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Machu Picchu

Gastronomia

Quem tem boca…

20 de outubro de 2015

O princípio fundamental de qualquer viagem é experimentar. É fato: estando fora de casa, queremos fazer, experimentar ou viver algo diferente. Mesmo as viagens mais cômodas e sossegadas pedem por esse ar de “coisa nova”, seja ela uma bebida, um prato, um banheiro, uma cama, ou mesmo um horário diferente do que nos acostumamos a acordar todos os dias. Pra fazer o de sempre, melhor ficar em casa… certo?

Eu e a Dé nunca cozinhamos nos albergues em que nos hospedamos. Nada pessoal, muito menos preconceito, mas das nossas necessidades (de casal, e mesmo pessoais) experimentar a comida local é tão importante quanto conhecer um novo lugar – e disso a gente não abre mão. Respeitamos e admiramos aquela galera que passa toda uma viagem na base do pão Pullmann e miojo, mas nas contas que fazemos antes de viajar, poder comer sem se preocupar é uma de nossas diversões. E pra que possamos fazer isso da forma mais bacana, preferimos experimentar o que estiver na frente. Nem sempre a gente se deu bem fazendo isso, mas temos boas histórias pra contar:

Ovos romenos

Estávamos no Caru’ cu bere – um dos restaurantes mais antigos e tradicionais de Bucareste (e que será tema de texto mais pra frente). Chegamos cedo, querendo tomar um café da manhã antes de sair pra conhecer a cidade. Sendo um verdadeiro ponto turístico, todos os funcionários falam inglês. Pedimos o cardápio, e ele veio – todo bilíngue, exceto nos pratos do café da manhã. Podíamos perguntar para a garçonete, mas preferimos valer o risco e pedir pela beleza estética das palavras em romeno. A Dé ganhou dois ovos. Eu, um omelete com chá. Eu não como ovo, então a Dé acabou comendo omelete com ovos, e eu fiquei só no chá (minha hora do almoço foi, por consequência, selvagem).

Ovolândia, e o melhor chá da vida.

Ovolândia, e o melhor chá da vida.

Poderia ter sido uma baita decepção, mas a pequena gostou do prato duplo dela, e eu tomei o melhor chá da minha vida – sem hipocrisia, tava tão bom que eu tive que procurar sabor semelhante no Brasil (e o que mais se aproximou foi o vermelhinho da Twinings).

Sim: um chá britânico com gostinho de Romênia :)

Sim: um chá britânico com gostinho de Romênia 🙂

Trocando em miúdos

Em nossa primeira viagem à Argentina, abrimos mão de experimentar a parrillada por pura falta de dinheiro/estômago. E se você não sabe o que é parrillada, a gente explica:

“A parrillada permite provar diferentes partes da vaca. Esta refeição geralmente começa com uma salsicha e chouriço, antes da chegada da carne principal. Ela também pode ser acompanhada de rins, pâncreas, fígado e tripas de gado. Frango e porco esporadicamente também estão inclusos.”

Quando voltamos pra lá, virou dívida pessoal. Acabamos nos metendo numa Parrilla (um restaurante especializado em parrillada) na cidade de Ushuaia. Um baita frio, uma baita fome, respiramos fundo e pedimos a criança. O restaurante estava lotado, e havíamos tido uma breve aula sobre o que viria naquele prato com meu sogro.

Nada te prepara pra uma intimidade tão grande com a vaca.

Nada te prepara pra uma intimidade tão grande com a vaca.

Com a parrillada na mesa, o caminho era sem volta: experimentamos um a um aqueles cortes bizarros de carne, com consistências e cores estranhas. Não dá pra dizer que detestamos, muito menos que amamos – apenas riscamos uma pendência da nossa lista pessoal, e sobrevivemos sem grandes dores àquele jantar esquisito.

Aaaaaaah…alpaca!

Havíamos terminado nosso primeiro dia de passeio em Machu Picchu. Descemos até a cidade, e entramos no primeiro restaurante que vimos na frente (e que nos pareceu entrável – não dá pra deixar o estômago falar na frente do cérebro sob hipótese alguma). Das opções do cardápio, nos chamou a atenção a carne de alpaca – e acabamos pedindo os quatro pratos iguais. Um prato que chegou lindo como esse da foto, e gostoso de um jeito muito difícil de se imaginar. Fomos embora de bucho cheio, e morrendo de saudade dessa carninha. Quando eu e a Dé voltamos pro Perú – em Lima – pedimos alpaca novamente, e ficamos sabendo que só servem a coitada em Cusco e arredores. Ou seja, foi realmente um prato típico e muito difícil de se encontrar em outro lugar. Ah… você não sabe o que é alpaca?

Alpaca: sua gostosa.

Alpaca: sua gostosa.

