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Ir e vir

Não sei se vou ou se fico

26 de novembro de 2015

Uma leitora do Faniquito entrou em contato comigo duas semanas atrás, perguntando se era tranquilo fazer uma viagem pra Turquia, mesmo com tudo que estava acontecendo por lá. Fiz uma pesquisa rápida e não vi nada preocupante – muito pelo contrário: com a situação dos refugiados, as pessoas estavam se mostrando muito prestativas, ainda mais na área do turismo, e os viajantes que voltavam de lá só tinham elogios. E então no dia 13 de novembro eu respondi exatamente isso. No mesmo dia 13, aconteceram os ataques em Paris… E foi só no dia seguinte que percebi que a minha resposta tinha sido bem incompleta.

Nesta segunda-feira o Departamento de Estado dos EUA emitiu um alerta de viagens para o mundo inteiro. O Departamento de Estado é responsável pelas relações internacionais do país, e o conteúdo do alerta é basicamente este:

“Existe um risco em viajar para qualquer parte do mundo por causa do aumento da ameaça terrorista. Deverão ser evitadas multidões ou lugares muito cheios de gente, assim como se deve tomar cuidado em espaços e transportes públicos.”

Não vou entrar na questão da política do medo que foi colocada desde os ataques na França, nem vou me fazer de inocente, dizendo que o mundo está um mar de rosas. O Departamento de Estado dos EUA está fazendo a sua parte. É preciso sim alertar as pessoas de que a situação atual é perigosa, mas a ideia de que qualquer viagem deve ser evitada me parece irreal. Ainda mais às vésperas das férias escolares, Natal e Reveillon.

Viajar é parte da nossa cultura. Ajuda a expandir a cabeça e seus conceitos, faz com que você participe (mesmo que superficialmente) de outra realidade, e consequentemente se coloque no lugar de outras pessoas. Faz com que você se conecte não só com quem conheceu, mas com todo um povo e uma cultura (vale dizer, todas essas vantagens em viajar vão contra a tal política do medo), e acima de tudo, faz com que você saia da sua zona de conforto. Sob essa ótica do medo, sair dessa zona de conforto pode ser confundido com entrar numa zona de risco.

Assim como o conforto, o risco é um conceito muito pessoal. Cada um decide onde termina seu (des)conforto e começa a sua insegurança.

Estar confortável em um país desconhecido com tudo o que vem acontecendo é algo que varia de pessoa para pessoa. Cada um deve decidir por si só se aceita ou não o risco de viajar e, caso aceite, precisa assimilar a situação por completo: possíveis atrações turísticas fechadas para o público, segurança reforçada e nem sempre tão receptiva nos aeroportos, etc.

Se esse tipo de cenário te preocupa, cancele sua viagem. Não há dinheiro no mundo que seja capaz de te deixar tranquilo, ainda mais num lugar onde sua própria sensação de segurança não é total. Mas se com tudo isso, viajar ainda te pareça mais importante do que qualquer outro acontecimento externo, vá – sem medo de ser feliz. O mais importante: confie na sua decisão e no seu instinto.

Riscos sempre existiram, e sempre existirão – seja o terrorismo, o acidente de avião, um tsunami, ou mesmo tropeçar na calçada e quebrar o pé. Fica a pergunta: o que é maior? Seu medo, ou sua vontade de conhecer o mundo?

Bolívia

A verdadeira Copacabana

3 de novembro de 2015

Durante nossa passagem pela Bolívia, havia um buraco em nosso planejamento, chamado Copacabana. Aos desavidados, não é um lapso geográfico: acreditem – a cidade boliviana de Copacabana deu nome ao bairro carioca mais famoso do mundo. Está na Wikipédia que “no século XIX, uma réplica local da imagem de Nossa Senhora de Copacabana foi levada por comerciantes espanhóis ao Rio de Janeiro, no Brasil, onde foi criada uma pequena igreja para abrigá-la. A igreja cresceu e acabou por nomear o atual bairro de Copacabana.”

