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el chaltén

Argentina

Conhecendo El Chaltén

16 de fevereiro de 2015

Uma cidade, mas pode chamar de vila. El Chaltén não possui sequer mil habitantes, e é a cidade mais nova da Argentina (nasceu em 1985, delimitando uma fronteira com o Chile por meio de ocupação). Chegamos lá de ônibus, partindo de El Calafate, numa viagem razoavelmente rápida de 220 km pela RP 23 – existem passeios de um dia, com saída e chegada em Calafate, feitos da mesma maneira.

Ainda no ônibus, o Fitz Roy é o cartão de visitas.

Ainda no ônibus, o Fitz Roy é o cartão de visitas.

E de fato, conhecer a cidade não é tarefa difícil ou demorada. A estrada desemboca em sua rua principal (Miguel Martín de Güemes), que divide o vilarejo em duas partes: do lado direito (cuja rua principal é a San Martín), os restaurantes, alguns hotéis e albergues, lojas e bares; do lado esquerdo (cuja rua principal é a José Antonio Rojo), residências em sua grande maioria, com algumas exceções para hospedarias de menor porte e alguns restaurantes. Ambos os lados acessados a partir de uma bifurcação daquela mesma rua principal, chamada Lago del Desierto. É essa a geografia da cidade, que de tão simples pode ser desbravada num passeio à pé em menos de uma hora – se o vento patagônico te deixar.

A chegada pela Miguel Martín de Güemes.

A chegada pela Miguel Martín de Güemes.

O guia de ruas, nada complexo.

O guia de ruas, nada complexo.

A San Martín. Nosso albergue ficava no final.

A San Martín. Nosso albergue ficava no final.

El Chaltén ainda é notoriamente um vilarejo, cujo ritmo de construção está em vias de torná-lo uma cidade de fato. Porém, seu maior atrativo não encontra-se dentro desse perímetro descrito anteriormente. É de Chaltén o ponto de partida para alguns dos lugares mais espetaculares da Patagônia Argentina: o Cerro Fitz Roy, o Cerro Torre, a Laguna de Los Tres, o Glaciar Viedma, além de ser um dos acessos ao gigantesco Parque Nacional Los Glaciares. Todos esses lugares são motivos mais que suficientes para visitá-la, e no fim das contas a cidade em si fica em segundo plano, em meio a outras tantas boas atrações.

Mas Chaltén tem seu charme. A começar justamente por esse aspecto de “em construção”. Há somente um posto de gasolina (onde o motorista enche o próprio tanque – ou galão de reserva, soubemos que sim, existe gente carregando gasolina dentro do próprio carro), e a comunicação com os moradores por vezes acontece em papéis fixados na porta da rodoviária – exatamente como no elevador do seu prédio. A cidade é ladeada pelo Río de las Vueltas, que tem uma cor azul-esverdeada extremamente bonita. O aspecto da água é turvo de tão gelado, pois o rio é proveniente do degelo dos glaciares. Dá pra chegar bem pertinho, mas mergulhar, nem pensar… O som é quente, o vento gelado. Uma jaqueta corta-vento é tão importante quanto um par de Havaianas, então leve ambos.

O posto de gasolina - que sim, funciona.

O posto de gasolina – que sim, funciona.

O informativo local funciona na base do sulfite e durex.

O informativo local funciona na base do sulfite e durex.

O verde e geladíssimo Río de Las Vueltas.

O verde e geladíssimo Río de Las Vueltas.

Pelo caminho encontra-se uma pequena capela (Toni Egger Gnadenkapelle – Toni Egger foi um alpinista austríaco, e o primeiro a morrer tentando superar o Cerro Torre – também dá nome a um de seus picos), que serve de memorial aos que não regressaram do Fitz Roy ou do Torre. Ilustram a paisagem a tradicional igrejinha, uma pequena escola que fica ao lado de um parquinho, entre outras imagens comuns a vilarejos. Durante a tarde o movimento das ruas é quase nulo, mas sempre existem pequenos grupos bebendo ou comendo na entrada de hospedarias e alguns restaurantes. Os rostos tornam-se familiares muito rapidamente (estando hospedado em Chaltén, certamente você verá as mesmas pessoas por diversas vezes). Além disso, a cidade é repleta de cães – sem dono, mas extremamente amáveis – que estavam por lá desde a época da briga pela fronteira, e hoje habitam a região.