É esse bichinho simpático da foto lá do topo, que abre nosso texto de hoje. Pois é: por mais fofo que seja, na hora da fome a gente quer mesmo é dentar uma coisa suculenta. Dessa coisinha bonitinha comemos esse medalhão, espetinho e até pizza. Alpaca: experimente.

O desafio da arepa

O café da manhã na Venezuela era um verdadeiro desafio: Santa Elena de Uairén sofria com o desabastecimento (assim como ocorre com todo o país), e queríamos porque queríamos experimentar a tal arepa, que é um prato bem comum e típico do país. Fomos a um restaurante chamado La Arepera, crentes que conseguiríamos degustar o tal quitute. Porém, o garçom era mais atrapalhado que qualquer outra coisa, e depois de pedirmos duas arepas e dois sucos de laranja, recebemos dois tostex e duas Coca-Colas. Essa foi a reação da Dé ao ocorrido:

Arepa e suco? Não... tostex e Coca-Cola.

Arepa e suco? Não… tostex e Coca-Cola.

La Embajada: quem vê cara...

La Embajada: quem vê cara…

...não vê coração. Nem arepa :)

…não vê coração. Nem arepa 🙂

Foi num cantinho chamado La Embajada que encontramos nossa arepa… e que troço bom a tal massinha de polenta frita com recheios variados (no caso, nem tão variados, mas muito gostosos). Nossos cafés da manhã na cidade consistiam de arepas e sucos enquanto estivessem disponíveis (e mesmo comendo como se fosse um almoço, o valor nunca ultrapassava dez Reais PARA AMBOS). Ganhou um lugar especial no nosso coração.

Traumas ou delícias: tudo vira história. Então deixe seu medo em casa, e vá experimentar os sabores do mundo sem medo 🙂

Faniquito, Fofuras

A Dé e o Paul

18 de junho de 2015

De certa forma, é muito fácil escrever o texto de hoje.

É dia 18 de junho, aniversário do Paul McCartney. E como nosso site se propõe a falar de qualquer assunto relativo a viagens, é a primeira vez que o tópico “música” aparece por aqui. Paul McCartney que é de longe um dos sujeitos que mais amamos aqui em casa, e por quem abrimos nossos corações sem nenhuma censura. Um sujeito bacana, levinho e extremamente talentoso, cujo rosto estampa o pôster que está na parede da sala, juntamente de seus outros três amigos. Bobo eu seria se não desse à sua música ou dos Beatles os devidos créditos por viagens constantes, as quais felizmente posso fazer muito bem acompanhado.

Paul aniversaria hoje, e cantou nossa última música enquanto namorados, na manhã do nosso casamento. Por um minuto e quarenta e cinco segundos, “I Will” fez as vezes de calmante para um cara naturalmente nervoso, que precisou travar os dentes para que o coração não saísse pela boca. Naquele mesmo ano de 2010, teríamos a oportunidade de encontrar o ilustríssimo músico inglês – oportunidade que seria única, não tivéssemos cometido a loucura de comprar ingressos (caros, muito caros, ainda mais pra quem havia acabado de comprar um apartamento) para seus dois shows, em dias seguidos. Poucas vezes fomos tão felizes, com duas vezes três horas de uma espécie de hipnose coletiva cantada a plenos pulmões. Viajamos para longe, muito longe… sim, havíamos visto um beatle – de pertinho no primeiro dia, debaixo de chuva e um pouco mais longe no segundo. Cruzamos uma fronteira da vida que para ambos era tão importante quando conquistar novos horizontes, e daquelas duas noites jamais esquecemos.

Uma selfie antes do melhor show das nossas vidas.

Uma selfie antes do melhor show das nossas vidas.

Paul foi o responsável por tortamente adquirirmos um videogame, um controle em forma de bateria, outros de duas guitarras e um microfone, para que por vezes espalhássemos finais de semana caseiros em música que nos remete às nossas vidas. A casa vira taverna. A gente permanece viajando.

Paul é um membro da família, sem a menor dúvida. E pra ele eu deixo meu mais sincero desejo de felicidade plena e eterna – a qual ele certamente terá, dado que sua obra é imortal. E agradeço, por aproximar ainda mais minha pequena de mim. Não haveria escolha mais óbvia e linda para começarmos nossa vida juntos. Uma vida que já tem mais de 7 anos de história. Mas que hoje, seu aniversário, embala novamente o aniversário de outra pessoa, que me permitiu conhecer algo além do quintal de casa (quando minha casa nem quintal mais tinha), e me apresentou o mundo – para o qual passei a escrever há alguns meses por aqui.