Voltando à nossa experiência: não havíamos planejado absolutamente NADA para a cidade. Como chegar, onde ficar e o que fazer seriam decididos no meio do caminho, e assim foi feito. Ao contrário do nosso relato anterior dessa mesma viagem sobre transportes traumáticos, tivemos a mais agradável das experiências com nosso veículo, cujo trajeto consistia na saída de Cusco (talvez a explicação para tamanha diferença seja a origem peruana do ônibus), uma pausa em Puno (onde muita coisa aconteceu – mas o que acontece em Puno fica em Puno, e em nossas memórias), e de lá a travessia do país até a chegada em Copacabana. Viajamos num semi-leito gostosíssimo, carimbamos os passaportes num lugar bem sossegado e pouco depois desembarcamos na cidadezinha. Um táxi nos levaria ao nosso albergue, localizado poucas quadras adiante.

Nada de Rio de Janeiro: estávamos à caminho da Copacabana original.

Nada de Rio de Janeiro: estávamos à caminho da Copacabana original.

Nada de surpresas também: dessa vez dava pra confiar no ônibus...

Nada de surpresas também: dessa vez dava pra confiar no ônibus…

...e ainda contemplar o Lago Titicaca da janela.

…e ainda contemplar o Lago Titicaca da janela.

Uma explicação rápida sobre o que não será explicado:

Nosso principal intuito na chegada a Copacabana era DESCANSAR. Estávamos emocionalmente exaustos com um desgaste totalmente inesperado que tivemos DURANTE a primeira parte de nosso trajeto, e precisávamos de boas horas de paz e tranquilidade – coisas que são essenciais para que uma viagem valha a pena e deixe saudades, e não cicatrizes. Detalhes sobre o que aconteceu, com quem e seus resultados dizem respeito a quem estava lá, e somente a essas pessoas. Por isso mesmo, pedimos desculpas por essa lacuna.

Copacabana é mais conhecida como ponto de partida para a ilha do Sol – um território inca bastante conhecido, e que movimenta a economia local com o turismo pela região. A cidade em si é minúscula, contando com aproximadamente seis mil habitantes. Sua geografia consiste em ladeiras bastante impiedosas, poucas ruas e simpáticas casinhas de cor terrosa.

Uma cidadezinha cheia de ladeiras.

Uma cidadezinha cheia de ladeiras.

E imagino que possamos dizer que essa é "a verdadeira praia de Copacabana", não?

E imagino que possamos dizer que essa é “a verdadeira praia de Copacabana”, não?

Acabamos não visitando a ilha do Sol, por naquele momento priorizarmos outra coisa – ficaríamos pouco mais de um dia na cidade, e tudo o que queríamos era esvaziar a cabeça e aproveitar aquele novo momento de verdadeiro alívio antes da segunda parte de nossa viagem. Por isso mesmo, pouco após nos instalarmos, fomos passear um pouco pela cidade e comer alguma coisa. Acabamos em um dos diversos restaurantes que oferecem o prato típico da cidade – a truta. Com direito a sucos enfeitados com simpáticos guarda-chuvinhas, celebramos o novo momento com o sugerido peixinho.

Se a principal oferta gastronômica é a truta...

Se a principal oferta gastronômica é a truta…

...que venha a truta, oras.

…que venha a truta, oras.

Mais uma breve caminhada pela cidade, e nos separamos: minha mãe resolveu tirar uma soneca da tarde, enquanto eu, a Dé e a Mel encaramos um mini-trekking. A ideia era subir o Cerro Calvario (que nome mais sugestivo, não?), e ver o pôr-do-sol lá de cima. Consiste num caminho de cunho religioso – que justifica o nome da colina, pois existem 14 pontos que remetem à via crucis. Seu início era bem próximo à saída do nosso albergue, e calmamente fomos subindo até a chegada lá no topo.

Paquinha se recolheu aos novos aposentos.

Paquinha se recolheu aos novos aposentos.

Nós resolvemos encarar a subida. E que subida, amigos.

Nós resolvemos encarar a subida. E que subida, amigos.

Logo de cara, a primeira...

Logo de cara, a primeira…

...das várias cruzes que compõem o caminho do Cerro Calvario.

…das várias cruzes que compõem o caminho do Cerro Calvario.

Era uma tarde fria e linda.

Era uma tarde fria e linda.

Pelo caminho, diversos agradecimentos...

Pelo caminho, diversos agradecimentos…

...e demonstrações de devoção à Nossa Senhora de Copacabana.

…e demonstrações de devoção à Nossa Senhora de Copacabana.

