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Ásia

Gastronomia, Tailândia

“Spicy or no spicy?”

3 de janeiro de 2017

A culinária tailandesa é famosa pelo “excesso” (ao menos pra nós, ocidentais – daí as aspas) de pimenta em seus pratos. Pra quem não curte um sabor picante, pensar em comer por lá pode fazer com que o destino escolhido seja outro. É com esse cenário que nos planejamos, e fomos comprovar se de fato a coisa era grave desse jeito…

Já adianto: não é*.

Estivemos em três lugares: Bangkok, Koh Phi Phi e Koh Tao. Em todos você encontra uma variedade bastante grande de restaurantes, bares e lanchonetes. Na capital do país predomina a comida local, mas outras opções existem em abundância. Não é difícil encontrar um hambúrguer, uma massa ou um peixinho. A comida de rua é presença constante e maciça, mas não provamos por pura paranoia pessoal (o que é meio estúpido, mas pra uma primeira viagem pro outro lado do mundo resolvemos apostar na segurança e correr poucos riscos).

Sobre essas variedades: a comida de rua é perfumadíssima, e dá o tom local que todo viajante procura. Em banquinhos minúsculos ou sentados no chão, quem opta por ela come muito bem e paga muito pouco. Quanto às outras opções listadas acima, normalmente são encontradas na maioria dos restaurantes, dividindo o cardápio com os pratos locais. O curry é presença constante entre os pratos locais, e experimentá-lo em suas variações tornou-se um exercício muito legal, praticado por este que vos escreve. Além do sabor marcante, é uma ótima maneira de se habituar com a pimenta. Da mesma forma, os pratos com noodles – aquele macarrãozinho simpático – também estão sempre presentes, e normalmente são a opção segura para os não chegados numa pimentinha. Mas comer macarrão todo dia não dá, né amiguinhos…

Comida de rua é a imagem mais tradicional de Bangkok que ninguém fotografa. Mas mesmo fotografando, fico devendo o cheirinho pra vocês.

Não se deixei enganar: não é a cor do curry que determina se ele é “picante” ou “muito picante”. E a porçãozinha de arroz é pra dar uma contrabalanceada nessa pimenta toda.

Não está a fim de encarar comida picante? Vá de noodles sem medo!

Pimenta que está de fato presente em quase tudo. A Dé tentou por algumas vezes perguntar antes do pedido se o prato A, B ou C era apimentado. Mesmo nas negativas, o que vinha era pelo menos um pouco picante. Recomendação pessoal: TREINE antes de ir pra lá. Sim, gaste seus vidrinhos de Tabasco, principalmente aquele da Habanero. Mais importante do que se habituar com a pimenta que entra é encarar com dignidade a pimenta que sai. Adquirir um pouco de tolerância pode ser a diferença entre os dias legais e os desconfortáveis. Porém, longe de ser uma coisa insuportável. Em momento algum eu deixei de comer alguma coisa pela quantidade de pimenta. Vá com calma, prove, acostume-se e saboreie.

Nas ilhas (Koh Phi Phi e Koh Tao) as opções são muitas, uma vez que a frequência turística em ambas é monstruosa. De pizzas a hambúrgueres, dá pra encontrar de tudo. Os frutos do mar são excelentes, e pra quem gosta dá pra pedir um caranguejo caprichado (a gente tentou, mas continuamos detestando o dito cujo pelo custo-benefício ser aquela martelação sem fim pra quase nada). Curry e Fried Rice são bem-vindos, inclusive no almoço, debaixo daquele sol obsceno. A cerveja mais comum é a Chang (que vai estampar pelo menos uma das camisetas que você trará de recordação), mas a mais gostosa é a Leo. Experimente ambas. Os sucos e shakes são excelentes – shakes que por sinal não têm nada a ver com milk-shake. São sim batidas de frutas – às vezes com um pouco de leite condensado (que não passa perto do doce que conhecemos) e bons punhados de gelo. Coloridos, vistosos e gostosos, pra combater o calor dos temperos.

Se pedir pizza, lembre-se: você não está em São Paulo (nessas horas, infelizmente).

Um hambúrguer de fazer inveja a muito reduto hipster, por um preço igualmente maravilhoso. Pra interromper qualquer experiência gastronômica oriental sem nenhum peso na consciência.

Lula, pra você que não é coxinha 🙂 #foratemer

Fried rice dentro de um abacaxi, cheio de frutos do mar, verduras e legumes. Um dos principais pratos de Koh Phi Phi.

O caranguejo realmente veio lindo, mas a gente continua não sabendo comer esse troço. Pra quem gosta, uma ótima pedida.

E em Koh Phi Phi tomei o suco mais bonito que eu já vi na vida. Pitaia rosa é exatamente dessa cor, a foto não está saturada.

Ainda nas ilhas: café da manhã é coisa comum (parece informação besta, mas tem lugar na Europa que pra encontrar um é um verdadeiro parto), fácil e variadíssima. Tem de tudo: as tradicionais panquecas doces e salgadas, wraps saudáveis, combos inusitados (como o english breakfast, com direito a feijãozinho doce e linguiça), e cafés quentes, gelados, puros ou misturados. Forrar a pança antes da praia é uma ótima ideia, já que sair dela pode causar um conflito emocional daqueles.

Por que não um wrap de salmão com chips de mandioca logo cedo?

English Breakfast? Tem… mas se você está com saudade do feijão daqui, não é bem isso o que você vai encontrar. Mas é gostoso 🙂

Zona de conforto: peça um cheese frangão, e comece o dia no sossego!

Resumão desse texto: não deixe que a pimenta e as especiarias orientais impeçam você de conhecer esse país. A Tailândia é um lugar sensacional, e você vai comer coisa boa por preços módicos. E se der um bode hora dessas, sempre tem um McDonalds ou Burger King por perto pra matar saudade dessas porcarias que a gente ama.

