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Paris

Perrengues

Perrengues de viagem: quem nunca?

2 de julho de 2015

Por Daniela Beneti


Oi gente, voltei! Hoje vou falar um pouco de perrengues de viagem. Porque a gente sempre fala de roteiros maravilhosos, paisagens incríveis e fotos sensacionais. Mas e os imprevistos? Numa viagem de verdade não sai tudo perfeito, isso é coisa de turista, não de viajante.

Eu, particularmente, acho que os perrengues são o tempero da história, a prova que você viveu o lugar. Como no meu primeiro mochilão, com a minha amiga Camila. Quando decidimos fazer essa viagem, procuramos uma agência que oferecia um “pacote mochilão”: eles fechavam a hospedagem econômica, as passagens de trem e/ ou avião e você se virava por lá. Um ótimo negócio, certo?.

É, só que não #sqn. A pessoa que fez nossas reservas devia estar com aquela vontade Primeiro, porque tínhamos um traslado programado para o dia da nossa chegada na Europa e descobrimos o quê ? Que o traslado havia comparecido no dia anterior, quando nem havíamos saído do Brasil. A sorte foi chegarmos por Lisboa, o que deixou bem mais fácil descobrir como chegar no hostel de transporte público mesmo. Uma lição pra vida de “do it yourself”. Acredite, você consegue se virar e não vai se perder só por circular com transporte público de outro país.

Pegue seu pastelzinho e relaxe. Os perrengues apenas começaram.

Pegue seu pastelzinho e relaxe. Os perrengues apenas começaram.

Mas calma, que está apenas começando. Depois de 3 dias em Lisboa, íamos para Salamanca, na Espanha. Ao chegar na segunda cidade, depois de 6 horas de trem, descobrimos que a nossa reserva do hotel estava errada, era só pro dia seguinte. Isso à meia-noite de um sábado. Não tem problema, arrumaremos outro lugar pra dormir, certo?

A recepcionista riu na nossa cara. Salamanca é uma cidade universitária, o que significa que ela BOMBA de festas e baladas no final de semana. Não tinha um único quarto disponível na cidade. Acredite, nós procuramos.

Tirando foto na praça central de Salamanca pra esquecer que a gente não tinha onde dormir.

Tirando foto na praça central de Salamanca pra esquecer que a gente não tinha onde dormir.

Claro que pensamos: já que não tem jeito, vamos pra balada. Mas estávamos a cara da derrota depois de uma viagem longa, sem lugar pra se trocar. Voltamos pro hotel e ficamos na recepção, o que resultou em 5 vídeos hilários de madrugada, a Camila quase voando no pescoço da recepcionista de manhã e muita música de elevador na recepção.

Depois disso, passamos por mais duas cidades na Espanha, nos dirigimos para a França, onde visitamos Paris e Nice, na Corte d’Azur. Na França, para nossa surpresa, foi quase tudo perfeito. As pessoas, ao contrário do que nos disseram, eram super simpáticas e solícitas. A comida não era absurdamente cara e os lugares maravilhosos. Até que decidimos conhecer a Torre Eiffel. Vou resumir pra vocês: a melhor coisa da Torre é ficar fora dela.

Não me levem a mal: a vista é maravilhosa, a experiência é única. Mas julho é um calor desgraçado e, por ser o auge do verão e das férias por lá, incrivelmente cheio. Foram 5 horas de fila pra chegar no topo, espremidas por gente de todo lado. E nem pense em bancar o esperto e comprar pra ir de escada e tentar pegar o elevador no segundo andar. Eu vi muita gente quase morrendo de cansaço, já que o primeiro andar equivale a uns 4 ou cinco lances de escadas e o elevador é vigiado o tempo todo por um segurança. Deixe isso de lado, fique na grama em volta da Torre e faça um piquenique. Tem show por lá, carruagens com turistas, tudo de graça e sem stress.

Dica: nós amamos Paris e a Torre Eiffel, mas a melhor coisa é vê-la de fora. Ficamos 5 horas na fila pra subir. Compre sua baguete e faça um piquenique embaixo dela que é bem mais legal.

Dica: nós amamos Paris e a Torre Eiffel, mas a melhor coisa é vê-la de fora. Ficamos 5 horas na fila pra subir. Compre sua baguete e faça um piquenique embaixo dela que é bem mais legal.

Depois de Paris, conhecemos Nice e seus arredores (Eze, Mônaco, MonteCarlo) estávamos loucas para ir para a praia já que, em Barcelona, pegamos uma frente fria e a água gelada. Bem, nos orientaram para pegar o trem e ir para VilleFranche-sur-Mer, a praia favorita dos moradores. Sabe porque eles preferem essa do que a de Nice? As pedras. As praias de lá não tem areia e a praia de Nice é linda, mas puro pedregulho. Em VilleFranche elas eram pequenas, mas difíceis de caminhar no sol.