Já durante a subida, uma visão espetacular nos aguardava. Fazia frio, mas não a ponto de nos intimidar. Mesmo íngreme em alguns pontos, é um caminho relativamente tranquilo de ser feito. Os poucos obstáculos estão na parte final da subida, com um caminho de pedras que deve ser feito com cuidado. Nada que assuste ou afaste os curiosos – a recompensa na chegada ao topo faz valer o risco.

Uma subida tranquila...

Uma subida tranquila…

...feliz...

…feliz…

...e pacífica. Como nossa viagem - e Copacabana - mereciam.

…e pacífica. Como nossa viagem – e Copacabana – mereciam.

Devagar e com toda essa tranquilidade, chegamos lá em cima.

Devagar e com toda essa tranquilidade, chegamos lá em cima.

A sequência do Calvário era repetida em lá em cima.

A sequência do Calvário era repetida em lá em cima.

Enquanto a visão da baía se misturava às velas dos devotos.

Enquanto a visão da baía se misturava às velas dos devotos.

Lá embaixo, a cidade aos poucos se iluminava. Um belíssimo final de tarde.

Lá embaixo, a cidade aos poucos se iluminava. Um belíssimo final de tarde.

Nossa breve estada na cidade proporcionou o descanso desejado com sobras: no dia seguinte, um café da manhã tão aconchegante quanto as redes no quintal, o dia de sol combinado ao vento gelado que vinha da cordilheira dos Andes, e até mesmo o silêncio de uma cidade pequena como a que estávamos foi a combinação perfeita àquilo que desejávamos em nossa passagem por Copacabana.

Um novo dia.

Um novo dia.

Um merecido descanso...

Um merecido descanso…

...e os Andes logo adiante, nos recebendo, para dias melhores que viriam a seguir.

…e os Andes logo adiante, nos recebendo, para dias melhores que viriam a seguir.

Se vale uma dica: não se prenda às obrigações turísticas que certos locais oferecem (e às vezes, significam – de tal maneira que “estar lá” é sinônimo de fazer A, B ou C). Não termos ido à ilha do Sol não fez diferença em nossa viagem, simplesmente porque queríamos outra coisa naquele momento. Tivemos, e dali em diante cair na estrada ganhou outro significado – muito melhor, mais leve e feliz. Em Copacabana, a paz foi nosso maior presente.

Causos, Romênia

Um sonho por 50 Bani

29 de outubro de 2015

Ontem fez exatamente um ano que a Dé levou uma TREMENDA rasteira profissional. Não foi uma surpresa, mas ainda assim não foi um momento lá muito fácil. Antes que vocês fujam daqui, vou explicar o contexto desse momento – de mochila nas costas.

Sabe aquela hora em que você PRECISA viajar, pois o trabalho te consumiu de tal forma que uma pausa é tão necessária quanto respirar? Essa era ela, antes das nossas férias: clima ruim em casa, cansaço mental, emputecimento agudo… toda aquela coisa que todos nós sabemos muito bem como funciona. Preparamos as mochilas e fomos descansar (bem) longe daqui.

Os dias se passaram, e quando os trinta dias estavam terminando o pensamento de voltar a viver naquele inferno começou a tomar conta da cabeça da pequena. Em nosso penúltimo dia de Romênia estávamos visitando o Castelo de Peleș (que foi motivo do nosso segundo texto no Faniquito), quando pouco antes da saída passamos por uma daquelas fontes repletas de moedas, que a gente vive encontrando em diversos cantos do mundo. Um lugar lindo daqueles, seria possivelmente “nossa última fonte em muito tempo”… oras, por que não fazer uma fezinha? Chamei a Dé:

– Vem cá.
– O que foi.
– Pega a moedinha, e faz um pedido.
– Qual pedido?
– Aquele.

Era igualzinha :)

Era igualzinha 🙂

Era óbvio qual seria o pedido.

Viramos as costas, ela jogou a moedinha. Eram só 50 bani (coisa de 50 centavos de Real), mas acho que a vontade era tamanha de se livrar daquele encosto de emprego que o pedido foi feito recheado de esperança. “Vai dar certo, vai por mim“, eu lembro de dizer antes de dar um abraço nela. Passamos bem o resto do dia, e voltamos pro Brasil com aquele sentimento de missão cumprida depois de uma viagem gostosa como a que havíamos feito.