*Que fique claro: esse é um relato pessoal. Tolerância é coisa de cada um, e obviamente existem lugares, pratos e opções que podem desmentir esse texto de cima a baixo. É questão de opção arriscar pra mais ou pra menos. Divirta-se 😉

Causos, Tailândia

Tuk-tuk nervoso

8 de dezembro de 2016

Andar de tuk-tuk é quase uma obrigação moral quando você desembarca na Tailândia. Assim como visitar o Cristo no Rio, a Torre Eiffel em Paris ou o Parlamento de Budapeste, não dá pra deixar de lado essa investida turística. Obviamente também fizemos nossa parte, mas preciso contar alguns detalhes sobre isso…

Como já contado aqui, nosso primeiro passeio por Bangkok teve um contexto diferente do comum. Nosso primeiro pensamento foi pegar um táxi para a Embaixada, mas fomos abordados por um “gerente de tuk-tuks” pouco depois de sair do hotel. Essa é a primeira informação nova, da qual não dispúnhamos: em nosso roteiro pelos três países do Sudeste Asiático, tuk-tuks e táxis SE OFERECEM pra te levar a todo momento, em qualquer lugar. Você não precisa se preocupar muito em procurá-los… eles acabam chegando até você por conta própria.

Nosso possante, e o chofer.

E dá pra confiar?

Então… é um ponto a ser analisado. Sempre procuramos nos informar sobre valores com os funcionários dos hotéis por onde passamos. Mas nesse caso específico – da história que vou contar – não fizemos isso. E no final das contas, nos pareceu um preço bem justo o que nos foi oferecido (esse é outro ponto). Precisávamos ir à Embaixada. O cara nos ofereceu um tour por 4 templos. Nossas condições foram: ok, a gente faz um tour, desde que o tuk-tuk nos leve também (e antes) onde de fato precisávamos ir. Estando de acordo, o tal “gerente” nos cobraria 600 Baht. Ameaçamos chorar o valor, e o cara já nos deu um papelzinho e uma caneta. “Escreva aí o preço que você quer pagar“, ele disse. Sim, isso é um expediente DOS MAIS COMUNS por lá. Fechamos por 400 (que dá pouco menos de R$ 40 em câmbio atual). Por uma manhã inteira e metade da tarde de transporte dedicado, achamos um preço ótimo.

Dica:

Tivemos posteriormente outra experiência, onde orçamos o trajeto de tuk-tuk de alguns pontos até nosso hotel. Valores acima de 100 Baht nos desanimaram a fazê-lo (o mesmo trajeto de táxi daria coisa de 35 a 40 Baht, e o equivalente caminhando daria coisa de 20 minutos). Então, mesmo sendo bastante barato (100 Baht não dá nem 10 Reais) não banque o tonto caso seu orçamento não seja generoso. Nessas brincadeirinhas que a grana vai embora.

Com valores combinados, um dos rapazes nos levou até a Embaixada. Mais um ponto a ser considerado: nosso motorista falava quase nada de inglês – e entenda-se por quase nada QUASE NADA MESMO. Então combine direitinho o que você quiser fazer antes com quem pode orientar essa galera.

As primeiras movimentações do luto pelo Rei já estavam nas ruas. Vimos de perto, literalmente.

E de perto também acompanhamos o trânsito caótico de Bangkok, com suas trocentas motos.

É sim um ótimo jeito de conhecer a cidade, com seus sons, cheiros e cores. Andar naquele troço é um barato, seja pelo espaço reduzido, seja pela situação de exposição quase que total. Além disso, existe uma vantagem que ficou clara quase que imediatamente: com o trânsito caótico de Bangkok, o tuk-tuk se vira muito bem em espacinhos minúsculos, e vielas que mais parecem ter saído de algum filme do Snake Plissken.

Comodidade de táxi, habilidades de moto.

O roteiro ao qual o passeio se prestou – além da providencial visita à Embaixada – foi num todo muito bom. A cada parada nos templos, nos era dado o tempo que quiséssemos para conhecer, fotografar e até mesmo descansar, pois o calor castigava. Não espere por maiores explicações sobre cada lugar… como dito anteriormente, é um motorista, e não um guia. Mas claro que existia um algo mais que não sabíamos, e que nos proporcionou aquele que seria o momento mais bizarro da viagem.

Vocês vão me perdoar, mas eu não lembro o nome dos templos… se eu lembrar edito essa legenda mais pra frente.

Wat Benchamabophit foi o primeiro complexo de templos de fato que visitamos. E por complexo, entenda que nele existiam desde desse simpático riozinho…

…passando por áreas gramadas muito bonitas…

…até chegarmos ao Marble Temple. Um gigante absolutamente espetacular.

Pra sentar e contemplar (mentira, tava um calor do inferno e eu precisava tomar água – e ar).

Alguns dos detalhes de Wat Benchamabophit. É pra visitar com calma e agradar aos olhos.

Meias sujas*: uma constante à qual nos acostumaríamos rapidinho (sujas nada, os templos são bem limpinhos).

Logo após o primeiro templo, o rapaz disse que nos levaria a uma “thai factory“. Não sabíamos do que se tratava, aquilo não havia sido comentado na hora da contratação do serviço… mas “ok, vamos para a tal fábrica então! Afinal, estamos viajando… deve ser divertido!” – pensaram os bocós. Alguns minutos depois o dito cujo estaciona em frente a uma loja, e nos pede para entrar. Com uma interrogação latente no meio da fuça, entramos. Fomos prontamente muito bem atendidos por um vendedor – outros tantos estavam sentados próximos à porta, que nos pediu pra sentar. Aí a coisa ficou bizarra de verdade.

Um dos caras trouxe dois catálogos, com ternos e vestidos, e nos entregou. Ficamos com cara de idiota, sem saber o que fazer com aquilo. Começamos a folhear automaticamente, enquanto o cara explicava que “eles faziam qualquer peça, era só pedir“. Então bateu um desespero, e eu desandei a arriscar meu inglês tentando sair daquele beco em que estávamos metidos…

– Não é o nosso estilo – eu comecei.
– Nosso material é de qualidade, você pode ver…
– Eu tô vendo, mas não é nosso estilo.
– Que tal gravatas?
– Eu trabalho em casa. De camiseta e cueca.

