fazer o mesmo – pelo bem do meu joelho, e por saber que o dia seguinte seria o mais difícil dessa nossa epopeia. Eu precisava me recuperar um pouco, ou o quinto dia seria ainda mais dramático. A Dé seguiu com o grupo para a pedra, enquanto eu fiquei conversando com o Ricky e com o canadense, que também ficou por lá. Foi algo divertido e bem inesperado: tive que desdobrar meu inglês macarrônico na conversa com ambos, e aos poucos fui me sentindo mais à vontade com essa nova necessidade. Tomamos um chá – estava esfriando bastante – e assim que o grupo voltou, jantamos enquanto a luz natural ia embora.

Nosso hotel, visto da pedra que ficava logo em frente.

Nosso hotel, visto da pedra que ficava logo em frente.

A Dé também saiu na foto, numa outra versão, enquanto eu estava me recuperando lá embaixo :)

A Dé também saiu na foto, numa outra versão, enquanto eu estava me recuperando lá embaixo 🙂

Um dia que começou com ares de tragédia terminou assim...

Um dia que começou com ares de tragédia terminou assim…

...e nós, logicamente, agradecemos aos céus por isso :)

…e nós, logicamente, agradecemos aos céus por isso 🙂

Nossos pés sobreviveram. O plano deu certo, e o calor dos pés acabou secando internamente as botas. Claro que a pele dos pés sofreu com isso, e nós que já estávamos razoavelmente machucados ganhamos novas feridas. A Dé sofria com bolhas e mais bolhas, enquanto minha preocupação maior ainda era o raio do joelho, que havia sido forçado o dia todo entre subidas e descidas. Mas a sensação de vitória superava tudo isso. Havíamos caminhado, conhecido e vivido o Roraima lá de cima, e sem dúvida era o melhor dos quatro dias até então.

Fomos dormir mais do que satisfeitos, e rezando para que o dia seguinte fosse bom. Mas nada havia nos preparado para o que estava por vir.