Obviamente o humor dela foi pro espaço já na primeira semana de volta ao emprego. Coisa de pouco menos de um mês, nessa mesma data, a Dé rodou. Dia seguinte ela já estava tocando a vida novamente, e três dias depois arranjou um novo lugar pra trabalhar: mais distante de casa, mas com gente interessada, profissional e sem fulando puxando tapete de geral. É lá que ela está até hoje, feliz da vida e levinha da Silva.

Faz um ano que aquela fonte nos fez o favor de levar a sério nosso pedido. Toda viagem tem por função natural trazer pras nossas vidas dias melhores. Essa em especial trouxe mais que isso, e um ano depois a gente continua muito grato por, em algum momento, termos apostado numa grande virada em nossas vidas em uma moedinha dourada que valia quase nada.

Valeu, e muito.

Gastronomia

Quem tem boca…

20 de outubro de 2015

O princípio fundamental de qualquer viagem é experimentar. É fato: estando fora de casa, queremos fazer, experimentar ou viver algo diferente. Mesmo as viagens mais cômodas e sossegadas pedem por esse ar de “coisa nova”, seja ela uma bebida, um prato, um banheiro, uma cama, ou mesmo um horário diferente do que nos acostumamos a acordar todos os dias. Pra fazer o de sempre, melhor ficar em casa… certo?

Eu e a Dé nunca cozinhamos nos albergues em que nos hospedamos. Nada pessoal, muito menos preconceito, mas das nossas necessidades (de casal, e mesmo pessoais) experimentar a comida local é tão importante quanto conhecer um novo lugar – e disso a gente não abre mão. Respeitamos e admiramos aquela galera que passa toda uma viagem na base do pão Pullmann e miojo, mas nas contas que fazemos antes de viajar, poder comer sem se preocupar é uma de nossas diversões. E pra que possamos fazer isso da forma mais bacana, preferimos experimentar o que estiver na frente. Nem sempre a gente se deu bem fazendo isso, mas temos boas histórias pra contar:

Ovos romenos

Estávamos no Caru’ cu bere – um dos restaurantes mais antigos e tradicionais de Bucareste (e que será tema de texto mais pra frente). Chegamos cedo, querendo tomar um café da manhã antes de sair pra conhecer a cidade. Sendo um verdadeiro ponto turístico, todos os funcionários falam inglês. Pedimos o cardápio, e ele veio – todo bilíngue, exceto nos pratos do café da manhã. Podíamos perguntar para a garçonete, mas preferimos valer o risco e pedir pela beleza estética das palavras em romeno. A Dé ganhou dois ovos. Eu, um omelete com chá. Eu não como ovo, então a Dé acabou comendo omelete com ovos, e eu fiquei só no chá (minha hora do almoço foi, por consequência, selvagem).

Ovolândia, e o melhor chá da vida.

Ovolândia, e o melhor chá da vida.

Poderia ter sido uma baita decepção, mas a pequena gostou do prato duplo dela, e eu tomei o melhor chá da minha vida – sem hipocrisia, tava tão bom que eu tive que procurar sabor semelhante no Brasil (e o que mais se aproximou foi o vermelhinho da Twinings).

Sim: um chá britânico com gostinho de Romênia :)

Sim: um chá britânico com gostinho de Romênia 🙂

Trocando em miúdos

Em nossa primeira viagem à Argentina, abrimos mão de experimentar a parrillada por pura falta de dinheiro/estômago. E se você não sabe o que é parrillada, a gente explica:

“A parrillada permite provar diferentes partes da vaca. Esta refeição geralmente começa com uma salsicha e chouriço, antes da chegada da carne principal. Ela também pode ser acompanhada de rins, pâncreas, fígado e tripas de gado. Frango e porco esporadicamente também estão inclusos.”

Quando voltamos pra lá, virou dívida pessoal. Acabamos nos metendo numa Parrilla (um restaurante especializado em parrillada) na cidade de Ushuaia. Um baita frio, uma baita fome, respiramos fundo e pedimos a criança. O restaurante estava lotado, e havíamos tido uma breve aula sobre o que viria naquele prato com meu sogro.