E a Dé num silêncio desesperador.

A gente tem uma parte do guarda-roupas reservada para “roupas de casamento”, que numa tradução simples significa: temos somente UMA ROUPA para tais ocasiões. NUNCA que a gente vai atravessar o mundo pra comprar terno e vestido, macacada! Depois de mil pedidos de desculpa, saímos da loja com cara de merda. Assim que voltamos ao tuk-tuk, expliquei da forma mais simples possível pro motorista que aquele programa foi uma fria, e que a gente detestou. Seguimos para novas visitas.

Wat Intharawihan – o Big Buddah, também conhecido como Budão.

Pois bem… assim que terminamos de visitar os templos, o cara parou NOVAMENTE num cacete de uma loja de roupas. Eu falei que não ia entrar, e então veio a revelação de que os motoristas são pagos por essas mesmas lojas (no caso dessa especificamente, pagavam a gasolina do fulano) para levar os turistas até lá. Ele pediu para que a gente pelo menos entrasse, ou ele não receberia. E lá fomos nós de novo ouvir a mesma ladainha – mas dessa vez, já preparados pra dar um cambau na primeira oportunidade. Demos, todo mundo ficou feliz, o menino recebeu o dinheiro pra gasolina e concluímos o nosso passeio com mais uma história bizarra no bolso.

Thai Factory o cacete. Malditas lojas de ternos e vestidos.

E foi assim, o nosso primeiro passeio de fato em Bangkok: tuk-tuk, templos e lojas de ternos. Tudo novo, muita coisa bonita, muita coisa zoada. Como toda boa viagem deve ser – e seria, como contaremos mais adiante.

Causos, Tailândia

Um bilhetinho escrito em Thai

1 de dezembro de 2016

Durante nossa viagem, publicamos a foto da Dé com um bilhete, com um endereço escrito em thai. Prometemos explicar o contexto daquilo depois. Bem, chegou a hora.

Mas antes de falar do tal endereço, vamos relatar o ocorrido.

Chegamos na Tailândia pelo Aeroporto Internacional Suvarnabhumi. Seguimos apressados para a imigração, depois de dois vôos consecutivos e uma conexão que nos tomaram mais de 24 horas de viagem, e viraram nosso fuso de ponta cabeça. Nossa empolgação era evidente, e se sobrepunha ao sono e cansaço causados pela viagem.

Poucos segundos depois, essa alegria toda ia virar farinha.

Poucos segundos depois, essa alegria toda ia virar farinha.

Chegando lá, uma fila enorme que muito provavelmente nos faria esperar por mais de meia hora. Uma atendente que fazia a triagem da fila pede nossos passaportes, e vendo que éramos brasileiros nos pede para que sigamos ao Controle de Saúde. A Dé fica BRANCA, instantaneamente. Eu não entendo e pergunto o que aconteceu.

– Esqueci as vacinas em casa, no outro passaporte.

Acompanhado daquele famoso palavrão que começa com F.

Acompanhado daquele famoso palavrão que começa com F.

Nossos passaportes estavam novinhos, pois os anteriores venciam naquela data. E a vacina de febre amarela é obrigatória nos três países que visitaríamos. Havíamos tirado a dita em 2011, antes de embarcar pra Bolívia, e NUNCA pediram aquele raio de papelzinho em lugar nenhum. Que hora – e que lugar – pra isso acontecer…

Eu imaginava que não nos mandariam embora por isso, enquanto ela se sentiu absurdamente culpada por ter esquecido algo tão importante. Seguimos para o Controle de Saúde, onde preenchemos um formulário e pegamos a fila para o atendimento. Uma mocinha simpática, um gordinho sorridente e um cara mal-encarado estavam atendendo as pessoas. Nem preciso dizer qual dos três nos atendeu.

A primeira coisa que o Zangado (será chamado assim até o final desse texto) perguntou foi onde estavam nossas vacinas. “Esquecemos em nossos passaportes antigos“, a Dé respondeu. Ele então fez aquela cara que seu professor fazia quando você dizia que o cachorro comeu sua lição de casa, e nos mandou pro cantinho da vergonha, que ficava logo ao lado dos guichês. “Esse cara vai dar uma puta canseira na gente“, eu disse. E por lá esperamos, enquanto uma galera era atendida. Ninguém olhava pra gente, ninguém mencionava o que aconteceria. Existia uma casinha ao lado, onde supostamente as pessoas que não tinham o documento eram vacinadas e recebiam o certificado. Parecia ser esse o nosso destino, mas tudo era dúvida naquele momento.

O Zangado sai do guichê. Encosta na gente e pede num inglês macarrônico (ao qual nos acostumaríamos durante a viagem, mas que naquela hora nos parecia uma engasgada) que cada um pagasse a ele 700 Baht.

Não era bem vacina o que a gente ia levar na bunda: o negócio era propina mesmo.

Bem-vindos à Tailândia. E sim: corrupção não é exclusividade nossa, por incrível que pareça.

De fato o problema do mundo é o PT (o Pilantra Tailandês). Tá explicado!

De fato o problema do mundo é o PT (o Pilantra Tailandês). Tá explicado!

Por uma sorte ABSURDA havíamos sacado nossos dólares em Dubai, durante a conexão. Uma decisão de última hora, mas que salvaria nossas vidas, uma vez que o ATM em que poderíamos sacar os 1400 Baht estava localizado DEPOIS da imigração.

Alegria em Dubai, quando fomos espertinhos e mal sabíamos da merda que daria dali a algumas horas.

Alegria em Dubai, quando fomos espertinhos e mal sabíamos da merda que daria dali a algumas horas.