Não que isso tenha estragado o passeio, foi apenas um perrengue menor e engraçado. Porque a nossa capacidade de improvisação seria testada mesmo saindo de lá para a próxima cidade, Veneza.

Devíamos ter desconfiado quando a moça nos avisou, ainda no Brasil, que não havia trem direto. Segundo ela, teríamos que descer em Gênova e comprar a passagem para continuar. Fizemos exatamente como ela disse: saímos de Nice com o trem e descemos em Gênova para comprar os bilhetes para Veneza.

Tudo lindo, tudo maravilhoso na Côte d’Azur. Até que descobrimos que a praia era de “pedrinhas”. Nada de areia, pedra quente.

Tudo lindo, tudo maravilhoso na Côte d’Azur. Até que descobrimos que a praia era de “pedrinhas”. Nada de areia, pedra quente.

Como já passara metade da viagem, nossos mochilões tinham crescido consideravelmente, ainda mais quando minha amiga descobriu que, mesmo em Euros, o xBox era mais barato lá. Ela resolveu comprar o maior kit que encontrou na FNAC e, claro, precisou de uma mala só pro infeliz. Logo, tínhamos 2 mochilões de 90 litros e uma mala com um xBox.

Isso significa que, ao descer, uma de nós tinha que ficar imóvel com a mala e a outra procurar as passagens, porque andar na estação com aquilo era inviável. Quem ficou? Exato, eu. Não deu 5 minutos para minha amiga voltar furiosa: “Sabe porque ela não conseguiu comprar o bilhete? PORQUE ESSE TREM NÃO EXISTE!”. É amigos, o trem em que estávamos IA DIRETO de Nice para Veneza e nós descemos do último trem do dia.

Fumegando de ódio, Camila saiu pela estação à procura de uma forma para chegarmos até Veneza e me deixou novamente com as malas. Foi aí que, de repente, escuto uma gritaria e todo mundo saiu correndo do hall da estação. Menos eu, que não conseguia me mexer com todas aquelas malas.

Agora, imaginem a cena: você, paralisado no meio de uma estação e eis que passa um homem, correndo e xingando em italiano, PERSEGUIDO por dois pit bulls enormes e um outro homem, gritando palavrões em italiano e “Cannes Periculoso”. Logo vem a polícia correndo no sentido contrário. Confusão, briga. Os caras são presos e os cachorros vão junto.

Depois de uns 20 minutos, minha amiga volta sorrindo triunfante, ao lado de um funcionário da estação e pergunta: “ué, por quê você está tão pálida?”. Minha resposta foi apenas “não importa o que você resolveu,eu topo qualquer coisa desde que eu NÃO DURMA AQUI”.

Bem, ela havia descoberto um jeito de chegar em Veneza, se entendendo de alguma forma com o funcionário que só falava italiano. Sim, havia uma forma. Mas seria preciso trocar de trem 4 vezes durante a noite, para chegar à Veneza às 6 da manhã. O que significava não dormir. De novo.

Viajamos com trens noturnos por cidadezinhas minúsculas. Não havia nenhum aviso sobre qual estação era aquela: tínhamos que correr pra porta para tentar descobrir onde estávamos e trocar de trem. Claro, os trens estavam vazios a não ser por uns poucos indivíduos suspeitos. E quando eu digo suspeitos, quero dizer ter que inventar nomes pra fugir de conversas estranhas e dar desculpas mil para não irritar ninguém e não ser seguidas. Isso e ficar às 3h30 numa estação com a placa enferrujada, sem viva alma, rezando para o trem passar. Até promessa eu fiz, acredite (imprimi mil santinhos quando voltei).

Mas o trem passou. E quando achamos que íamos dormir no último, numa cabine só nossa, três mulheres entram e começam animadamente a tagarelar com a gente. Eram professoras do Cazaquistão (juro por tudo que é mais sagrado), que estavam fugindo de um congresso sei-lá-onde no interior da Itália para passar o dia em Veneza. A grande aventura da vida delas, mas eu mal conseguia manter os olhos abertos. Quando elas descobriram que éramos brasileiras, festa: “we love Isaura”. Sim, a Escrava Isaura, a novela original, passou no Cazaquistão e era sucesso. Vai entender.

Foto bonita né? É que você não sabe o que passamos pra chegar aqui. E é claro, nos perdemos dentro de Veneza também, mas quem não se perde lá?

Foto bonita né? É que você não sabe o que passamos pra chegar aqui. E é claro, nos perdemos dentro de Veneza também, mas quem não se perde lá?