Nada te prepara pra uma intimidade tão grande com a vaca.

Nada te prepara pra uma intimidade tão grande com a vaca.

Com a parrillada na mesa, o caminho era sem volta: experimentamos um a um aqueles cortes bizarros de carne, com consistências e cores estranhas. Não dá pra dizer que detestamos, muito menos que amamos – apenas riscamos uma pendência da nossa lista pessoal, e sobrevivemos sem grandes dores àquele jantar esquisito.

Aaaaaaah…alpaca!

Havíamos terminado nosso primeiro dia de passeio em Machu Picchu. Descemos até a cidade, e entramos no primeiro restaurante que vimos na frente (e que nos pareceu entrável – não dá pra deixar o estômago falar na frente do cérebro sob hipótese alguma). Das opções do cardápio, nos chamou a atenção a carne de alpaca – e acabamos pedindo os quatro pratos iguais. Um prato que chegou lindo como esse da foto, e gostoso de um jeito muito difícil de se imaginar. Fomos embora de bucho cheio, e morrendo de saudade dessa carninha. Quando eu e a Dé voltamos pro Perú – em Lima – pedimos alpaca novamente, e ficamos sabendo que só servem a coitada em Cusco e arredores. Ou seja, foi realmente um prato típico e muito difícil de se encontrar em outro lugar. Ah… você não sabe o que é alpaca?

Alpaca: sua gostosa.

Alpaca: sua gostosa.

É esse bichinho simpático da foto lá do topo, que abre nosso texto de hoje. Pois é: por mais fofo que seja, na hora da fome a gente quer mesmo é dentar uma coisa suculenta. Dessa coisinha bonitinha comemos esse medalhão, espetinho e até pizza. Alpaca: experimente.

O desafio da arepa

O café da manhã na Venezuela era um verdadeiro desafio: Santa Elena de Uairén sofria com o desabastecimento (assim como ocorre com todo o país), e queríamos porque queríamos experimentar a tal arepa, que é um prato bem comum e típico do país. Fomos a um restaurante chamado La Arepera, crentes que conseguiríamos degustar o tal quitute. Porém, o garçom era mais atrapalhado que qualquer outra coisa, e depois de pedirmos duas arepas e dois sucos de laranja, recebemos dois tostex e duas Coca-Colas. Essa foi a reação da Dé ao ocorrido:

Arepa e suco? Não... tostex e Coca-Cola.

Arepa e suco? Não… tostex e Coca-Cola.

La Embajada: quem vê cara...

La Embajada: quem vê cara…

...não vê coração. Nem arepa :)

…não vê coração. Nem arepa 🙂

Foi num cantinho chamado La Embajada que encontramos nossa arepa… e que troço bom a tal massinha de polenta frita com recheios variados (no caso, nem tão variados, mas muito gostosos). Nossos cafés da manhã na cidade consistiam de arepas e sucos enquanto estivessem disponíveis (e mesmo comendo como se fosse um almoço, o valor nunca ultrapassava dez Reais PARA AMBOS). Ganhou um lugar especial no nosso coração.

Traumas ou delícias: tudo vira história. Então deixe seu medo em casa, e vá experimentar os sabores do mundo sem medo 🙂

Venezuela

Uma saga chamada Roraima (3/6)

5 de outubro de 2015

Seria uma manhã difícil. Possivelmente, a mais esperada até então, uma vez que subiríamos o Roraima – e isso já era motivo mais que suficiente para que acordássemos dispostos, mesmo com as dores que já nos incomodavam – a mim principalmente, pois o joelho de fato não estava nada bem. Imaginando o que viria pela frente, era hora de respirar fundo.

Do acampamento ao topo: um longo caminho.

Do acampamento ao topo: um longo caminho.

Tomamos nosso café, pegamos nosso almoço (um sanduichinho de presunto e queijo embrulhado num saquinho plástico – guardem essa informação), aprontamos as coisas e saímos na frente de todo mundo (pois já estávamos cientes que seríamos os últimos a chegar no dia seguinte – então por que não começar na frente pra diminuir esse gap?). Descemos uma pequena trilha, cruzamos aquela cachoeirinha onde deveríamos ter tomado banho no dia anterior, e seguimos até o começo da subida.