Trocamos nosso dinheiro na casa de câmbio ao lado, e voltamos pro Controle de Saúde. Sinalizamos pro cara que estávamos com o dinheiro, e ele nos mandou de volta pro cantinho da vergonha. Esperamos mais um pouco, e o Zangado veio até a gente. Novamente num inglês lamentável, ele nos instrui a colocar o dinheiro dentro do passaporte. Entregamos um, ele retirou o dinheiro. Entregamos o outro, e sabe-se lá porquê ele nos devolveu o restante do dinheiro. Carimbou a autorização do Controle de Saúde e mandou a gente sair dali.

Problema resolvido? Não exatamente.

Passamos pela imigração e entramos enfim na Tailândia. Aquela parte do problema estava resolvida. Mas dali a dois dias iríamos para Hanói, e a tal vacina também seria pedida no Vietnam. Teríamos que dar um jeito de explicar pros caras como conseguimos entrar na Tailândia sem o documento (ou mentir, dizendo que o perdemos no aeroporto – e essa certamente seria a desculpa mais aceitável, uma vez que apontar que “o funcionário nos pediu propina e nós pagamos” talvez não fosse um argumento muito bem aceito pelos vietnamitas).

Fomos para o hotel, nos instalamos, saímos pra comer alguma coisa, voltamos e fomos dormir. Em teoria teríamos dois dias pra contornar a situação. Acordei às 4h, já sem sono algum, e comecei a pensar em como sair daquela roubada. Pouco depois a Dé acordou. Soubemos naquela hora que o rei havia morrido, mas isso não era a prioridade do momento. Veio então a ideia:

– E se minha mãe passasse em casa e escaneasse os documentos pra gente?

Sim, seria um trunfo. Poderíamos contar a mentira, mas pelo menos comprovar de alguma forma que sim – aqueles documentos existiam. Com ela morando perto de casa e com a minha cópia das chaves, podia funcionar… afinal de contas, ainda era final de tarde no Brasil. Liguei pra ela, ela topou na hora. MELHOR MÃE DO MUNDO, A MINHA. Tava de pijama e já desligou se aprontando. Emendei outra possibilidade absurda:

– E se eu pedisse pro Kadu fazer isso?

Afinal de contas, minha mãe tem seus “limites tecnológicos” com seus quase 70 anos – coisa que não seria problema pro Kadu. Arrisquei um whatsapp. Ele topou na hora e já estava a caminho poucos minutos depois. AMIGO DE BERÇO É OUTRO NÍVEL. Passou na casa da minha mãe, e seguiram pro nosso apartamento. Pouco depois recebíamos as fotos dos documentos. Nossa alegria E ALÍVIO com aquelas imagens eram imensuráveis. Nossa viagem tinha jeito, mesmo com aquele improviso todo.

Agradecidos e com a cabeça mais calma, começamos a pensar em qual seria DE FATO a solução definitiva. Ainda não eram 8 horas quando decidimos: melhor ir até a Embaixada. Afinal, lá a gente podia contar a tal mentira (e entenda-se: só estávamos apelando pra mentira porque era de fato o meio mais seguro pra agir naquelas circunstâncias), e receber uma autorização, solicitar segunda via da vacina, sei lá… Pegamos o endereço, descemos e pedimos indicações pra moça da recepção do hotel. Ela nos ajudou…

…E ESCREVEU O ENDEREÇO EM THAI, pra gente mostrar pro taxista. Olhaê a explicação:)

Agora sim parece coisa que se entende :)

Agora sim parece coisa que se entende 🙂

Afinal de contas, é tudo em thai naquela joça. Como a gente nunca sabe onde vai parar e pra quem pedir ajuda, instruções em thai são sempre muito bem-vindas. E vale o detalhe: aquele app do Google de tradução simultânea NÃO CONTEMPLA THAI. Então, sempre que alguém se oferecer pra traduzir suas coisas pra thai, ACEITE (e entregue pra Deus, porque não dá pra saber o que aquela instrução virou nesse monte de rabisquinho simpático).

Com o bilhete em mãos, fomos procurar um táxi. Acabamos optando por um tuk tuk (e sobre ele falaremos em outro texto). Seguimos até a Embaixada, onde explicamos a história. Conseguimos providenciar uma segunda via, porém ela só seria recebida terça ou quarta (era uma manhã de sexta, e iríamos para o Vietnam no domingo). Conversamos com o Cônsul, que nos recomendou despreocupação – disse que ia o tempo todo para Vietnam, Laos e Camboja, e somente na Tailândia a tal vacina era solicitada. Dias depois isso foi de fato comprovado, e não tivemos maiores problemas no restante da viagem.

Nosso primeiro transporte da viagem, com todas as suas peculiaridades.

Nosso primeiro transporte da viagem, com todas as suas peculiaridades.

Nesse dia instituí a frase “vai ficar tudo bem” nessa viagem. Foi usada várias vezes, e ficou tudo bem mesmo. A foto era de um papelzinho. A história dá mais de página.

Tailândia

O rei está morto. Vida longa ao rei.

22 de novembro de 2016

Viajar por mais de 24 horas, chegar ao seu destino, e descobrir que o rei morreu. Rei esse que não era apenas um rei, mas uma semi-divindade aos olhos da população; que reinou por sete décadas; que você nunca ouviu falar, mas que num contexto geral deixa claro que sua visita não será exatamente aquilo que você imaginava. Assim começa nossa viagem/saga pelo Sudeste Asiático.

Num fuso horário de 11 horas, recebi de uma amiga pouco antes de dormir a notícia de que Bhumibol Adulyadej tinha batido as botas no exato momento em que deixávamos o aeroporto. Não é das coisas que o taxista ou a recepcionista do hotel te contam, e depois de atravessar o mundo a última coisa que você quer é ligar a televisão. Saímos para comer alguma coisa, ainda perdidos, e ao voltarmos ao hotel fomos direto pra cama. Foi nessa hora que o whatsapp chegou.