Porque hoje Paul, é aniversário da Dé. Que num passado não tão distante me contou num desses churrascos da vida que tinha um sonho pra vida: conhecer Machu Picchu. Naquela época eu sequer imaginava que um dia seríamos os dois uma coisa só lá na frente, e aquele sonho contado de maneira tão distante me parecia coisa mais que difícil de ser feita – eu, devendo os tubos em cheque especial, ela vivendo de aluguel num quartinho na Vila Mariana. O tempo passou, as vidas se trombaram, e um ano depois de “I Will” encerrar nosso namoro e iniciar nosso casamento desembarcávamos no Perú. Não por acaso, a primeira foto do primeiro texto do Faniquito é justamente sobre essa conquista.

Do churrasco a Huayna Picchu foi um longo caminho.

Do churrasco a Huayna Picchu foi um longo caminho.

Foi com ela que eu reaprendi a sonhar (porque sim, meus amigos – eu desconfio dessa gente que é feliz o tempo todo, 24/7), desses sonhos fazer planos, e desses planos montar projetos que virariam viagens, que nos levariam a outros continentes, ou a um show do Paul McCartney. Foi ela que me segurou quando meu pai se foi, e com ela eu imaginei uma vida perfeitamente possível, e totalmente imprevisível, uma vez que sempre fomos o casal improvável. Mas deu tudo certo, e a gente tem muito a celebrar, sonhar,  planejar e viajar ainda.

Faniquito funcionando até em dia de chuva :)

Faniquito funcionando até em dia de chuva 🙂

Por isso, o texto de hoje saiu fácil. Falar daquilo que a gente ama é fácil, e a gente faz isso toda segunda e quinta. Mas hoje, me dei ao direito de falar de QUEM eu amo – e que não por acaso, contextualiza tudo isso de uma maneira muito simples. Parabéns Jinhu (ela é Dé pra vocês, mas Jinhu só pra mim)… e que seus sonhos continuem cada vez mais altos, distantes e coloridos. Eu compro todos, e deles faço questão de fazer parte e contar história por aqui.

Causos, Faniquito, Fofuras

Apresentando: o mundo

19 de março de 2015

Dia desses a gente programou uma viagem. Que a princípio seria pra dois, mas que no fim das contas dobrou de tamanho. Viagem que seria um mochilão pesado, com mudanças de altitude, longas viagens em ônibus de procedência duvidosa, algumas correrias, e passeios que exigiam certa resistência física (que nem a gente sabia bem se tinha ou não). Na época, eu tinha 31, a Dé 28, e a Mel – nossa amiga e uma das colaboradoras do Faniquito – tinha apenas 20 anos. O papo começou em 2010, a viagem seria em 2011. E durante a comemoração do meu aniversário em janeiro, me chamam à mesa. Minha mãe vira pra mim, e comunica:

– Eu também vou, viu?*

Tomei um susto, óbvio. A começar pela única informação já relatada em nossos perfis: Paquinha** tinha na época seus bem vividos 62 anos, e teria 63 na viagem. Um histórico de dor nas costas, dor nos pés, dor nisso e dor naquilo. Estatura não muito avantajada, e assim como eu, boa de garfo. Mas todas essas informações perdiam importância perto de algumas outras: minha mãe nunca havia saído do país (ok, eu só havia saído uma, a Dé duas), voado de avião, ou mesmo passado tanto tempo longe de casa. Meu pai havia falecido há seis meses, e achei aquele ímpeto sensacional. Dois segundos depois do susto, topei – e não mais repensei, pois sabia que aquilo seria incrível.

Perder alguém (e nesse caso, alguém tão próximo como meu pai) instantaneamente mudou meu modo de lidar com as pessoas. Imagino que cada pessoa lide com uma situação traumática à sua maneira. A minha foi aproveitar ao máximo dali em diante a tudo e a todos: pelo menos uma vez ao ano tentar rever o máximo de pessoas possíveis (e uso descaradamente meu aniversário pra isso), nunca perder a oportunidade de agradecer, criticar, elogiar ou dividir as coisas importantes da vida, e por aí vai. É coisa minha, e é minha forma de eternizar tudo que meu pai fez por mim também. E durante os meses que se seguiram, eu pensava: “O velho teria orgulho de ver o que a gente vai fazer pela Paquinha“.

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A primeira reunião de turma, no Mercadão.

E o Faniquito surgia mais ou menos nessa época :)

O Faniquito surgia mais ou menos nessa época 🙂

E chegou setembro.