A capela - um memorial aos que ficaram nas montanhas.

A capela – um memorial aos que ficaram nas montanhas.

Todo vilarejo que se preze tem sua igrejinha.

Todo vilarejo que se preze tem sua igrejinha.

O cair da tarde traz todo o tom bucólico que a cidade carrega.

O cair da tarde traz todo o tom bucólico que a cidade carrega.

Um dos simpáticos, lindos e pidões cachorros que estão espalhados por Chaltén.

Um dos simpáticos, lindos e pidões cachorros que estão espalhados por Chaltén.

Nas lojinhas a gente encontra alguns badulaques pra levar de lembrança, mas nada muito fora do comum – postais, mapas, artesanatos e camisetas temáticas são o que mais se vê – existe uma loja bem grande logo na entrada da cidade, onde os turistas fazem a festa. Porém, o forte da cidade são os esportes de aventura, e a gente acaba encontrando também algumas lojas de suporte a alpinistas, montanhistas, ciclistas e adeptos de camping. O tema é recorrente, e isso é explícito até nos lugares mais inusitados. Roupas, suprimentos e equipamentos estão lá, tanto para iniciantes como para esportistas profissionais. Algumas agências dão suporte aos passeios pela região, e dicas importantes para a prática das modalidades. Nessas agências a gente também encontra o mapa da cidade – que torna-se absolutamente denecessário depois de umas duas voltas por lá.

Uma lojinha com a cara do fim do mundo.

Uma lojinha com a cara do fim do mundo.

Algumas capricham na propaganda.

Algumas capricham na propaganda.

Mas a cidade é dos montanhistas - até na hora de jogar o lixo fora.

Mas a cidade é dos montanhistas – até na hora de jogar o lixo fora.

Obviamente come-se muito bem por lá* – fator recorrente em toda a Patagônia. O Parrilla Como Vaca (http://tinyurl.com/le4k42l) é um baita lugar pra uma carne bem-feita e gostosa; se quiser algo um pouco mais sofisticado, o La Tapera (http://tinyurl.com/l9fp4xc) atende muito bem às expectativas – mas chegue cedo, pois o lugar lota e é pequeno; para um bom custo-benefício, a Patagonicus (http://tinyurl.com/l66x6ql) pode funcionar para uma pizza no meio do dia, ou mesmo um lanche. Existem outras opções, e entre elas a gente destaca justamente a que mais usou: o restaurante de nosso albergue. O Hostel Rancho Grande (http://tinyurl.com/psxvetn) possui poucos, generosos e ótimos pratos, além de um menu de café da manhã pra alpinista nenhum botar defeito. Um conforto de verdade pra qualquer aventura. Obviamente há alguns cafés, sorveterias e outros lugares minúsculos, que merecem uma vasculhada com carinho.

Cortes explicados, comida vistosa, uma pizza ocasional, ou um PF honestíssimo: passar fome não será um problema.

Cortes explicados, comida vistosa, uma pizza ocasional, ou um PF honestíssimo: passar fome não será um problema.

Enfim, El Chaltén é um ótimo lugar, seja pra se preparar, seja descansar depois de uma incursão às belezas da região. Um lugar para desligar a cabeça, e curtir um pouco do sossego que a Patagônia Argentina oferece. E o cenário – pois a minúscula cidade possui uma visão privilegiada para os Cerros Torre e Fitz Roy – é para poucos. No caso de Chaltén, menos de mil. Dado que escalá-los e superá-los é uma missão somente para alguns sobre-humanos, nos resta observar. E já vale muito.

Cerros Torre e Fitz Roy: apenas para profissionais.

Cerros Torre e Fitz Roy: apenas para profissionais.

Aproveitem, enquanto a cidade ainda é uma criança, e desse tamanho.


*Nossos textos não são patrocinados. A gente indica aquilo que a gente gosta/aprova, porque isso também ajuda na viagem alheia. Simples assim.

Brasil

A grama do vizinho

12 de janeiro de 2015

Budapeste é uma das cidades mais impressionantes que já visitei. Durante todo o tempo que estive lá fiquei perplexa com as paisagens que a cidade oferece.