Acabamos acordando muito cedo na manhã seguinte, e nessa hora contei pra Dé sobre a morte do dito. Nossa primeira manhã em Bangkok seria bastante atípica (mas essa história contamos mais pra frente), sendo que nossa agenda só seria cumprida lá pela metade da tarde*. Voltamos para Ratchadamnoen Klang Rd, uma das principais avenidas do distrito de Phra Nakhon, muito próxima ao nosso hotel. Com as opções de voltar ao dito ou dar mais uma passeada pelos arredores, escolhemos a segunda. E dali em diante nossa ficha caiu.

A intenção era chegar ao Grand Palace, pois ainda era meio de tarde e a visitação estaria aberta – um raciocínio completamente torto, dado o acontecimento da noite anterior. O rei seria velado justamente no Grand Palace, e não fazíamos ideia do que havia se passado na cidade durante aquela manhã. Mas agora que estamos em casa, dei uma busca rápida no YouTube pra encontrar o que a gente perdeu (e o que explicaria o cenário que encontraríamos logo mais):

Caminhando em direção ao nosso destino, uma horda de MILHARES de pessoas vinha chegando na direção oposta. E quando digo milhares, acho que uma imagem vale mais do que qualquer ênfase que esse texto possa tentar transmitir.

Não era o show do Ozzy, mas parecia.

Não era o show do Ozzy, mas parecia.

E quando eu digo que não dava pra passar, não dava mesmo.

E quando eu digo que não dava pra passar, não dava mesmo.

Prosseguimos um pouco mais, imaginando que aquilo talvez fosse “uma onda” de gente, mas a cada avanço a multidão se tornava mais e mais compacta. O acesso aos templos posteriores seria impossível. Em determinado momento paramos, e vencidos começamos a retornar, acompanhando a multidão. Era um cortejo espontâneo, de proporções inéditas pra gente: enlutadas estavam pessoas de todas as idades; gente tirando selfies e fotos ao lado de imagens do rei; alguns abatidos, outros nem tanto; grupos conversavam, outros seguiam em silêncio. Aquilo jamais poderia ter sido organizado por TV, facebook ou qualquer outra coisa. Aquilo ali era um movimento popular de verdade.

Um dos vários registros de fotos ao lado de imagens do rei.

Um dos vários registros de fotos ao lado de imagens do rei.

Aquela cara de "satisfação constrangida" por ter vindo com a roupa certa, mas pra festa errada.

Aquela cara de “satisfação constrangida” por ter vindo com a roupa certa, mas pra festa errada.

Então, é hora de fazer um adendo:

Antes que você, amiguinho recém-politizado e chato de doer, venha comentar que “se fosse aqui no Brasil blablablá…”, eu vou me adiantar e te dizer uma coisa que você vai me prometer não mais esquecer toda vez que eu citar essa viagem: Oriente e Ocidente são coisas totalmente diferentes. E não, não quero dizer que esse é melhor ou pior que aquele, mas sim que culturalmente é colocar lado a lado um pinguim e um camelo. Partindo-se dessa afirmação tão conhecida (e tão verdadeira), já deixo aqui registrado que toda comparação dentro desse prisma é – pra dizer o mínimo e sendo muito educado – burra.

Estamos entendidos? Então vou continuar daqui.

Seguimos em direção ao hotel, agora com todo o caminho já enlutado e repleto de gente. Dos dias que se seguiram, tive a atenção chamada por um tailandês após sair de um dos trocentos templos budistas da cidade justamente por estar com uma camiseta verde (e não preta). E de nada adiantou minha cara de bosta por não querer vestir preto num calor de mais ou menos 35 graus – a questão não era calor ou frio, mas respeito. Pode parecer abusivo, mas reafirmo: em poucos dias dessa viagem, ficou muito claro pra mim que ocidentais nunca vão entender o Oriente, por mais esforço que se faça. E aceitar essa diferença deixa tudo muito mais fácil.

Pra não deixar uma impressão ruim sobre esse primeiro momento, conseguimos nos aproximar do Grand Palace no dia seguinte. Perto dali já haviam montado tendas de apoio aos visitantes e locais, com água, comida e atendimento médico a quem quisesse e/ou precisasse. Detalhe: NADA era cobrado. E mesmo que você tivesse acabado de chegar, não estivesse de preto e notoriamente não fosse tailandês o tratamento era igualmente cordial e atencioso. Uma coisa comovente de verdade.

A aglomeração no Monumento à Democracia, já no final da tarde...

A aglomeração no Monumento à Democracia, já no final da tarde…

...e uma das diversas tendas de apoio no dia seguinte.

…e uma das diversas tendas de apoio no dia seguinte.

A morte do rei comprometeu nossos planos para Bangkok, isso é inegável. Mas trouxemos outros exemplos, lições e momentos muito difíceis de serem explicados. Assim como é difícil recomeçar a escrever aqui no Faniquito.

Mas a gente se adapta, e a viagem segue em frente. O luto duraria um mês (nossa viagem também), e traria novas histórias mais pra frente.


*Durante nossos afazeres matinais, fizemos uma pausa pra comprar um sorvete numa biboca de uma senhora que não falava inglês, mas que se fazia entender na base da calculadora. Após pagarmos o sorvete, essa mesma senhora fez uma reverência à Dé, tocando na blusa dela (que não entendeu imediatamente o que havia acontecido). Poucos segundos depois, ficou claro: a Dé estava de preto, e a senhora agradeceu pelo luto. Foi bonito.

Coreia do Norte

Coreia do Norte: o Projac asiático

7 de janeiro de 2016

Rolou uma substituição de pauta de última hora por aqui. Preferi abordar outro tema, que me parece bastante pertinente, dados os últimos acontecimentos dessa quarta-feira. Existe um país que eu morro de vontade de conhecer, pelos motivos mais óbvios e bizarros que uma pessoa pode ter (e eles nunca são plenamente explicáveis). Estou falando da Coreia do Norte.

