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França

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Mudança de planos

9 de abril de 2015

Por Daniela Beneti


Oi gente, tudo bom? Assim como o  Masili e a Dé, donos do Faniquito, vim dividir algumas histórias de viagens com vocês. E já que o Masili contou como foi levar a mãe dele pra conhecer o mundo, quero contar como foi a experiência do meu pai.

Em 2008 eu fiz meu primeiro mochilão rumo a Europa. Minha primeira viagem internacional. Juntando um pouco todo mês durante 1 ano e meio, consegui realizar o sonho (ainda conto dos perrengues).

Esse fato deu um estalo na cabeça do senhor meu pai, seu Ricardo. Pra ele, Europa era coisa de milionário. Então como a filha de 26 anos, dura, tinha ido parar lá?

Alguns meses depois da minha volta, meu pai me abordou: você gostaria de conhecer o Egito? Achei que era uma pergunta retórica e respondi que sim. Pois no final de 2010 ele já tinha o dinheiro para nós dois, que vinha juntando desde aquela época.

Por quê Egito? Meu pai sempre foi apaixonado por história e por filmes. Conhecer as grandes civilizações era um sonho e ele sempre quis ver de perto as pirâmides. Esse era o cara que, ao invés de contos de fada, me contava a história de Cleópatra e Helena de Tróia quando eu era pequena.

"Você gostaria de conhecer o Egito, filha?"

“Você gostaria de conhecer o Egito, filha?”

Em janeiro de 2011, fomos felizes e contentes comprar nosso lindo “pacote Egito” em uma operadora, com tudo que tínhamos direito – hotel, passeios, cruzeiro pelo Nilo. Meu pai me deixou em casa com um sorriso de orelha a orelha.

Mas se vocês estão lembrados, em janeiro de 2011 aconteceu uma coisinha básica chamada “Primavera Árabe”, uma onda de protestos contra as ditaduras estabelecidas que sacudiu o Oriente Médio. No dia em que compramos o passeio, ela chegou ao Egito.

"Pai, deu ruim."

“Pai, deu ruim.”

Liguei no dia seguinte para a agência de viagens, que me garantiu que “era coisa passageira, que sempre acontecia por lá”. Visto que, um mês depois a coisa só tinha piorado, a moça nos deu a opção de trocar o pacote por outro de nossa escolha, com valor semelhante.

Meu pai ficou simplesmente arrasado. Passei semanas perguntando “pra onde você quer ir?” , só pra escutar um teimoso e seco “pro Egito”. Não havia o que fazer. Depois de mais um mês, ele solta um irritado “Então quero fazer o mesmo passeio que você. Vamos pra Europa”.

Peguei aquele valor e , junto com a consultora, bolei um novo pacote. Paris, Veneza, Florença, Roma e Athenas – muita história pra compensar o Egito perdido. Mas o italianão estava irredutível. Embarcou para Paris com um bico de criança contrariada. Não era o passeio que ele imaginava. Fui com medo que ele detestasse tudo.

Bobagem. O primeiro contato dele com um vôo internacional não podia ser melhor, com a Air France*. O tratamento solícito compensou o cansativo vôo e ele já foi ficando mais animado. Ao chegar, passar por aeroporto e tudo mais, peguei um ônibus da própria companhia até o centro de Paris, onde pegaríamos o metrô. A parada era bem no Arco do Triunfo.

Agora sim, você está em Paris.

Agora sim, você está em Paris.

Ele ficou uns 5 minutos olhando praquele monumento, embasbacado. Foi aí que eu pai entendeu que qualquer viagem pode ampliar suas fronteiras, mesmo que ela não seja aquele primeiro plano que você fez.

O CHOQUE CULTURAL

Bem, contei pra vocês como a viagem para o Egito do meu pai virou Europa. Agora, vou contar um pouco do choque cultural e de valores que ele teve lá.