Chegamos exaustas em Veneza. Entramos no hotel às 7 da manhã, mas vocês sabem, check-in é só depois do meio-dia, com sorte. A maneira com que o recepcionista nos olhou entregava que estávamos péssimas. Ele então indicou uma sala em reforma, onde poderíamos deixar as malas.

Esse santo homem ficou com dó e foi nos chamar às 10h, pois conseguira adiantar um quarto. Nos encontrou dormindo no chão, abraçadas com a bagagem.

Esse nem foi nosso pior perrengue. Um dia conto da história de um feriado em Camboriú e como um cubo de frango quase virou um soco no meu baço. Mas essa fica pra outra hora.

Me arrependo? Claro que não. Aprendi muito e hoje me viro muito melhor em qualquer viagem. Perrengues são aprendizado valioso para se virar e também para forçar você a interagir com o mundo, com as pessoas do local e com qualidades suas que você desconhecia. E você, tem algum perrengue de viagem para contar? Compartilhe com o Faniquito!


Se você quiser participar das publicações do Faniquito com suas histórias, curiosidades e dicas de viagem (e não importa o destino), é só entrar em contato com a gente por esse link. Todo o material deve ser autoral, e será creditado em nosso site.

França

Mudança de planos

9 de abril de 2015

Por Daniela Beneti


Oi gente, tudo bom? Assim como o  Masili e a Dé, donos do Faniquito, vim dividir algumas histórias de viagens com vocês. E já que o Masili contou como foi levar a mãe dele pra conhecer o mundo, quero contar como foi a experiência do meu pai.

Em 2008 eu fiz meu primeiro mochilão rumo a Europa. Minha primeira viagem internacional. Juntando um pouco todo mês durante 1 ano e meio, consegui realizar o sonho (ainda conto dos perrengues).

Esse fato deu um estalo na cabeça do senhor meu pai, seu Ricardo. Pra ele, Europa era coisa de milionário. Então como a filha de 26 anos, dura, tinha ido parar lá?

Alguns meses depois da minha volta, meu pai me abordou: você gostaria de conhecer o Egito? Achei que era uma pergunta retórica e respondi que sim. Pois no final de 2010 ele já tinha o dinheiro para nós dois, que vinha juntando desde aquela época.

Por quê Egito? Meu pai sempre foi apaixonado por história e por filmes. Conhecer as grandes civilizações era um sonho e ele sempre quis ver de perto as pirâmides. Esse era o cara que, ao invés de contos de fada, me contava a história de Cleópatra e Helena de Tróia quando eu era pequena.

"Você gostaria de conhecer o Egito, filha?"

“Você gostaria de conhecer o Egito, filha?”

Em janeiro de 2011, fomos felizes e contentes comprar nosso lindo “pacote Egito” em uma operadora, com tudo que tínhamos direito – hotel, passeios, cruzeiro pelo Nilo. Meu pai me deixou em casa com um sorriso de orelha a orelha.

Mas se vocês estão lembrados, em janeiro de 2011 aconteceu uma coisinha básica chamada “Primavera Árabe”, uma onda de protestos contra as ditaduras estabelecidas que sacudiu o Oriente Médio. No dia em que compramos o passeio, ela chegou ao Egito.

"Pai, deu ruim."

“Pai, deu ruim.”

Liguei no dia seguinte para a agência de viagens, que me garantiu que “era coisa passageira, que sempre acontecia por lá”. Visto que, um mês depois a coisa só tinha piorado, a moça nos deu a opção de trocar o pacote por outro de nossa escolha, com valor semelhante.

Meu pai ficou simplesmente arrasado. Passei semanas perguntando “pra onde você quer ir?” , só pra escutar um teimoso e seco “pro Egito”. Não havia o que fazer. Depois de mais um mês, ele solta um irritado “Então quero fazer o mesmo passeio que você. Vamos pra Europa”.

Peguei aquele valor e , junto com a consultora, bolei um novo pacote. Paris, Veneza, Florença, Roma e Athenas – muita história pra compensar o Egito perdido. Mas o italianão estava irredutível. Embarcou para Paris com um bico de criança contrariada. Não era o passeio que ele imaginava. Fui com medo que ele detestasse tudo.

Bobagem. O primeiro contato dele com um vôo internacional não podia ser melhor, com a Air France*. O tratamento solícito compensou o cansativo vôo e ele já foi ficando mais animado. Ao chegar, passar por aeroporto e tudo mais, peguei um ônibus da própria companhia até o centro de Paris, onde pegaríamos o metrô. A parada era bem no Arco do Triunfo.

Agora sim, você está em Paris.

Agora sim, você está em Paris.