Deixando de lado o fato dos caras terem supostamente testado uma bomba H (com a naturalidade de quem resolve sair pra comer um pastel), lembro de ter começado a prestar atenção no país quando do sorteio da Copa da África do Sul, e o chaveamento no grupo do Brasil. Aí aconteceu o tal jogo, o Brasil ganhou por 2×1, e os jornais daqui noticiaram que por lá informaram uma suposta vitória norte-coreana. Eu achei bizarro, e a partir dali passei a me interessar por toda e qualquer notícia que envolvesse a Coreia do Norte. Pouco tempo depois, aquilo que era somente curiosidade virou uma obsessão, quando vimos a repercussão local da morte de Kim Jong-il. Eram cenas inacreditáveis – e continuam sendo:

Pra alguém que leu 1984, saí devorando tudo o que dizia respeito à Coreia do Norte: me emprestaram livro, revirei o YouTube, diversos blogs e textos, e assisti a todos os especiais que pudessem acrescentar algum tipo de conhecimento sobre aquele país totalmente alheio à globalização. A tal filosofia juche (de culto à personalidade, base da política implantada no país desde 1948 e que fez de Kim Jong-il e de seu pai, Kim Il-sung, verdadeiros deuses aos olhos dos norte-coreanos), o modelo comunista e socialista, a economia, a relação com o mundo exterior (e a não-relação com EUA, Coreia do Sul e Japão)… quanto mais a gente mexe, mais difícil de entender o quebra-cabeça que constitui a imagem de um país tão único – sem juízo de bem ou mal, apenas entendendo que ele se encaixa no contexto mundial como verdadeira exceção em praticamente todos os aspectos.

Se isso não é capaz de despertar o faniquito, o que seria?

Em todas as fontes pesquisadas, os relatos de quem se aventurou a conhecer o país são muito semelhantes. Das curiosidades incríveis aos recém-chegados, segue abaixo uma breve lista:

  • a companhia constante e obrigatória de pelo menos dois funcionários do governo (um guia e um motorista), pois a locomoção pela capital Pyongyang é devidamente programada, aprovada, e jamais feita de forma independente;
  • de uma ampla série de coisas e lugares possíveis de se conhecer, absolutamente todos fazem menção explícita e exaltada “à soberania nacional, e aos méritos de seus dois líderes e salvadores históricos” anteriormente citados. Nada de pegar um cineminha, ou mesmo dar uma volta pelas ruas;
  • o contato dos turistas com os cidadãos, se não nulo, é mínimo e controlado – nada de novas amizades;
  • quando em visita ao país, seus documentos são literalmente sequestrados, e somente devolvidos no dia de saída;
  • a moeda local para turistas é diferente da utilizada pelos locais (!);
  • das vinte estações de metrô, o turista só é autorizado a passear entre duas (Puhung e Kaeson);

  • além das estruturas, esculturas e memoriais militares e políticos, as grandes atrações turísticas do país são uma fábrica de garrafas, uma tecelagem, entre outros programas injustificáveis;
  • é possivelmente o único país no mundo em que o acesso à internet é proibido (pense no seu cotidiano, e transfira sua realidade pessoal para um contexto desses – seja bem-vindo a 1984: pesquisas na Barsa, Voz do Brasil – mas em coreano, e que no caso, dura um dia, todos os dias, e nada de Menudos ou programa do Chacrinha);
  • todos os cidadãos utilizam um broche com o rosto do comandante da nação;
  • teatro, cinema, música, artes e espetáculos em geral não destacam artistas: toda obra artística e intelectual pertence ao Estado, e consequentemente tem como tema seus comandantes, o partido dos trabalhadores e a filosofia Juche. Em outras palavras: toda manifestação cultural é propaganda política;
  • e se você acha tudo isso absurdo, saiba que foram criadas artificialmente no país duas flores, chamadas Kimilsungia e Kimjongilia (em homenagem óbvia a Kim Il-sung e Kim Jong-il).
Kim Il-sung e Kim Jong-il - o centro do universo na Coreia do Norte.

Kim Il-sung e Kim Jong-il – o centro do universo na Coreia do Norte.

É fascinante, absurdo, medonho, bizarro, misterioso e provocador.

Por isso mesmo eu quero conhecer. Minha imaginação concretiza a imagem de um verdadeiro Projac tamanho gigante. Será que é possível ser genuinamente feliz num lugar onde absolutamente tudo é controlado pelo governo, onde a liberdade de expressão é nula, e você é invadido diariamente e sem intervalos por propaganda política? Qual será o efeito prático que a ignorância pela censura causa no desenvolvimento racional e emocional dos norte-coreanos? É possível sonhar com o que acontece no restante do mundo? Desenvolver algum tipo de curiosidade? Contestar uma realidade que é totalmente moldada num discurso que não evoluiu ou agrega?

Eu duvido, de tudo isso. Mas eu sou ocidental, e calçando meus sapatos é fácil achar tudo isso descabido. Será que eu conseguiria por um mínimo instante calçar os sapatos de um norte-coreano, e conceber o que seria uma semana de vida de um cidadão comum em Pyongyang? Não, certamente não. Nem mesmo o turismo ao país permite algo próximo disso.

Turismo que é sim permitido, mas de maneira bastante peculiar. Seu acesso acontece somente pela China, e o preço é bastante proibitivo (li que gira em torno de R$ 6500,00, fora passagens e vistos), além de todas as observações listadas acima, e mais uma infinidade de detalhes que a gente vai descobrindo pelo caminho. Ou seja: por mais algum tempo a Coreia do Norte estará somente em minha imaginação e em minhas pesquisas.