Mochilamos. Primeiro, o vôo de São Paulo – com escala em Santa Cruz de la Sierra, e a primeira correria para pegar a conexão – até La Paz. Chegamos à noite, pegamos um táxi capenguíssima e pouco depois estávamos no albergue. Sim, o primeiro albergue da vida da Paquinha. Encomendamos uma pizza e tomamos uma cerveja no meio do bar. E dali seguiram-se várias experiências, que pipocarão aos poucos por aqui: as ladeiras de La Paz, as folhas de coca, o Paro Cívico, as festividades em Cusco, Machu Picchu, Salar do Uyuni, o ônibus quebrado, o amigo americano, as comidas e bebidas inéditas, o primeiro barco (da vida dela, cruzando o Lago Titicaca), passear no deserto, dormir sem energia e acordar em temperatura negativa…

O primeiro dia de fato fora do Brasil - nesse caso, em La Paz.

O primeiro dia de fato fora do Brasil – nesse caso, em La Paz.

E o primeiro baque de emoção, com um evento local em Cusco.

E o primeiro baque de emoção, com um evento local em Cusco.

O ritmo durante a viagem, obviamente, não era o mesmo que o nosso, mas não estávamos com pressa. Dividimos a bagagem dela, e todo mundo se ajudou – ela também ajudou muito a gente: sim, mãe é mãe em qualquer lugar do mundo (e ela no caso estava provida de um filho original, e duas filhas adquiridas). Várias foram as vezes ela se emocionou (como na foto logo acima). As imagens que a gente se acostuma em casa tomam outras cores nesse novo contexto, e redescobrimos as pessoas. A cada novo lugar, uma informação diferente – e essas novidades desnorteavam a Paquinha: as tecelãs peruanas, as montanhas de Machu Picchu, aquela imensidão do deserto de sal boliviano, as lhamas e alpacas. De repente, outra cidade. Vinte e um dias, que permanecem mais que vivos na memória da gente.

Em Pisac, da mesma sequência da foto que abre esse texto...

Em Pisac, da mesma sequência da foto que abre esse texto…

...e um pouco mais tarde, em Ollantaytambo, dando as favas pra chuva que caía.

…e um pouco mais tarde, em Ollantaytambo, dando as favas pra chuva que caía.

Até hoje a gente fala sobre essa viagem, óbvio. Pelos lugares, paisagens e tudo aquilo que a gente tá acostumado a dividir sempre que se afasta de casa, claro, mas o mais legal é notar a cara de novidade que minha mãe faz toda vez que relembra da aventura. É um prazer absurdo pra gente ter “apresentado o mundo” à Paquinha. Notar que toda aquela lista de coisas apontadas lá em cima desapareceram durante a viagem é um prazer, pois a empolgação a cada novo dia era muito maior que qualquer preocupação – aparentemente ela deixou todos os problemas no Brasil sem avisar a gente, mas como confiamos na véia desde o início, não ficamos surpresos.

Não teve obstáculo pra Paquinha...

Não teve obstáculo pra Paquinha…

...e também não foi só perrengue: por diversas vezes nos demos muito bem.

…e também não foi só perrengue: por diversas vezes nos demos muito bem.

O primeiro barco da vida, após 63 anos. Medo?

O primeiro barco da vida, após 63 anos. Medo?

Eis a resposta.

Eis a resposta.

Portanto, ao final desse texto – e dessas fotos – a gente deixa um conselho pra você, amiguinho ou amiguinha viajante: além da bagagem, leve pra estrada quem você ama: seus pais, filhos, irmãos, primos, amigos (com procedência), a vovó, o vovô e até o cachorrinho. Pense em combinações improváveis – sim, às vezes quem menos se imagina quer fazer algo que a gente num primeiro momento pode achar totalmente descabido, mas pense: uma realização de vida dessas tem preço? Mais que um presente, dividir uma experiência de vida tão marcante como uma viagem, ou um trecho dela?

Não tenha frescuras quando for viajar.

Não tenha frescuras quando for viajar.

Procure sempre as melhores companhias.

Procure sempre as melhores companhias.

Leve sempre um agasalho.

Leve sempre um agasalho.

E não tenha medo do desconhecido. Nem de ser feliz.

E não tenha medo do desconhecido. Nem de ser feliz.

Pois você será.

Pois você será.

Não espere que alguém te faça um pedido desses. Tome a iniciativa, como minha mãe tomou. A experiência de viajar já é suficiente marcante, mas se torna inesquecível quando ela deixa de ser só sua, pra ser também de quem você ama.


* Faniquito não tem idade, galera. Está cientificamente comprovado.

** Paquinha (ou Marilene, pros desconhecidos) é minha mãe, e ela faz aniversário daqui a 3 dias. Uma mãe como poucas, e que eu espero, sirva de espelho pra outras mamães por aí. Achei justo homenageá-la numa data próxima, com um apanhado geral de uma viagem que vai aparecer aqui no Faniquito por diversas vezes. Feliz aniversário adiantado, véia. Que o mundo te abrace (assim como eu pretendo fazê-lo, o mais breve possível). Amo muito você.