Ele ficou uns 5 minutos olhando praquele monumento, embasbacado. Foi aí que eu pai entendeu que qualquer viagem pode ampliar suas fronteiras, mesmo que ela não seja aquele primeiro plano que você fez.

O CHOQUE CULTURAL

Bem, contei pra vocês como a viagem para o Egito do meu pai virou Europa. Agora, vou contar um pouco do choque cultural e de valores que ele teve lá.

Meu pai como contei, meu pai nunca tinha saído do Brasil e todas as suas referências eram São Paulo e afins. Quando disse a ele que pegaríamos metrô para tudo, ele olhou para mim como se subitamente eu tivesse ficado laranja-tangerina “Por que a gente faria isso? Vamos de táxi”.

Tive a única reação possível: eu ri como nunca. E tive que explicar que, a não ser que ele tivesse virado milionário e eu não soubesse, táxi só pra casos muito necessários ou lugares muito difíceis. Em uma cidade com uma malha de metrô tão extensa como Paris não faz sentido nenhum ficar pra cima e pra baixo de táxi. Perde-se o melhor da cidade.

Claro que ele não ia se convencer com um simples argumento. Como bom paulista, seu Ricardo sempre foi de carro pra todo lado e não entende (até hoje) por quê eu não dirijo. Então foi muito a contragosto que enfiei meu pai metrô adentro.

Apresentando Seu Ricardo ao metrô.

Apresentando Seu Ricardo ao metrô.

Primeira surpresa dele: chegamos rápido e fácil até o hotel. Que ficava a apenas duas quadras do metrô Trocadero. Chegamos, fizemos nosso check-in, deixamos as coisas e, depois de apresentá-lo ao conceito de mochila do dia, fomos andar.

Pra quem já conhece Paris, sabe que ele tomou a segunda surpresa assim que atravessou a avenida em frente ao metrô: do Trocadero, uma antiga instituição militar, hoje um espaço de exposições, você tem uma das mais belas vistas da Torre Eiffeil.

Surpresa!

Surpresa!

Pra ter uma ideia do encanto do meu pai, ele até hoje trata a torre como uma “pessoa” – ela é linda, ela é maravilhosa, sinto falta de olhar pra ela. Acho que esse é um dos momentos que fazem de Paris uma cidade mágica, esse encontro com paisagens dignas de cinema, ali, perfeitas, bem à sua frente.

Foi assim que ele aprendeu como caminhar por uma cidade é uma descoberta. Meu pai há muito tempo não caminhava São Paulo, assustado, como muitos, pela violência. Mas não caminhar por uma cidade é perder seu encanto e sua conexão real com ela.

No primeiro dia, andamos pelas margens do Sena e ao redor da Torre. Foi um dia incrível para os dois. Para mim, por dividir aquele lugar com o meu pai. Pra ele, por descobrir que uma cidade pode ser sim mais humana, feita pras pessoas andarem por ela, vendo coisas bonitas e apenas aproveitando o fim de tarde em um café.

Turistando...

Turistando…

...e turistando mais um pouco.

…e turistando mais um pouco.

Claro que também fomos turistar nos dias seguintes. Visitamos o Palácio de Versalhes e seus jardins bem na época das àguas dançantes, fomos à Champs Elysées, Place de La Concorde, Louvre (onde o difícil foi tirar seu Ricardo da ala egípicia) e ao Les Invalidès, antigo hospital de guerra, hoje um museu dos conflitos desde a época pré-histórica. Esse determinaria o ano seguinte, na hora que meu pai viu o acervo da Segunda Guerra.

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Não façam isso, não mesmo!

Controlar seu Ricardo em museus provou-se minha mais árdua tarefa. Parecia uma criança na Disney – louco por experimentar tudo, agora, já. Foram 6 horas e meia de Louvre, vencido apenas pelo cansaço. Querendo tocar em tudo (e sim, pro meu desespero ele botou a mãozona em  peças de 4 mil anos de idade). No Invalidés, ele tirou foto abraçado com tanque de guerra, bomba de submarino. Além de Egito Antigo, meu pai sabe tudo de Segunda Guerra. Já viu todos os filmes, lê qualquer livro que encontra sobre. Ficou doido. Sabia o nome de todas as batalhas, os generais nas fotos, as siglas das armas. E eu olhando, pensando que pra quem veio emburrado, ele tinha se conformado muito bem.

Acho que até que seu certo no final, né pai?

Acho que até que seu certo no final, né pai?

Mal sabia eu que isso daria origem a uma nova viagem, mas isso é conversa para outro dia.


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*Nossos textos não são patrocinados. A gente indica aquilo que a gente gosta/aprova, porque isso também ajuda na viagem alheia. Simples assim.