Mas se valer o desafio, tente se colocar no seguinte cenário: roupas comportadas (semelhantes às que o mundo vestia nos anos 60), o tradicional e obrigatório broche do comandante do país no peito, pouca comida na mesa, muito trabalho, e uma obrigação constante de culto aos heróis nacionais; um em cada 3 de seus amigos é militar; o grande evento do país é um festival cuja atração principal é um enorme e inacreditável mosaico humano – o Arirang – que conta a história da “excepcional vitória norte-coreana sobre os vizinhos japoneses” (obviamente, sob o comando do Grande Líder)…

…seu inconformismo, sua revolta, seu desprazer – se existirem – não podem ser externados, sob pena de prisão, tortura e morte por traição; possivelmente seu casamento será arranjado, e seu mundo restrito às fronteiras desse país.

É a Coreia do Norte: esse enigma que um dia pretendo – se não desvendar – pelo menos tocar.


Mais algumas dicas:

  • A busca por imagens do país no Google não chega a ser ruim, mas se quiser acompanhar um canal muito bacana com imagens de lá, siga o DPRK360 no Facebook. As fotos são ótimas e aparentemente trazem um pouco daquilo que os turistas não têm possibilidade de conhecer no país (mas isso é só uma hipótese, como tudo o que é noticiado de lá…).
  • Sobre o Arirang e o culto ao grande líder, assista A State of Mind (2004), documentário britânico da BBC que está disponível na íntegra no Youtube (com legendas em inglês);
  • Uma das melhores séries de reportagens sobre a Coreia do Norte realizadas no Brasil foi feita pelo SBT, em 2005, no Jornal SBT Brasil – e também está disponível no Youtube.
  • Um depoimento no TED que fez bastante barulho há algum tempo diz respeito a uma norte-coreana que relata como foi crescer na Coreia do Norte, e hoje enxergar o país de fora. Também está disponível e legendado no Youtube.
  • Outro depoimento no TED diz respeito a uma sul-coreana que passou seis meses disfarçada no país, lecionando em inglês. A entrevista está disponível (sem legendas) nesse link.
Camboja, Tailândia, Vietnã

As viagens nas viagens

5 de fevereiro de 2015

Por Yara Mansur


Há viagens que a gente acha que sempre quis fazer.

Há viagens que arrebatam a gente e quando a gente vê, já foi, está lá.

Há viagens que a gente só vai entender realmente algum tempo depois e quando está contando para alguém o que aconteceu e o pior (ou melhor), a cada vez que conta, a gente tem um “insight” novo, percebe outra coisa.

A minha última viagem, foi como uma daquelas bonecas russas, daquelas que quando você abre, encontra outra dentro, menor, mas mais delicada, com mais detalhes, com outras cores. Pois é, para mim, o sudeste asiático foi uma viagem dentro de outra viagem dentro de outra viagem.

Claro que era uma viagem desejada desde sempre, desde que me considero um ser viajante era um dos destinos top 5 de qualquer lista que eu tenha preparado nesta vida.

Pois bem, junte este desejo, com o fato de que uma amiga querida decidiu “Viver a vida sob as ondas” , foi passar uma temporada na Tailândia para se tornar instrutora de mergulho e pronto, oportunidade de ouro, boa companhia, agendas acertadas e lá fomos nós.

Vencido aquele momento difícil do planejamento da viagem: abrir mão dos lugares que você não poderá conhecer desta vez e terá que deixar para a próxima. Seguir de cidade para cidade, num ritmo de gincana, apenas para dizer que você esteve lá pode até ser considerado opção para algumas pessoas. Para mim, definitivamente não. Eu preciso me demorar no lugar. Andar e me perder além dos “tem que ver” que blogs e revistas de viagem insistem em divulgar. É bom provar novos sabores, entrar no museu ou na galeria sem pressa, conseguir ingresso para um show, para uma ópera ou uma peça, mas principalmente, ter a chance de voltar, se quiser, naquele lugar, café ou praça que te encantou. Não sei você, mas eu preciso disto.

Bom, o roteiro ficou com Vietnã, Camboja e Tailândia. Laos, Mianmar e Índia, na próxima. Três países muito diferentes entre si, surpreendentes, cada um a seu modo.

No Vietnã, os destinos foram Hanói , Halong Bay e Ho Chi Minh, que até 1975 atendia por Saigon.

Primeira parada então, após longas horas de vôo, foi em Hanói. De lá, mais duas horinhas numa van e pronto, no porto. Escolher a operadora do cruzeiro que vai te levar águas tranquilas da baia de Halong é tarefa fácil. A oferta é grande, tem para todos os gostos e bolsos. O roteiro e passeios que você fará são basicamente os mesmos. Além de encartar-se com as milhares e milhares de ilhotas que formam a baia, tem uma descida do barco para visitar uma caverna, onde você será apresentado para as lendas mágicas que povoam o imaginário do povo vietnamita. Eu acabei escolhendo a Emeraude (http://www.emeraude-cruises.com) e recomendo. Boas acomodações, que ficaram melhores ainda por que eu ganhei um “free upgrade” para cabine luxo, uma grata surpresa. Excelente comida, tripulação atenciosa, enfim, tudo certo por um preço justo. Junte-se a isto um grupo de viajantes bem diversificado, trocando opiniões sobre suas câmeras fotográficas, a eterna discussão Nikon x Canon e concluindo que se pudemos nos fundir numa pessoa só, teríamos visitado quase que o planeta todo, faltando basicamente a Antártida.

Só faltou mesmo foi sol para tingir esta paisagem cinza. Alguns dias depois, um amigo sortudo esteve lá e como podem ver pela diferença das fotos, com sol é bem melhor. Bom, isto é praticamente uma regra para a vida, mas os dias cinzentos também tem sua beleza peculiar.

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Das histórias de dragões e deuses diretamente para um ritmo acelerado na capital, Ho Chi Minh. Uma incrível concentração de “scooters” por m² imaginável e duas regras básicas para sobreviver. Uma regra para o motorista: se você for bater, desvie. A outra regra é para o pedestre: faça contato visual com o motorista e atravesse a rua, caminhe num ritmo constante e siga diretamente para o ponto desejado. Só não vale entrar na frente do ônibus ou caminhão, os demais vão desviar. Semáforo? Não, não tem. Apenas continue andando. Ninguém vai lhe machucar ou buzinar para você. Primeira lição, confiança. Confiei.