É um trecho bastante acidentado, com obstáculos semelhantes a degraus – mas “não tão dóceis”, pois os pés encaixavam durante cada pequena subida, e a mudança entre os níveis não era tão suave. A trilha é evidente, mas longe de ser aquela coisa Começamos bem, mas não demorou para que o corpo começasse a dar sinais de cansaço. Durante essa primeira parte da subida, algumas pessoas e pequenos grupos desciam pela mesma trilha. Praticamente todos com quem cruzamos ofereciam palavras de incentivo, já sabendo o tamanho do desafio com que estávamos lidando. Algumas pausas para água – que encontrávamos com certa frequência pelo caminho, e isso facilitava um pouco as coisas. Nisso, o grupo todo havia passado pela gente – inclusive o guia, que esperava a passagem de todos em determinados lugares durante a subida.

Obstáculos dignos da jornada que apenas começava.

Obstáculos dignos da jornada que apenas começava.

Uma trilha não tão intuitiva, e bastante hostil.

Uma trilha não tão intuitiva, e bastante hostil.

O cansaço começou cedo, e nem poderia ser diferente.

O cansaço começou cedo, e nem poderia ser diferente.

Água: um carinho na alma.

Água: um carinho na alma.

É difícil precisar o tempo de subida, mas enfim chegamos ao paredão do Monte Roraima. E foi uma alegria absurda, acreditem.

Chegar ao paredão: a primeira vitória. Olhar pra cima, e perceber que não tem nada ganho ainda.

Chegar ao paredão: a primeira vitória. Olhar pra cima, e perceber que não tem nada ganho ainda.

Dali em diante, o caminho consistia numa trilha de subidas, descidas e alguns trechos retos mais longos, o que serviu pra gente descansar um pouco as pernas e viver um pouco mais a coisa. A impressão que se tem andando por ali é de estar num terreno de mata fechada, pois do lado oposto ao paredão existe uma vegetação fechada que impede a visão do penhasco. Porém, em alguns trechos essa mesma vegetação abre, e pessoas até então com medo de altura (como eu) têm duas opções: perder o medo ou voltar. Eu optei pela primeira, e posso dizer que nesse dia perdi meu medo definitivamente.

À direita, pedra. À esquerda, nada...

À direita, pedra. À esquerda, nada…

...além de uma vista espetacular.

…além de uma vista espetacular.

Nosso ritmo continuava mais lento que o dos demais, e em nosso último encontro com o guia ele já nos esperava há algum tempo, com cara de poucos amigos. Após dar a volta numa enorme pedra (e me livrar dos últimos resquícios de medo que ainda insistiam em me atormentar), começamos o trecho final da subida – o chamado “Paso De Las Lágrimas“, batizado assim por dois motivos: fica debaixo de um lugar que, durante as chuvas, vira uma pequena queda d’água (a 700 metros do chão, é bom relembrar); e por motivos óbvios – você já chega lá em cima querendo chorar, tamanha a dificuldade de todo o caminho, composto basicamente de enormes pedras amontoadas.

Desenhando, pra entender o tamanho da bucha.

Desenhando, pra entender o tamanho da bucha.

Olhando pra trás, a trilha no chão.

Olhando pra trás, a trilha no chão.

Olhando pra frente, lágrimas.

Olhando pra frente, lágrimas.

Minhas dores eram indisfarçáveis, e o guia notou que o desafio – que já era grande pros seres humanos normais – pra mim parecia ainda maior. Ele nos aguardava no início da subida, e de lá ele me deu o veredicto:

– Preciso ser sincero com você: vendo as dores que você está sentindo, e a dificuldade em subir esse trecho de hoje, eu aconselho que você volte antes. A gente sobre, você passa a noite lá em cima, e amanhã um dos carregadores volta com você pra base de hoje. O caminho lá em cima é todo de pedra, e com esse joelho assim é arriscado… fora que pra descer você vai sofrer demais. É o meu conselho, mas vocês decidem.

Ele saiu de perto. EU EMPUTECI.