De um lado o Castelo de Buda, de outro a Chain Bridge e mais pra frente o Parlamento. Por um tempo considerei a ideia de morar ali, ter a oportunidade de ver essa cidade linda todos os dias, me sentir minúscula perto de tantos prédios gigantescos e cheios de história, de ficar embasbacada todos os dias ao passar por uma mesma rua.

Ah... o Parlamento <3

Ah… o Parlamento <3

Mas será que isso é possível?

Quando digo “Budapeste”, sinta-se à vontade para trocar o nome da cidade por qualquer outra: Praga ou Viena, que têm tantos prédios históricos quanto Budapeste; Dubrovnik com suas muralhas gigantescas e suas ruazinhas estreitas e lotadas; El Chaltén, que tem no seu quintal o Fitz Roy, absurdamente lindo e imponente; Rio de Janeiro com o Pão de Açúcar e a sua vista maravilhosa; São Paulo com suas… ahm… seu… hmmm… seus prédios intermináveis? Seu bolsão de poluição no céu?

Que céu poluído mais bonito!

Que céu poluído mais bonito!

Essa história de morar em Budapeste e ver tanta beleza todos os dias me fez pensar: morando em uma cidade qualquer, fazendo parte do seu cotidiano, mergulhada na sua rotina, é possível prestar atenção no que a sua cidade realmente te oferece? Não estou falando de coisas pra fazer, de lugares para comer, isso todos nós sabemos e estamos procurando conhecer cada vez mais. É possível olhar a sua cidade com os olhos de alguém que vê uma cidade pela primeira vez, por exemplo? É possível andar pela mesma rua todos os dias e não deixar que a paisagem vire somente um cenário, daqueles que você sabe que está lá simplesmente porque sempre esteve ali, e sempre vai estar?

Nasci em São Paulo, mas me mudei para o interior e por lá fiquei durante alguns anos. Nós morávamos relativamente perto da capital, então vínhamos pra cá várias vezes. Lembro de chegar em São Paulo uma vez, e em pleno dia útil pela manhã a Avenida Professor Francisco Morato estava toda livre (coisa que não se vê mais hoje em dia). Andar por aquela avenida gigantesca vendo uma cidade completamente diferente da minha me fez achar tudo aquilo muito novo e divertido. Voltamos a morar em São Paulo e depois de algum tempo (não muito) me acostumei de novo com a cidade. Acostumei tanto com a cidade a ponto de voltar da nossa última viagem achando que São Paulo não é uma cidade turística, e que não oferece paisagens impressionantes pra quem chega aqui. Que o caos do cotidiano é tão intenso que, como pode alguém querer conhecer essa cidade quando se tem o Rio de Janeiro, cheio de praias e belezas naturais, um pouquinho mais pra cima?

Foi nesse contexto que me propus a prestar atenção no que está ao meu redor. Cheguei em São Paulo decidida a dar uma chance pra esse lugar tão cinza e hostil. Confesso que é uma tarefa difícil quando se está parada no trânsito em um carro sem ar condicionado, ou então de pé num ônibus lotado, mas a experiência tem sido gratificante.

É olhar com carinho que a cidade retribui.

É olhar com carinho que a cidade retribui.

Por exemplo, existe um prédio na Marginal Pinheiros que integra de uma forma espetacular a tal “parede viva” com uma fachada espelhada e imponente – coisa que nunca vi em nenhum outro lugar. Sempre achei que as praças de São Paulo não eram usadas, mas duas ruas atrás de onde trabalho tem uma pracinha cheia de sombras, muito gostosa pra sentar, descansar e tomar coragem antes de voltar pra labuta. Me descobri uma fã dos prédios espelhados e acho que um bom paisagismo faz desses prédios um multiplicador de paisagens bonitas e céus azuis cheios de nuvens. As belezas estão aí pra quem quiser vê-las, não são tão óbvias quanto as de Budapeste, e às vezes não têm tantas histórias quanto as de lá, mas achar beleza no meio do caos está me parecendo recompensador.

Umas das grandes vantagens de viajar é que chegar num lugar novo te faz enxergar com outros olhos, te faz aceitar coisas novas, experiências diferentes. E conseguir trazer esse olhar e essa abertura pra sua vida cotidiana… aí que a coisa toda se torna enriquecedora.

Nuvenzinhas x 2

Nuvenzinhas x 2