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Em Saigon, muita memória da guerra, da luta para a unificação do norte e sul, com o povo mostrando muito orgulho desta página da história. Aproveitamos para ver o teatro de marionetes na água. É executado com música e instrumentos típicos, ao vivo. Um espetáculo composto de várias histórias curtas, divertidas, comédia de erros. Um exemplo do senso de humor vietnamita.

De Saigon para Phnom Penh, paisagem rural, cruzando a fronteira para o Camboja.

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Fizemos este trecho de ônibus, tranquilo, confortável e numa velocidade máxima de 60 Km/h, não que a estrada não fosse boa, esta era mesmo a velocidade permitida para o trajeto.

Na capital Phnom Phenh, o lugar em que a gentileza impera. Observe os locais, sorrindo e cumprimentando quem cruza o seu caminho. Faça isto e você terá um dia harmônico. Eu fiz. Deu certo.

Nossa sequência de visitas aos tempos começava, de fato, aqui. Deste dia em diante, templos todos os dias. Os “wat”. Dos suntuosos, ligados ao Palácio Real até aquele que fica na esquina, em madeira. Templos para todos os gostos e monges vestindo a cor laranja.

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De lá para Angkor, em Siem Reap, o maior complexo religioso do planeta, um conjunto de templos de diferentes épocas que tem por finalidade deixar você de queixo caído tal é a beleza do lugar. Segunda lição, a grandiosidade da gentileza e da generosidade. Exercitei a gentileza e o respeito.

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Angkor era uma das coisas mais esperadas desta viagem. Há passes para visitar o complexo por 1 dia ou por 3 dias, há uma opção de ver o nascer do sol por lá e várias combinações possíveis de roteiros e formas de percorrer o lugar, de carro ou bicicleta.

Os tempos mais visitados são:

Angkor Wat, inicialmente hindu e depois transformado num templo budista, durante todo o tempo de construção, mais , o país mudou de religião e o tempo também.

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Bayon, com os rostos gigantes é uma das coisas mais impressionantes.

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Ta Phrom, onde você de quebra pode se sentir a própria Lara Croft. Em ruinas, o que resta do tempo se integrara às raízes das árvores e à vegetação. Um espetáculo.

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Altamente recomendada é uma vista ao Museu Angkor, antes da visita aos templos. Vai lhe ajudar a entender muita coisa e a se comportar adequadamente também.

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O instinto de sobrevivência disse para escolher o carro, mas eu sempre imaginei fazer esta visita de bicicleta, então, de bicicleta lá fomos nós, com a equipe nota mil da Grasshopper http://grasshopperadventures.com/. Bem, fui de bicicleta, mas voltei de tuk-tuk. Prepare-se, e bem, se quiser fazer este roteiro como no imaginário desta viajante, pois o sol e o calor castigam. Exaustão. Mas D´us salve o tuk-tuk e tudo deu certo.

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Altamente recomendada também é fazer uma massagem ao final do percurso. Aliás, altamente recomendado é não perder nenhuma, reforço, nenhuma oportunidade de fazer uma massagem nesta região do planeta. É vida. Bom, então, depois de mais uma massagem, voamos para Bangkok, a capital que tenta ser cosmopolita, mas que me encantou mesmo pelo que guarda do passado. Hospedagem no bairro chinês de Bangkok, em meio à confusão de luminosos da rua e do cheiro das especiarias e temperos da comida. Shanghai Maison, http://www.shanghaimansion.com, para aquele momento da viagem em que você também quer vivenciar o hotel, um pequeno luxo numa viagem espartana.

Roteiro de templos só se intensificaria nos próximos dias. Em Bangkok, visitamos o Marble Temple, Wat Arun, Grand Palace e dentro deste o Wat Pho e o Buda reclinado.

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Antes de seguir para Chiang Mai, lugar que deveríamos estar no dia 7 de novembro para o mais do que esperado Festival das Lanternas, visita à Ayutthaya, que foi a capital do Sião, pouco mais de uma hora de trem de Bangkok para desembarcar no passado. Um lugar sensacional, onde os elementos dos templos de Bangkok estão presentes e lhe são apresentados na versão simples, rural. O Buda reclinado, em Ayutthaya, ainda mais bonito do que o de Bangkok.

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De lá, para as montanhas, no norte, em Chiang Mai, o Festival das Lanternas, o momento das oferendas e da confraternização. De hábitos, referências e espiritualidade tão diferentes, nós, os diferentes fomos simplesmente acolhidos como iguais. Templos e cerimônias reservadas para os monges, nesta época, se abrem para quem quiser participar. Aprender a acolher, simplesmente desconsiderando as diferenças. Por que no fundo, no fundo, qual a diferença mesmo? Acolhimento sem questionamento. Isto, simplesmente, não tem preço.

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E por fim, Koh Phi Phi, uma ilha no sul da Tailândia, destino final da viagem e lar, doce lar, para a amiga instrutora de mergulho. Por que esta menina foi tão longe? Basta mergulhar e entenderá. Das inúmeras escolas e agências de mergulho da ilha, escolhi o The Adventure Club – Phi Phi, http://diving-in-thailand.net/, obviamente a escola da amiga instrutora de mergulho. Depois de um vídeo de introdução, um teste escrito, conhecimentos básicos aprendidos, lá vamos nós para o barco, para 2 mergulhos do tipo DSD, aquele em que você vai grudado com o “divemaster”.

No primeiro mergulho, seus conhecimentos teóricos são colocados à prova. Passou, mergulhou. Passei, mergulhei.

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Para realmente entender as coisas é necessário aprofundar-se, na superfície, todo argumento é raso. Mergulhei. Alguns lugares fazem mais sentido sob as ondas, e nisto, esta querida amiga, que sempre quer ter razão, estava coberta dela, mais uma vez.

Roteiro encerrado. A viagem dentro da viagem, não.


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