Óbvio que ele estava certo, e com toda a razão do mundo. Mas eu não tinha penado tudo aquilo pra chegar lá em cima E DESCER ANTES. Já havia pipocado uma vez em outra viagem, e me recusei a seguir conselho de quem quer que fosse. Subi o Paso xingando o guia, a mãe do guia, a Jamaica e quem mais resolvesse se meter no meu caminho. E pouco depois, estávamos lá em cima – onde ele nos esperava, para dali em diante seguirmos até o “hotel” – nome dado ao lugar em que passaríamos as próximas duas noites. Havíamos subido o Monte Roraima, e enquanto a Dé estava feliz, eu soltava fumaça.

Foi então que… aconteceu.

O guia começou a caminhar em direção ao hotel, e nós o seguíamos – no começo, no mesmo ritmo, mas meu joelho latejava e eu fui ficando pra trás. A Dé, entre os dois, foi ficando comigo e se afastando do cara, que sumiu de vista. Começa a chover, e chover muito. A gente vê no horizonte o tal hotel – que é uma formação bem evidente, mas o caminho…

…é uma coisa única. A superfície do Monte Roraima não é comparável a nada que a gente conheça, e quando olhamos pra baixo não dá pra diferenciar uma área “gramada” de uma área alagada. Arriscamos atravessar, tentando chegar o quanto antes ao hotel. Já estávamos encharcados (não dava tempo de puxar jaqueta ou cobrir mochila, o tempo virou rápido demais), e num dos buracos indecifráveis a Dé literalmente AFUNDOU até a cintura de lama. Eu travei. Ela saiu, e nisso um dos carregadores chegou pra nos guiar até o hotel.

Ricky - nosso guia, pouco antes de nos abandonar à própria sorte (e à chuva).

Ricky – nosso guia, pouco antes de nos abandonar à própria sorte (e à chuva).

Nosso "hotel", ainda sem chuva. Detalhe à direita, onde ficava nosso banheiro.

Nosso “hotel”, ainda sem chuva. Detalhe à direita, onde ficava nosso banheiro.

Olhando do hotel, e debaixo de chuva, esse era o caminho em que nos daríamos MUITO, mas MUITO mal até a chegada.

Olhando do hotel, e debaixo de chuva, esse era o caminho em que nos daríamos MUITO, mas MUITO mal até a chegada.

Éramos os últimos. Chegamos sob uma salva de palmas que tinha como único objetivo nos animar, mas estávamos totalmente derrotados – talvez como nunca em nossas vidas. Aquilo era um pesadelo: botas alagadas, roupas encharcadas e cheias de lama, fazia um frio desgraçado lá em cima. Não sabíamos como nem onde trocar de roupa. Demos um jeito, e pouco depois eu saía da barraca pra buscar o jantar da Dé – mais um macarrão, e um copo grande de leite quente – porque ela tremia de frio já dentro do saco de dormir, agasalhada e tão derrotada quanto eu. Sabíamos que as botas não secariam até o dia seguinte, e não imaginávamos como seria possível passear durante um dia inteiro lá em cima sem elas. Seria o dia mais importante da viagem, e não bastando sermos os mais despreparados, éramos também os mais arrebentados e desequipados de todo o grupo. Precisávamos de um milagre para o quarto dia, e outro para os dois seguintes.

Dois milagres em três dias: não era pouco. Dormimos totalmente sem esperança.

Faniquito

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6 de setembro de 2015

Viajar mostra pra gente a importância de aproveitar bem o tempo. Isso não significa viver neuroticamente e fazer o maior número de coisas possíveis nesse período, mas sim aproveitar cada momento gastando energia nas coisas certas, ou recarregando as baterias. Não por acaso a gente deseja tanto a chegada das férias. Final de ciclo, começo de outro, oportunidade pra fazer do tempo um aliado, e não um inimigo.

Por isso mesmo, a gente – eu e a Dé – vamos utilizar nossos próximos dias pra isso, porque nossas férias chegaram, e a bateria tá pedindo recarga. Na nossa programação estão novos lugares, velhos lugares, um tempinho de sofá, amigos próximos, amigos distantes e o que mais esses dias nos trouxerem, mesmo porque às vezes o improviso é a melhor opção.

O Faniquito vai junto com a gente – oras, é um projeto de casal, e se o casal sai de férias, o site também ganha uma folga. Prometemos retornar com novas histórias, de fôlego restabelecido, e quem sabe, com outros novos colaboradores. Sim: beirando os primeiros dez meses de vida, ainda temos muito pela frente.

Estamos de volta jajá! Inté!