Meu pai como contei, meu pai nunca tinha saído do Brasil e todas as suas referências eram São Paulo e afins. Quando disse a ele que pegaríamos metrô para tudo, ele olhou para mim como se subitamente eu tivesse ficado laranja-tangerina “Por que a gente faria isso? Vamos de táxi”.

Tive a única reação possível: eu ri como nunca. E tive que explicar que, a não ser que ele tivesse virado milionário e eu não soubesse, táxi só pra casos muito necessários ou lugares muito difíceis. Em uma cidade com uma malha de metrô tão extensa como Paris não faz sentido nenhum ficar pra cima e pra baixo de táxi. Perde-se o melhor da cidade.

Claro que ele não ia se convencer com um simples argumento. Como bom paulista, seu Ricardo sempre foi de carro pra todo lado e não entende (até hoje) por quê eu não dirijo. Então foi muito a contragosto que enfiei meu pai metrô adentro.

Apresentando Seu Ricardo ao metrô.

Apresentando Seu Ricardo ao metrô.

Primeira surpresa dele: chegamos rápido e fácil até o hotel. Que ficava a apenas duas quadras do metrô Trocadero. Chegamos, fizemos nosso check-in, deixamos as coisas e, depois de apresentá-lo ao conceito de mochila do dia, fomos andar.

Pra quem já conhece Paris, sabe que ele tomou a segunda surpresa assim que atravessou a avenida em frente ao metrô: do Trocadero, uma antiga instituição militar, hoje um espaço de exposições, você tem uma das mais belas vistas da Torre Eiffeil.

Surpresa!

Surpresa!

Pra ter uma ideia do encanto do meu pai, ele até hoje trata a torre como uma “pessoa” – ela é linda, ela é maravilhosa, sinto falta de olhar pra ela. Acho que esse é um dos momentos que fazem de Paris uma cidade mágica, esse encontro com paisagens dignas de cinema, ali, perfeitas, bem à sua frente.

Foi assim que ele aprendeu como caminhar por uma cidade é uma descoberta. Meu pai há muito tempo não caminhava São Paulo, assustado, como muitos, pela violência. Mas não caminhar por uma cidade é perder seu encanto e sua conexão real com ela.

No primeiro dia, andamos pelas margens do Sena e ao redor da Torre. Foi um dia incrível para os dois. Para mim, por dividir aquele lugar com o meu pai. Pra ele, por descobrir que uma cidade pode ser sim mais humana, feita pras pessoas andarem por ela, vendo coisas bonitas e apenas aproveitando o fim de tarde em um café.

Turistando...

Turistando…

...e turistando mais um pouco.

…e turistando mais um pouco.

Claro que também fomos turistar nos dias seguintes. Visitamos o Palácio de Versalhes e seus jardins bem na época das àguas dançantes, fomos à Champs Elysées, Place de La Concorde, Louvre (onde o difícil foi tirar seu Ricardo da ala egípicia) e ao Les Invalidès, antigo hospital de guerra, hoje um museu dos conflitos desde a época pré-histórica. Esse determinaria o ano seguinte, na hora que meu pai viu o acervo da Segunda Guerra.

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Não façam isso, não mesmo!

Controlar seu Ricardo em museus provou-se minha mais árdua tarefa. Parecia uma criança na Disney – louco por experimentar tudo, agora, já. Foram 6 horas e meia de Louvre, vencido apenas pelo cansaço. Querendo tocar em tudo (e sim, pro meu desespero ele botou a mãozona em  peças de 4 mil anos de idade). No Invalidés, ele tirou foto abraçado com tanque de guerra, bomba de submarino. Além de Egito Antigo, meu pai sabe tudo de Segunda Guerra. Já viu todos os filmes, lê qualquer livro que encontra sobre. Ficou doido. Sabia o nome de todas as batalhas, os generais nas fotos, as siglas das armas. E eu olhando, pensando que pra quem veio emburrado, ele tinha se conformado muito bem.

Acho que até que seu certo no final, né pai?

Acho que até que seu certo no final, né pai?

Mal sabia eu que isso daria origem a uma nova viagem, mas isso é conversa para outro dia.


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